Início do conteúdo

18/02/2006

Caso de co-infecção contraria teoria genética

Bel Levy


Teorias científicas estão sempre sujeitas a questionamentos. Vez por outra, descobertas apontam para um outro caminho, e é desta maneira que a ciência avança e o conhecimento é consolidado. É o que acaba de ocorrer com a teoria de que um mesmo defeito genético poderia explicar uma maior suscetibilidade a diferentes doenças causadas por microorganismos intracelulares. A descoberta foi feita por um estudo coordenado pelo pesquisador Sergio Mendonça, do Departamento de Imunologia do Instituto Oswaldo Cruz (IOC), uma unidade da Fiocruz, que acompanhou o caso de um paciente que apresentava, ao mesmo tempo, duas doenças provocadas por microorganismos intracelulares - leishmaniose tegumentar e hanseníase, ambas caracterizadas por um espectro de formas clínicas dependentes da resposta imune celular.


"Acredita-se que a capacidade que um indivíduo tem de desenvolver suscetibilidade ou resistência a uma infecção depende do tipo de resposta imune que seu organismo produz, e que o potencial para o desenvolvimento de um determinado padrão de resposta seja determinado geneticamente", explica o pesquisador. Na leishmaniose tegumentar e na hanseníase, tanto a ausência de resposta celular pode levar a uma manifestação grave destas doenças quanto uma resposta exagerada também pode ser nociva. Como a hanseníase e a leishmaniose são ambas causadas por microorganismos intracelulares e apresentam semelhanças clínicas, imunológicas e patológicas, acreditava-se que um mesmo indivíduo deveria responder de forma semelhante aos dois parasitos.


O estudo do IOC mostrou, porém, que a evolução das respostas imunes específicas para cada um dos agentes infecciosos pode seguir caminhos divergentes. Para chegar a essa conclusão, além da caracterização clínica, bacteriológica e parasitológica do caso, o grupo estudou as respostas das células de defesa do paciente frente a componentes dos agentes causadores das duas doenças: para a leishmaniose, a reação das células de defesa foi exagerada determinando a forma mucosa da leishmaniose tegumentar. Já para a hanseníase, foi detectada a ausência de resposta imune celular, condizente com a forma da hanseníase virchowiana (disseminada) que o paciente apresentava.


As respostas imunes do paciente a cada uma das infecções foram minuciosamente estudadas e verificou-se que a principal diferença entre elas estava relacionada à produção de interferon-gama, uma molécula envolvida no controle de agentes infecciosos intracelulares e na resposta inflamatória.


A busca por uma base genética comum para a leishmaniose cutânea e a hanseníase tem sido justificada pelas semelhanças clínicas e imunológicas que estas doenças apresentam. No entanto, a identificação num mesmo indivíduo de diferentes padrões de resposta imune para cada um dos parasitos demonstra a existência de mecanismos particulares na resposta do organismo humano a cada uma das infecções.


"Seria ótimo se conseguíssemos identificar um defeito genético que determinasse suscetibilidade a diferentes infecções intracelulares, mas em geral a natureza não é tão simples quanto desejaríamos", diz o pesquisador.

Voltar ao topo Voltar