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30/08/2007

Bebês de proveta, barrigas de aluguel e clones ganham o olhar da antropologia

Fernanda Marques


“JC é uma menina planejada nascida nos EUA: os óvulos e o sêmen para sua concepção vieram de doadores anônimos e uma ‘barriga de aluguel’ a gestou. Quando nasceu, o casal que a planejou havia acabado de se separar. Quem são os pais de JC?” A situação – descrita na introdução do livro Provetas e clones: uma antropologia das novas tecnologias reprodutivas – ilustra como a inseminação artificial, a fertilização in vitro, a clonagem e outras técnicas correlatas não pertencem apenas aos domínios médico e científico. Elas precisam ser analisadas sob um ângulo diferente, o da antropologia. E é isso o que faz o livro, o mais novo título da coleção Antropologia e Saúde, publicada pela Editora Fiocruz.



A autora, a antropóloga Naara Luna, define novas tecnologias reprodutivas como recursos usados para contornar a ausência involuntária de filhos, tanto a de caráter médico, nos casos de infertilidade, como a de caráter social, nos casos de pessoa sem companheiro e casais homossexuais. São procedimentos que dispensam a relação sexual para gerar um filho e que têm despertado diferentes pontos de vista.


“A abordagem pela imprensa sobre avanços da medicina de reprodução humana ocorre em clima de encantamento diante das novas possibilidades abertas pela tecnologia”, diz Naara. “Já a análise feita pelas ciências sociais e humanas, pela filosofia e teologia mostra reserva quanto aos novos procedimentos”, compara a antropóloga, que escreveu o livro a partir de sua tese de doutorado em antropologia social, defendida no Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).


A autora realizou observação etnográfica e entrevistas com profissionais e usuárias de serviços públicos e privados de reprodução assistida ou de tratamento convencional da infertilidade. As análises têm como base dois tópicos fundamentais em antropologia: as relações de parentesco e a noção de pessoa. “Ao deslocar o ato reprodutivo da esfera da intimidade do casal para o âmbito do laboratório, o uso de tais tecnologias propicia o surgimento de novos significados, ora desestabilizando, ora reforçando noções de pessoa humana e de parentesco, características da cultura ocidental moderna”, explica Naara, que, atualmente, é pesquisadora do Núcleo de Tecnologia Educacional para a Saúde da UFRJ, onde se dedica à investigação de projetos de pesquisa com células-tronco.


A reprodução como objeto de intervenção médica, as peculiaridades do campo de pesquisa sobre reprodução assistida, a família, o discurso biomédico, a construção cultural do corpo, as teorias da concepção e as noções de hereditariedade são temas discutidos ao longo dos cinco capítulos de Provetas e clones, que desperta a curiosidade do leitor à primeira vista – e não só por causa do tom rosa vibrante da capa do livro. Na orelha da obra, as palavras da psicóloga e antropóloga Jane A. Russo, do Instituto de Medicina Social da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), também não passam despercebidas: “Este livro certamente será útil para o leitor que não sabe muito sobre reprodução assistida, mas é leitura obrigatória para aquele que pensa saber tudo”.

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