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03/02/2012

Centro de Saúde do Trabalhador recebe certificado internacional de acreditação

Elisa Andries


A Escola Nacional de Saúde Pública (Ensp/Fiocruz) recebeu um importante reconhecimento da qualidade de serviços prestados à população: o Centro de Estudos da Saúde do Trabalhador e Ecologia Humana (Cesteh) acaba de ser acreditado pelo Consórcio Brasileiro de Acreditação (CBA), que aplica o método internacional da organização norte-americana Joint Commission International (JCI). O Centro de Saúde Escola Germano Sinval Faria (CSEGSF), que também pertence à Ensp, continua trabalhando para obter a certificação, que deve ocorrer dentro de 90 dias. O processo de acreditação internacional é uma avaliação externa que tem como objetivo criar e manter uma cultura de segurança na instituição e de qualidade no atendimento. Liderança colaborativa e aperfeiçoamento contínuo dos processos, que incluem a escuta dos pacientes e seus familiares, são critérios fundamentais para a certificação, que pode ou não ser renovada a cada três anos. "Esse processo trouxe resultados positivos tanto para a gestão da escola, quanto para os trabalhadores do Cesteh e seus pacientes. O selo é um marco. Foi um esforço interno de mobilização e de integração e trouxe ganhos para todos", destacou Marco Menezes, chefe do Cesteh que, junto com o coordenador de Serviços, Antonio Sergio, conversou com o Informe Ensp.


Como foi a decisão de o Cesteh se submeter ao processo de acreditação?


Marco Menezes: Participar do processo de acreditação não foi uma decisão do Cesteh, mas da Fiocruz, baseada na percepção de que essa participação seria importante para a organização de processos de trabalho, para dar visibilidade ao que nós fazemos nas áreas de assistência e serviços. O processo foi iniciado quando Antonio Sergio ainda era assessor da Vice-Presidência de Ambiente, Atenção e Promoção da Saúde da Fundação, na qual lidava especialmente com o processo de acreditação. O Cesteh não foi o único que participou desse processo, mas foi o primeiro da Fiocruz que atingiu esse objetivo. Pelo que apuramos junto aos avaliadores, o Cesteh é a primeira unidade do mundo que atua na linha saúde/trabalho/ambiente a receber o certificado de acreditação.


Em 2010, a direção da Ensp passou a priorizar, de fato, o processo de acreditação no Cesteh e no Centro de Saúde Escola, intensificando investimentos em recursos humanos e financeiros. A partir daí começou o processo de integração desses dois departamentos. O ano de 2010 foi o marco desses esforços. Outro ponto fundamental foi quando o Antonio Sergio deixou a Vice-Presidência de Ambiente, Atenção e Promoção da Saúde e retornou para a Ensp. Na época, convidado pelo então chefe do Cesteh, Hermano de Castro, Antonio Sergio se incorporou a nossa equipe para o desafio, então já colocado, de continuar seu trabalho de acreditação, agora dentro do departamento.


Nesse momento de transição, já tínhamos um movimento interno tendo em vista a questão da qualidade voltada para o processo de acreditação. Fizemos duas oficinas fora do departamento com o apoio da direção. Foram momentos que marcaram o processo de integração do departamento em torno do processo de acreditação.


Antonio Sergio: A discussão em torno da acreditação acontecia há algum tempo na Câmara Técnica de Serviços da Vice-Presidência, na época em que se discutia a questão do selo Fiocruz. Tínhamos noção de que trabalhamos bem na assistência e nos serviços, com seriedade, mas sem o mesmo rigor científico com que trabalhamos nas nossas pesquisas. Não havia como garantir que cumpríamos bem a nossa missão. A partir dessa discussão, surgida na câmara técnica, fomos buscar a certificação para os serviços de saúde, que é um pouco diferente da certificação para laboratórios, quando avaliado isoladamente.


A acreditação é um processo mais completo, pois segue um padrão mundial. Existem outros padrões, mas fizemos questão de trabalhar com parâmetros internacionais, pois permitem a comparação com outras unidades. Começamos, então, esse processo com o Instituto Fernandes Figueira (IFF) e o Instituto de Pesquisa Evandro Chagas (Ipec), duas unidades hospitalares da Fiocruz. Mas essas unidades tinham problemas de infraestrutura e percebemos que conquistar a acreditação nessas unidades demandaria muito tempo. Em 2010 surgiu a oportunidade de o Hospital Samaritano de São Paulo, já acreditado, fazer uma consultoria na área para a Fiocruz, que se tornou a alavanca para dar início ao processo.


Qual a vantagem da acreditação para um departamento de ambulatório e serviços como o Cesteh?


