06/02/2015
A doença / Agente causador
A chikungunya é uma doença febril aguda, causada pelo vírus chikungunya (CHIKV), que pode ser transmitida pelos mosquitos Aedes aegypti e Aedes albopictus.
Chikungunya significa “aqueles que se dobram” em um dos idiomas da Tanzânia. Trata-se de uma referência à aparência curvada dos pacientes que foram atendidos na primeira epidemia documentada no país, localizado no leste da África, entre 1952 e 1953.
Casos humanos com febre, erupção cutânea e artrite aparentando ser CHIKV foram relatados no início de 1770, mas o vírus não havia sido isolado do soro humano ou de mosquitos até a epidemia na Tanzânia.
Outros surtos ocorreram na África e na Ásia, muitos em pequenas comunidades ou comunidades rurais. Na Ásia, cepas de CHIKV foram isoladas durante grandes surtos urbanos em Bangkok e Tailândia em 1960 e em Calcutá e Vellore, na Índia, durante as décadas de 60 e 70.
A atual epidemia se iniciou em 2004 na Ilha de Lamu, no Quênia, e desde então está se espalhando pelas regiões do mundo onde se encontram os mosquitos vetores competentes.
Transmissão
O CHIKV é um vírus RNA que pertence ao gênero Alphavírus da família Togaviridae. Sua transmissão ocorre pela picada da fêmea de mosquitos infectados. O mosquito adquire o vírus ao picar uma pessoa infectada, durante o período em que o vírus circula no sangue. Não existe transmissão entre pessoas.
O Aedes aegypti tem presença essencialmente urbana e está associado à transmissão da dengue em áreas tropicais e no Brasil. A fêmea alimenta?se preferencialmente de sangue humano. O mosquito adulto se encontra dentro das residências e os habitats das larvas estão mais frequentemente em depósitos artificiais, como pratos de vasos de plantas, lixo acumulado e pneus.
O Aedes albopictus está presente sobretudo em áreas rurais, peri-urbanas e alimenta?se principalmente de sangue de outros animais, embora também possa se alimentar de sangue humano. Suas larvas são encontradas mais frequentemente em habitats naturais, como internódios (intervalo entre as gemas de crescimento do caule) de bambu, buracos em árvores e cascas de frutas. Outros recipientes artificiais abandonados nas florestas e em plantações também podem servir de criadouros.
Não há evidências de que o vírus chikungunya seja transmitido da mãe para o feto durante a gravidez. Porém, a infecção pode ocorrer durante o parto. Também não há evidências de transmissão pelo leite materno. Com os cuidados da segurança do sangue que a rede de hemocentros no Brasil já adota para evitar transmissão de doenças por transfusão, não se considera a transfusão sanguínea uma forma de transmissão com importância para a saúde pública.
O vírus pode afetar pessoas de qualquer idade ou sexo, mas os sinais e sintomas tendem a ser mais intensos em crianças e idosos. Além disso, pessoas com doenças crônicas têm mais chance de desenvolver formas graves da doença.
Quem apresentar a infecção fica imune o resto da vida.
Sintomas
Os principais sinais e sintomas da chikungunya são febre acima de 39 graus, de início repentino, e dores intensas nas articulações de pés e mãos, como dedos, tornozelos e pulsos. Podem ocorrer, também, dor de cabeça, dores nos músculos e manchas vermelhas na pele. Em média, 30% das pessoas infectadas são assintomáticas, ou seja, não apresentam os sinais e sintomas clássicos da doença.
Após a picada do mosquito, os sintomas se manifestam no período de dois a dez dias, podendo chegar a 12 dias. É o chamado período de incubação. Se a pessoa for picada no período em que o vírus circula no sangue, entre um dia antes do aparecimento da febre até o quinto dia de doença, poderá infectar o mosquito.
O Ministério da Saúde definiu que devem ser consideradas como casos suspeitos todas as pessoas que apresentarem febre de início súbito maior de 38,5ºC e artralgia (dor articular) ou artrite intensa com início agudo e que tenham histórico recente de viagem às áreas nas quais o vírus circula de forma contínua.
A dor nas articulações também está presente nos casos de dengue, mas a intensidade é menor. No caso da chikungunya, é importante reforçar que a dor articular, presente em 70% a 100% dos casos, é intensa e afeta principalmente pés e mãos, geralmente tornozelos e pulsos.
É possível haver casos de pessoas infectadas pela chikungunya e pela dengue ao mesmo tempo.
Diagnóstico / Tratamento
O vírus chikungunya ou CHIKV só pode ser detectado em exames de laboratório. São três os tipos de testes capazes de detectar a chikungunya: sorologia, PCR em tempo real (RT?PCR) e isolamento viral. Todas essas técnicas já são utilizadas no Brasil para o diagnóstico de outras doenças e estão disponíveis nos laboratórios de referência da rede pública.
Em caso de suspeita de chikungunya, deve-se procurar a unidade de saúde mais próxima imediatamente. É fundamental não tomar remédio por conta própria. A automedicação pode mascarar sintomas, dificultar o diagnóstico e agravar o quadro do paciente. Somente um médico pode receitar medicamentos.
Até o momento não existe um tratamento específico para a chikungunya, como no caso da dengue. Os sintomas são tratados com medicação para a febre (paracetamol) e as dores articulares (antiinflamatórios). Na fase aguda, não é recomendado o uso de ácido acetil salicílico (AAS) e antiinflamatórios não hormonais (AINH) devido ao risco de hemorragia. Não é necessário o isolamento. Recomenda?se repouso absoluto ao paciente, que deve beber líquidos em abundância.
