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03/08/2010

Assistência a idosos vítimas de acidentes e violência no Recife é deficiente

Rita Vasconcelos


Os serviços de saúde do Recife, responsáveis pela assistência aos idosos vítimas de acidentes e violência, não vêm cumprindo as diretrizes básicas recomendadas pelas políticas de saúde vigentes no país. Esta foi uma das conclusões a que chegou uma pesquisa desenvolvida pelo Laboratório de Estudos da Violência (Leves) da Fiocruz Pernambuco. O estudo avaliou 48 serviços da capital pernambucana, sendo 18 pré-hospitalares, oito hospitalares,7 de reabilitação e 15 de saúde mental, dos quais 6 são hospitalares e 9 são Centros de Aperfeiçoamento Psicossocial (Caps).


 Os pesquisadores costumam atribuir este aumento da longevidade aos avanços no campo da saúde, como o uso de vacinas e medicamentos mais eficientes, e à redução da taxa de natalidade no país

Os pesquisadores costumam atribuir este aumento da longevidade aos avanços no campo da saúde, como o uso de vacinas e medicamentos mais eficientes, e à redução da taxa de natalidade no país


A escolha dos critérios usados na avaliação se baseou nos documentos de quatro importantes políticas dirigidas a este grupo populacional: Política Nacional de Redução da Morbimortalidade por Acidentes e Violências; Estatuto do Idoso; Política Nacional de Saúde do Idoso e Política Nacional de Saúde Mental. Estes documentos preconizam os requisitos mínimos que os serviços de saúde devem cumprir para dar uma boa assistência aos idosos vítimas de acidentes e violência.


Segundo a pesquisa, no Recife, os serviços clínicos e de saúde mental quase não cumprem o que as diretrizes recomendam, principalmente no que se refere ao acolhimento, ao atendimento ao idoso e às ligadas ao tema da violência. Apenas 16,7% das seis unidades hospitalares de saúde mental investigadas oferecem testes de triagem para detecção de distúrbios comuns nessa faixa etária, como depressão, isolamento social ou distúrbios nutricionais. Este foi também o índice da presença de profissionais com formação em gerontologia (especialista em processos e problemas do envelhecimento), nessas unidades.


Nos Caps o principal problema encontrado foi em relação à integração da unidade com a rede de saúde: apenas 22,2% das nove unidades investigadas realizavam esta integração a contento. “Quando elegemos os critérios a serem avaliados escolhemos aqueles considerados essenciais para o funcionamento destes serviços. Então, todos deveriam funcionar plenamente, 100%”, explicou Maria Luiza Carvalho, coordenadora do Leves e da pesquisa no Recife.


Nos serviços pré-hospitalares, tanto os fixos quanto os móveis, o índice de identificação e notificação (que é obrigatória) de casos de violência contra idosos é de apenas 11%. Apenas um terço (38,9%) dessas unidades têm cadeiras de rodas, acesso diferenciado para idosos ou portadores de necessidades especiais, como rampas, por exemplo. “São índices muito baixos. Ter cadeira de rodas é item básico para um atendimento adequado para esta população”, afirma Luiza.


Nem mesmo nos serviços hospitalares – que, em geral, apresentam melhor desempenho – os índices foram satisfatórios. Apenas dois dos oito hospitais clínicos avaliados na cidade dispunham de recursos tecnológicos mínimos e indispensáveis, adequados e suficientes (por exemplo leito de UTIs, cadeiras e cama para acompanhante) para prestar uma boa assistência aos idosos. Algumas ações são ainda mais graves. Sendo o idoso um paciente frágil, que requer cuidados e atenção especiais, no Recife só 14,3% dessas oito unidades hospitalares clínicas avaliadas permitem a permanência de acompanhante para os idosos internados.


O depoimento de um gestor de uma unidade hospitalar, colhido durante a pesquisa, reflete o quanto a situação parece longe de uma mudança. “Ainda não vejo o idoso tendo condições de ser recebido nos hospitais de emergência de uma forma diferenciada, com uma fila diferenciada, uma prioridade no atendimento, um cuidado especial na questão do espaço físico. Até o momento, não conseguimos garantir a presença de um familiar junto a esse idoso, principalmente quando internados na emergência. Isso da forma como o idoso reage, como ele não se adapta a um convívio que não seja com seus familiares”, declarou.


Números


Segundo o Ministério da Saúde os tipos de violência contra idosos, mais comuns notificados pela vigilância são: 92% física e 20% psicológica. Em 34% dos casos, o agressor é um familiar. Recife ocupa, de acordo com o último Censo realizado em 2000, o terceiro lugar entre as capitais brasileiras com, maior número de idosos. São cerca de 134 mil pessoas com idade igual ou superior a 60 anos, o que representa 9,4% da população. Os pesquisadores costumam atribuir este aumento da longevidade aos avanços no campo da saúde, como o uso de vacinas e medicamentos mais eficientes, e à redução da taxa de natalidade no país.


Adequar os serviços, inclusive os de saúde, a esta nova realidade – de uma população que envelhece e que é alvo de diversas formas e violência e acidentes – é um desafio. Em 2001, a Secretaria de Saúde do Recife criou uma coordenação específica para tratar dos assuntos ligados à saúde do idoso. No final do ano seguinte, foi então apresentada a Política Municipal da Saúde do Idoso.


Além do Recife, quatro outras capitais brasileiras (Curitiba, Rio de Janeiro, Manaus e Brasília) também foram avaliadas com relação ao cumprimento das diretrizes básicas recomendadas pelas políticas de saúde vigentes no país. A pesquisa nacional foi coordenada pela pesquisadora Edinilsa Ramos de Souza, do Centro Latino Americano de Estudos de Violência e Saúde Jorge Careli (Claves) da Fundação Oswaldo Cruz.


Outros dados da pesquisa


- Em nenhuma unidade pré-hospitalar em saúde mental os profissionais recebem capacitação para a identificação e atendimento dos casos de idosos vítimas de violência.

- Nenhuma unidade de reabilitação clínica realiza atividades voltadas para reinserção à vida comunitária, ações de promoção ao auto cuidado ou ações de estímulo à participação dos idosos em grupos de terceira idade, conselhos tutelares etc.

- Nenhuma unidade hospitalar realiza alguma ação de prevenção aos acidentes/violência

- Nenhuma unidade pré-hospitalar fixa oferece, de forma adequada e suficiente, suporte e/ou acompanhamento aos idosos vítimas de acidentes e violência, às famílias de idosos, aos autores da violência e às equipes que realizam o atendimento.


Publicado em 30/7/2010.

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