Antonio Sergio: A vantagem da acreditação é que, além de lidar com os padrões internacionais, é focada na segurança de quem atende, de quem trabalha no serviço de saúde, e na segurança de quem é atendido. Portanto, o foco é garantir a segurança de ambos, que inclui a questão do ambiente de trabalho, do conforto das instalações, da garantia de que o processo está sendo feito de modo adequado para aquela pessoa, de que estamos seguindo protocolos clínicos que evidenciam os melhores resultados, entre outros aspectos. É uma série de situações, não só com relação ao processo de trabalho ou aos resultados finais do processo de atendimento, do cuidado de saúde, mas também com relação a controle ambiental, condições de conforto, menor risco de infecção, ou seja, várias situações são avaliadas no processo.


Quais foram os principais desafios do processo de acreditação no Cesteh?


Antonio Sergio: Quando retornei para o departamento, o que mais me chamou a atenção foi uma placa em que se lia "Ambulatórios". A lógica era de que cada ambulatório era um compartimento, mais ou menos parecido com aqueles centros médicos com vários consultórios, onde cada um tem sua estrutura separada. No Cesteh, o ambulatório funcionava de forma fragmentada e as soluções eram encontradas através de financiamentos de projetos de pesquisa isolados. Para a acreditação, seria preciso definir se o processo era integrado ou se a acreditação seria feita para um conjunto de laboratórios. O primeiro desafio foi a integração do ambulatório, que envolveu muita negociação e convencimento. Integrar significa compartilhar espaços e dividir o controle. Enfim, esse foi o principal ponto para a mudança da cultura institucional.


Partimos do princípio de que precisávamos descobrir o que era comum aos serviços, além do espaço físico, da questão da gestão, limpeza etc. Identificamos dois espaços fundamentais: o serviço de enfermagem e o de documentação, que têm atuação transversal. A primeira etapa foi organizar esses dois serviços. Estruturamos a enfermagem e, depois, a documentação. Na documentação, por exemplo, o controle dos prontuários era manual, não tinha sistema próprio e não informava sobre o conjunto de serviços. Tinha capacidade para alimentar uma pesquisa específica, mas não informava sobre o conjunto. Portanto, esse conjunto de consultórios de ambulatório também teria que se interligar em termos de informação. Decidimos adotar o sistema de informação do Datasus, que eu conhecia da época em que chefiava o Centro de Saúde Escola. Fizemos as adaptações necessárias para a lógica do ambulatório da saúde do trabalhador, com a finalidade, inclusive, de gerar dados que pudessem ser aproveitados em pesquisas.


Outro ponto importante dessa integração foi o que chamamos de atendimento transversal. Todo trabalhador que entra para ser atendido passa pelo acolhimento, pelo atendimento com uma equipe de porta de entrada multiprofissional e por consultas transversais, que inclui avaliação com enfermeiro, avaliação com nutricionista, avaliação com serviço social. Dessa forma, tornamos o atendimento mais longitudinal.


E como o Cesteh se adequou para atender ao padrão de qualidade estabelecido pelo processo de acreditação?


Antonio Sergio: Para estabelecer uma política de gestão da qualidade precisávamos de uma equipe. Tivemos a felicidade de contar com dois profissionais da Ensp: a Zilda, que trabalhava na setor de Qualidade e que assumiu o comitê de qualidade do Cesteh, e a Rosângela, que chefiou o Serviço de Recursos Humanos. Também trouxemos outras pessoas para compor a equipe, como a Tânia, que estava na secretaria de um dos departamentos da Ensp e assumiu a área de compras do ambulatório. Outro ganho para o Cesteh foi a vinda do Niltinho e do Audir para cuidar da infraestrutura e fazer a ponte com a escola e com a Diretoria de Administração do Campus (Dirac/Fiocruz). Importante também foi o papel da Ana Beatriz, quando coordenava a área de laboratórios e ambulatórios da escola.


Marco Menezes: Em termos profissionais, foi uma experiência única. Aprendi muito sobre gestão, tanto dentro do Cesteh quanto em relação à Ensp e à Fiocruz. Tivemos que nos aprofundar para as coisas acontecerem. A gente percebeu as fragilidades que vivemos no dia a dia em relação à gestão. O processo de acreditação já trouxe frutos positivos para todos nós. Em termos de relação com a escola, ajudou na organização das compras visando ao menor tempo, maior qualidade para o ambulatório e laboratórios. Esse é um produto importante desse processo, que culminou na discussão da nossa relação institucional. Hoje está tudo integrado. Internamente, conseguimos integrar o serviço, com impacto direto nas pesquisas, na organização e na distribuição de dados.


Qual é a missão institucional do Cesteh?


Antonio Sergio: A missão institucional do Cesteh é trabalhar questões ligadas à saúde do trabalhador e à saúde ambiental, desenvolvendo basicamente o diagnóstico e estabelecendo o nexo causal com questões ambientais e de trabalho relacionadas ao trabalho propriamente dito. Temos cinco grandes grupos de atendimento. O primeiro é o que vem do SUS, tanto da rede propriamente dita como da Rede Nacional de Atenção à Saúde do Trabalhador (Renast), através do referenciamento. Um segundo grupo é o dos sindicatos de organizações civis, normalmente feito através de acordos. Esses dois grupos compõem de 50% a 70% do atendimento. Também temos, há muito tempo, ações com sindicatos da construção naval. Existe uma parceria muito próxima com os sindicatos dos bancários.


Existe um outro, por meio do Sindprev, que é com trabalhadores da Funasa, agentes sanitários que trabalharam com a aplicação de pesticidas há muitos anos. E na dermatologia trabalhamos as dermatites de contato. Essa vem de diversas formas, mais no varejo, e não da articulação com o sindicato. Temos um outro grupo de atendimentos, que é raro, mas por vezes o Ministério da Saúde encaminha casos para laudos relacionados a alguma situação. É um outro componente dessa demanda. Um quarto componente que representa também o intersetorial são as articulações entre as outras unidades de atendimento da Fiocruz. O quinto bloco são as demandas relacionadas a problemas ambientais associados a doenças. Um grupo que vem crescendo muito é o dos movimentos sociais, que também vem demandando serviços do Cesteh.


Qual o perfil do paciente do Cesteh?


Antonio Sergio: Nossa clientela reproduz, de certa forma, as características da população trabalhadora brasileira. Em relação ao gênero, 47% dos trabalhadores que abriram o prontuário nos últimos 12 meses eram do sexo feminino, com média de idade de 45 anos. Essa idade já era esperada, levado em consideração o tempo de evolução das doenças relacionadas ao trabalho. Com relação ao setor da economia, reproduzimos basicamente o estado do Rio de Janeiro, que apresenta 87% da população trabalhadora ligada aos serviços, o setor terciário.


No Cesteh, 90% dos nossos atendimentos são feitos com pessoas ligadas a serviços. Cerca de 10% dos nossos pacientes estão ligados à construção civil, à indústria, ao setor secundário e, muito raramente, ao setor primário. Isso reproduz mais ou menos a população do estado. Com relação à naturalidade, nossos pacientes são predominantemente do Rio de Janeiro (70%), com uma parcela significativa de nordestinos - retrato da corrente migratória.


As nossas cinco principais causas de atendimento aqui são lesões de esforço repetido e doenças osteomusculares relacionadas ao trabalho, seguidas de avaliações neurológicas, no sentido da neurotoxicologia - e por isso o papel importante desse trabalho junto com os guardas sanitários -, dermatite de contato, aquele grupo de avaliações ginecológicas das trabalhadoras no campus e a aplicação dos testes de contato. Esses são os cinco principais motivos de atendimento aqui no Cesteh, pelo menos no último ano.


A acreditação é parte de um programa de melhoria contínua. Como manter, a partir de agora, esse padrão de qualidade?


Marco Menezes: A sustentabilidade desse processo vai depender fundamentalmente da gestão da Ensp. É preciso materializá-la, por exemplo, no plano quadrienal da escola. A Ensp assumiu esse compromisso. Nós, enquanto coordenação do Cesteh, estamos colocando isso em nosso plano de atividades para o ano que vem, nossos trabalhadores estão se mantendo organizados, temos uma proposta, inclusive, de fazer avaliações anuais, internas, sem muito custo financeiro, algo mais organizado, que mostre a continuação desse processo, que mostre as fragilidades que ele possa ter para uma futura avaliação daqui a três anos.


O processo de acreditação foi um ganho para toda a Escola e teve a participação de todas as áreas, principalmente Vice-Direção de Desenvolvimento Institucional e Gestão, que é o embrião central que garante a qualidade no setor de compras, na melhoria de adequação de recursos humanos, planejamento, recursos humanos, infraestrutura. Tudo isso implica em investimento, em direcionamento de recursos. Se formos pensar, todos os gestores, principalmente da Vice-Direção, estão envolvidos diretamente.


Como foi o processo de integração do Cesteh com o Centro de Saúde?


Marco Menezes: Nos últimos anos, o Centro de Saúde Escola foi um parceiro fundamental. O Centro de Saúde ainda está no processo de acreditação, mas dentro de 90 dias já deve atingir seu objetivo. Todos os esforços institucionais estão voltados para a conquista da acreditação para o Centro de Saúde. E o Cesteh está disponível para o que for necessário, pois não teríamos conseguido essa certificação se não fosse a parceria e o esforço do Centro de Saúde Escola, pois não teríamos condições de fazer, por exemplo, a dispensa de medicamentos e a esterilização de materiais. A certificação do Centro de Saúde é apenas uma questão de tempo.


Publicado em 3/2/2012.

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