A internação é aconselhada apenas nos casos que apresentarem maior gravidade. Em geral, o paciente se recupera em dez dias após o início dos sintomas. No entanto, em alguns casos, as dores nas articulações podem persistir por meses. Nesses casos, o paciente deve voltar à unidade de saúde para avaliação médica.
As mortes por chikungunya são raras.
Prevenção
Como a doença chikungunya é transmitida por mosquitos, é fundamental que as pessoas reforcem as medidas de eliminação dos criadouros das espécies. Os cuidados devem ser exatamente os mesmos para o controle da dengue, ou seja, basicamente, não deixar acumular água em recipientes. Entre outras medidas, são muito efetivas: verificar se a caixa d´água está bem fechada; não acumular vasilhames no quintal; verificar se as calhas não estão entupidas; e colocar areia nos pratos dos vasos de planta. Os procedimentos de controle são semelhantes para ambos os mosquitos.
Panorama mundial
O vírus circula em alguns países da África e da Ásia. De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), desde o ano de 2004 o vírus já foi identificado em 19 países. Naquele ano, um surto na costa do Quênia propagou o vírus para Comores, Ilhas Reunião e outras ilhas do oceano Índico, chegando, em 2006, à Índia, Sri Lanka, Ilhas Maldivas, Cingapura, Malásia e Indonésia. Nesse período, foram registrados aproximadamente 1,9 milhão de casos – a maioria na Índia.
Em 2007, o vírus foi identificado na Itália. Em 2010, houve relatos de casos na Índia, Indonésia, Mianmar, Tailândia, Ilhas Maldivas, Ilhas Reunião e Taiwan – todos com transmissão sustentada. França e Estados Unidos também registraram casos em 2010, mas sem transmissão autóctone (quando a pessoa se infecta no local onde vive).
Recentemente o vírus foi identificado nas Américas. No final de 2013, foi registrada transmissão autóctone em vários países do Caribe (Anguila, Aruba, Dominica, Guadalupe, Guiana Francesa, Ilhas Virgens Britânicas, Martinica, República Dominicana, São Bartolomeu, São Cristóvão e Nevis, Santa Lúcia e São Martinho) e em março de 2014, na República Dominicana.
Toda a população do continente é considerada como vulnerável, por dois motivos: como nunca circulou antes em nossa região, ninguém tem imunidade ao vírus e ambos os mosquitos capazes de transmitir a doença estão presentes em praticamente todas as áreas das Américas.
Para doenças como a chikungunya não existem medidas efetivas em fronteiras ou aeroportos, pois a pessoa pode viajar durante o período de incubação ou ser um caso assintomático. Além disso, os sintomas de chikungunya são semelhantes aos de outras doenças. Assim, a melhor prevenção e cada pessoa buscar eliminar os criadouros de mosquitos na sua casa e vizinhança.
A situação no Brasil
Em 2014, no Brasil, entre os meses de julho e agosto, foram confirmados 37 casos de chikungunya importados, de pacientes originários, principalmente, do Haiti e República Dominicana. Em setembro, foram confirmados dois casos autóctones no município do Oiapoque, Amapá. Ambos os casos são de residentes no município, sendo filha e pai.
Diante da confirmação dos casos, o município de Oiapoque, com apoio do Ministério da Saúde e da Secretaria de Estado da Saúde do Amapá, intensificou as medidas de controle da doença. Dentre as ações, estão a busca ativa de novos casos suspeitos com alerta nas unidades de saúde e comunidade, a remoção e tratamento químico de criadouros de mosquitos Aedes aegypti, além da aplicação de inseticida (fumacê) para reduzir a densidade dos vetores.
Os profissionais de saúde já receberam orientações para o manejo adequado dos pacientes. Os casos suspeitos de chikungunya devem ser comunicados e/ou notificados obrigatoriamente em até 24 horas a partir da suspeita inicial. Qualquer estabelecimento de saúde, público ou privado, deve informar a ocorrência de casos suspeitos às Secretarias Municipais e Estaduais de Saúde e ao Ministério da Saúde.
O papel da Fiocruz
Referência regional para dengue e febre amarela, o Laboratório de Flavivírus do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz) foi designado pelo Ministério da Saúde para fazer também o diagnóstico laboratorial de casos suspeitos de febre chikungunya no Rio de Janeiro, Espírito Santo e Bahia.
O interesse dos pesquisadores do Laboratório de Flavivírus do IOC pelo vírus chikungunya teve início em 2010, após a confirmação de um caso importado no país. Devido à similaridade em relação aos sintomas da dengue e de relatos na literatura médica sobre a coinfecção envolvendo dengue e chikungunya, o caso serviu como alerta para a equipe, que passou a acompanhar a disseminação da doença em outros países e buscou apoio de instituições internacionais para implantar os métodos de diagnóstico.
As técnicas moleculares para detectar o material genético do vírus em amostras de pacientes de casos suspeitos foram implantadas no laboratório ainda em 2012. Atualmente os pesquisadores contam também com métodos sorológicos – tanto os chamados testes in house, elaborados localmente, quanto kits comerciais para avaliação dos níveis de anticorpos IgM e IgG.
Texto revisado pelos pesquisadores:
Ana Maria Bispo de Filippis, pesquisadora do Laboratório de Flavivírus do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz)
Otília Lupi, infectologista do Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas (INI/Fiocruz).
Outras fontes: