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22/06/2006

Condições socioeconômicas podem interferir na autoclassificação de raça ou cor

Fernanda Marques


As relações entre raça ou etnia e os agravos à saúde ainda são alvo de poucas pesquisas no Brasil. No entanto, para qualquer estudo desse tipo, são necessários instrumentos de classificação de raça ou cor. Pesquisadores da Fiocruz e da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) compararam duas abordagens de autoclassificação de raça. Os resultados mostram que, entre indivíduos em melhores posições socioeconômicas, existe a tendência de se declarar com a pele mais clara.


O estudo foi publicado no início deste ano nos Cadernos de Saúde Pública. O artigo é assinado pelos pesquisadores Marcos Chor Maio, da Casa de Oswaldo Cruz (COC), Simone Monteiro, do Insituto Oswaldo Cruz (IOC) e Dóra Chor, da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca (Ensp), os três da Fiocruz, e por Eduardo Faerstein e Claudia S. Lopes, ambos do Instituto de Medicina Social da Uerj.


Participaram da pesquisa mais de 3.700 funcionários de uma universidade no Rio de Janeiro. Eles preencheram um formulário que, entre outras questões, tinha duas perguntas - uma aberta e outra fechada - para autoclassificação de raça. A pergunta aberta - "em sua opinião, qual é sua cor ou raça?" - permitia ao entrevistado registrar qualquer termo que desejasse. Na pergunta fechada, o entrevistado deveria selecionar um entre os cinco termos usados pelo censo do IBGE para definir cor ou raça: preta, parda, branca, amarela e indígena.


Quem se autoclassificou como amarelo ou indígena não foi incluído nas análises, devido ao reduzido percentual. Além disso, na pergunta aberta, os mais de 40 termos diferentes usados pelos participantes foram agrupados em três categorias: preto, pardo e branco.


Assim, segundo a pergunta aberta, 53% dos entrevistados se autoclassificaram como brancos, 25% como pardos e 22% como pretos. Já de acordo com a pergunta fechada, esses percentuais foram 54%, 30% e 16%, respectivamente. "Apesar da concordância elevada, proporções não desprezíveis dos participantes que se identificaram como negros ou pardos na pergunta aberta escolheram categorias mais 'claras' na autoclassificação de raça proposta pela pergunta fechada", diz o artigo.


Dos que se declararam negros na pergunta aberta, 30% dos homens e 27% das mulheres marcaram a categoria parda na pergunta fechada. Entre os que se definiram como pardos na pergunta aberta, 11% dos homens e 13% das mulheres assinalaram a opção de cor branca na pergunta fechada. No caso das mulheres, essa tendência ao "embranquecimento" aumentou com o grau de escolaridade e o nível de renda familiar per capta.


"Ao utilizar as categorias do IBGE, ganha-se em termos de comparabilidade com outros estudos, mas é preciso ponderar a possibilidade de tendência ao 'branqueamento', especialmente nos estratos de melhor posição socioeconômica", diz o artigo. Os autores sugerem, então, que "a pergunta aberta, quando viável, é mais adequada do que a autoclassificação fechada, já que permite uma visão mais acurada das variações na autopercepção dos indivíduos, podendo ainda captar as mudanças acerca dos usos das categorias raça e cor e dos processos de construção de identidades étnico-raciais".

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