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24/05/2019

Austrália e Fiocruz debatem genética e mulheres na ciência

Julia Dias (Agência Fiocruz de Notícias)


Representantes da Embaixada da Austrália no Brasil estiveram na Fiocruz, nesta quinta-feira (23/5), juntamente com a Comissária do país para Discriminação Sexual, Kate Jankins, e a geneticista da Universidade de La Trobe, Jenny Graves, para debater com pesquisadores da instituição pesquisas na área de genética e incentivo às meninas e mulheres nas ciências. As reuniões têm por objetivo fortalecer os laços entre os dois países e buscar pontos para futuras parcerias. No início do mês, o embaixador australiano esteve na Fiocruz para iniciar as conversas sobre esse tema.

A Comissária da Austrália para Discriminação Sexual, Kate Jankins, e a geneticista da Universidade de La Trobe, Jenny Graves, estiveram na Fiocruz para debater com pesquisadores da instituição pesquisas na área de genética e incentivo às meninas e mulheres nas ciências (foto: Divulgação)

 

A primeira reunião, entre Jenny Graves e pesquisadores da área de genética, aconteceu na Residência Oficial do campus de Manguinhos. Graves, que é membro da Academia Australiana de Ciências e trabalha com genética há mais de 30 anos, apresentou sua trajetória de pesquisa e alguns dos principais projetos em andamento na Austrália e no mundo sobre o tema.

A cientista pesquisa a evolução do cromossomo sexual. Para isso, Graves trabalhou com o mapeamento genético de diferentes espécies que evolutivamente estão mais distantes dos humanos. Seu trabalho inclui o mapeamento do genoma de elefantes, pássaros, lagartos e mamíferos típicos da Austrália, como os coalas, ornitorrincos e marsupiais, como o canguru e o demônio da tasmânia.

As evoluções das pesquisas e da tecnologia no campo da genética permitiram o sequenciamento inclusive de animais já extintos, como o Tigre da Tasmânia, que foi sequenciado em 2019 apesar de estar extinto desde 1936, e pesquisas sobre a saúde da vida selvagem. Um câncer facial transmissível foi descoberto em demônios da tasmânia graças a estudos genéticos. A descoberta permitiu salvar a espécie da extinção, através do isolamento de indivíduos saudáveis.

Outros projetos de projeção internacional apresentados pela acadêmica australiana incluem o Arc Center of Excellence for Kangaroo Genomics (KanGO), projeto de diversas instituições australianas sobre o genoma dos cangurus; Genome Alliance in Australasia (Gaia), um consórcio que deve ser lançado em julho de 2019, The Genome 10k project, consórcio internacional de cientistas que busca sequenciar o genoma de dez mil vertebrados; e The Earth BioGenome Project, que tem como objetivo sequenciar e catalogar cerca 1,5 milhão de espécies eucariontes em 10 anos.

“Existem muitas similaridades entre os dois países, é claro, mas é muito bom conhecer as diferenças e ver como vocês estão lidando com esse tópico”, afirmou a comissária australiana, Kate Jankins (foto: Divulgação)

 

Os pesquisadores brasileiros presente apresentaram suas pesquisas em genética associadas a campos como doenças raras, povos indígenas, diabetes, doenças neurodegenerativas, vigilância sanitária molecular de mosquitos e doença de Chagas.

Estiveram presentes os cientistas do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz), Verônica Zembrzuski, Mário Campos Junior, Márcio Pavan, Ana Maria Jansen e Fernando Monteiro; a pesquisadora Sayonara González do Instituto de Saúde da Mulher, da Criança e do Adolescente Fernandes Figueira (IFF/Fiocruz); o pesquisador Marcelo Weksler, do Museu Nacional (MN/UFRJ) e a doutoranda Cintia Povill, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

A cientista australiana demonstrou grande interesse por todas as pesquisas apresentadas. “Existem grupos na Austrália que seriam parceiros naturais para todas essas pesquisas que ouvi aqui”, afirmou Graves, que se dispôs a buscar meios junto à embaixada e outros organismos para que essa ponte seja concretizada. Um dos possíveis caminhos de financiamento levantados foi o Medical Research Future Fund (MRFF), que financia pesquisas e inovação em saúde.

Reunião Mulheres na Ciência

Em seguida, ainda na Residência Oficial, um grupo de pesquisadoras e gestoras da Fiocruz reuniu-se com a Comissária da Austrália para Discriminação Sexual. Kate Henkins explicou um pouco sobre seu mandato, que tem o papel de supervisionar e coordenar projetos sobre o tema em âmbito federal, tendo os direitos humanos como foco principal. Henkins veio à Fundação conhecer melhor a atuação das mulheres em pesquisa e na gestão e as ações que instituição tem tomado para reduzir as desigualdades de gênero.

“Na Austrália, existe uma grande dificuldade em ver mulheres ingressando na ciência”, afirmou Henkins, que se disse feliz ao ver tantas mulheres nos laboratórios da Fiocruz. Mais cedo, ela havia visitado o Laboratório de DST e Aids do Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas (INI/Fiocruz), chefiado pela pesquisadora Beatriz Grinsztejn.

A vice-presidente de Educação, Informação e Comunicação da Fiocruz, Cristiani Machado, apresentou um panorama da presença de mulheres na Fundação. Elas são hoje 57,5% do total de trabalhadores da Fiocruz e 58,5% dos pesquisadores. No entanto, essa proporção cai um pouco quando se tratam de cargos de chefia. Na presidência, as mulheres ocupam 49.3% dos cargos e, apesar da atual presidente ser uma mulher, quatro das cinco vices são ocupadas por homens, assim como a chefia de gabinete e quatro coordenações estratégicas.

“Existem grupos na Austrália que seriam parceiros naturais para todas essas pesquisas que ouvi aqui”, afirmou Jenny Graves (foto: Divulgação)

 

Cristiani Machado destacou como marcos em busca da equidade a criação do Comitê de Pró-Equidade de Gênero e Raça da Fiocruz, em 2009, a eleição de Nísia Trindade Lima como a primeira mulher a ocupar a presidência da Fundação, em 2017, e o estabelecimento do combate a discriminação de raça e gênero como objetivo estratégico no Congresso Interno da Fiocruz, no mesmo ano.

Em 2019, a celebração, pela primeira vez, do Dia Internacional das Mulheres e Meninas nas Ciências em diversas unidades da instituição e a presença da Diretora Executiva do Fundo de Populações da ONU (UNFPA), Natalia Kanem, na aula inaugural da Fiocruz são outros exemplos da importância que a temática tem tido na Fundação. “As perspectivas de gênero e raça são prioridades para os 120 anos da Fiocruz, que serão celebrados no próximo ano”, afirmou a vice-presidente, que também coordena o Programa Mulheres e Meninas na Ciência.

Participaram da reunião as pesquisadoras Beatriz Grinsztejn (INI/Fiocruz), Marília Sá Carvalho (Esnp/Fiocruz), Maria do Carmo Leal (Esnp/Fiocruz), a assessora da presidência Inês Fernandes, a representante da Associação de Pós-Graduandos da Fiocruz, Mayara de Mattos, as representantes do Comitê Mychelle Alves (INCQS/Fiocruz), Andrea da Luz (Cogepe/Fiocruz) e Simone Ribeiro (EPSJV/Fiocruz).

Em suas falas, as pesquisadoras destacaram alguns estudos que têm como foco a saúde das mulheres, como o Nascer no Brasil e o Nascer nas Prisões, conduzidos por Maria do Carmo Leal, e ações afirmativas que tem sido tomadas por unidades e laboratórios, como o incentivo às mães cientistas para levarem seus filhos pequenos a reuniões no Laboratório de DST e Aids.

Mychelle Alves reforçou a importância de considerar a dimensão da raça neste debate. “Por nossa herança escravocrata, ainda temos muita desigualdade racial. O negro ainda está pouco inserido nas ciências e em diversos espaços da sociedade brasileira”, lembrou Mychelle, que também é vice-presidente do Sindicato da Fiocruz (Asfoc-SN). Ela destacou a política de cotas adotada pelo Brasil nos últimos anos como um avanço e ressaltou o papel de liderança que a Fiocruz tem desempenhado em políticas de inclusão. “Apesar de termos muitas mulheres na Fiocruz, essa não é uma realidade na ciência brasileira, que tem apenas 30% de mulheres”, advertiu.

“Existem muitas similaridades entre os dois países, é claro, mas é muito bom conhecer as diferenças e ver como vocês estão lidando com esse tópico”, afirmou a comissária australiana após ouvir os relatos. Henkins defendeu uma aproximação entre a Fundação e a Austrália. “Nossos países têm mais em comum do que pensamos geralmente”, garantiu.

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