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09/04/2010

Dia Mundial da Saúde abre campanha sobre efeitos da urbanização

Informe Ensp


"Mais do que discutir mudanças climáticas - que é um fato da natureza já em curso e é irreversível - a principal discussão colocada hoje é o aumento da vulnerabilidade das populações urbanas em decorrência do clima, tanto na Região Metropolitana do Rio de Janeiro, que acaba de viver uma tragédia de grandes proporções, quanto em qualquer outra grande cidade do mundo", apontou o pesquisador da Escola Nacional de Saúde Pública (Ensp/Fiocruz) Ulysses Confalonieri, na quarta-feira (7/4), Dia Mundial da Saúde. Este ano a Organização Mundial da Saúde (OMS) escolheu o tema Mil cidades, mil vidas para a campanha, que seguirá até 11 de abril. Serão organizados eventos em várias cidades do mundo. A estimativa é de que nos próximos 30 anos praticamente todo o crescimento populacional do planeta ocorra em áreas urbanas. O tema destaca o efeito da urbanização sobre a saúde coletiva, em nível global, e para cada um dos indivíduos. Os desafios relacionados ao tema incluem o acesso à água tratada, o tabagismo, o uso abusivo de álcool, o sedentarismo e os riscos associados a surtos de doenças.


 

 A população urbana do Rio não para de crescer e tem hoje sérios problemas de habitação, pobreza, drenagem, saneamento e outros - como as enchentes que ocorreram esta semana<BR><br />
(Foto: Virginia Damas/Ensp)

 A população urbana do Rio não para de crescer e tem hoje sérios problemas de habitação, pobreza, drenagem, saneamento e outros - como as enchentes que ocorreram esta semana

(Foto: Virginia Damas/Ensp)


Pela primeira vez na história, mais de 50% da população mundial vivem em áreas urbanas. Para 2050, a previsão é de que 50% da população mundial viverá em povoados e cidades. "O mundo está se urbanizando rapidamente e isso está provocando importantes mudanças em nossos estilos de vida, nosso comportamento social e nossa saúde", disse Jacob Kumaresan, diretor do Centro da OMS para Desenvolvimento Sanitário, com sede em Kobe, no Japão. "Embora a vida nas cidades ofereça muitas oportunidades, inclusive de acesso a uma melhor atenção de saúde, os entornos urbanos podem concentrar riscos sanitários e introduzir a novos perigos", destacou.


Populações urbanas têm vulnerabilidades socioeconômica, ambiental e sanitária


Em junho de 2009, a Ensp e o Instituto Oswaldo Cruz (IOC), duas unidades técnico-científicas da Fiocruz, e a Secretaria de Estado do Ambiente do Rio de Janeiro (SEA) assinaram convênio para traçar o mapa de vulnerabilidade estadual, relativo aos impactos das mudanças climáticas nas áreas socioeconômica, ambiental e sanitária. A execução do projeto está sendo realizada pelo Programa de Mudanças Ambientais Globais e Saúde (PMAGS) da Escola, sob a coordenação-técnica do pesquisador Ulisses Confalonieri. A coordenação-geral é do IOC. Os resultados devem ser divulgados em junho.


Segundo Confalonieri, a população urbana do Estado do Rio não para de crescer e tem hoje sérios problemas de habitação, pobreza, desinformação, drenagem, saneamento, falta de sistemas de alerta para eventos extremos - como as enchentes que ocorreram na terça-feira (6/4), resultando em mais de 100 mortes divulgadas até o momento -, planos de contingência da defesa civil e planejamento da saúde nos municípios. "Tudo isso tem que estar na pauta do dia das autoridades dos municípios do Estado do Rio e de todas as cidades do Brasil. Vulnerabilidade urbana é um dos pontos críticos no país", diz Confalonieri, que atualmente realiza pesquisas no Centro de Pesquisa Renné Rachou(CPqRR), unidade da Fiocruz em Belo Horizonte.


As enchentes mostraram mais uma vez que a Região Metropolitana do Rio de Janeiro é muito vulnerável. Confalonieri lembrou uma epidemia de leptospirose que aconteceu em 1996, na Baixada de Jacarepaguá, que acometeu boa parte da população local. "Deve ter sido a maior epidemia do mundo já notificada", ressaltou. Segundo o pesquisador, as mudanças climáticas já estão em curso e não existe solução imediata para deter o fenômeno.


"As enchentes de terça-feira no Rio de Janeiro foram um evento extremo, mas que podem acontecer novamente. Desde 2007, o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) traça cenários climáticos futuros, relacionados às mudanças climáticas, que projetam grandes concentrações de chuvas nas regiões Sul e Sudeste do Brasil. Se o evento de terça-feira, no Rio, já é efeito das mudanças climáticas, ainda não dá para saber, pois um evento isolado não diz muita coisa. Mas já aponta para uma realidade a médio e longo prazos que precisa ser pensada e planejada para evitar catástrofes de grande magnitude", comentou o pesquisador.


Projeto traçará índice de vulnerabilidade de cada município do Estado


O projeto que está sendo realizado em convênio com a Secretaria de Estado do Ambiente do Rio de Janeiro traçará o índice de vulnerabilidade de cada município para, em seguida, agregar as regiões. As negociações para a realização do projeto começaram quando o ex-ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, ainda era secretário da SEA e foi realizado um trabalho sobre a questão da vulnerabilidade nas zonas costeiras, bacias hidrográficas, clima e os biomas do Rio. Diante desse projeto e da pesquisa realizada pelo PMAGS sobre o Índice de Vulnerabilidade Geral (IVG) - concluída em 2005 e patrocinada pelo Ministério da Ciência e Tecnologia, que trata da vulnerabilidade do setor saúde e da população em relação ao impacto do clima e seus possíveis efeitos nas regiões do país - surgiu a possibilidade da construção do mapa de vulnerabilidade da população.


De acordo com a coordenadora do PMAGS, Diana Marinho, a preocupação fundamental do projeto é que cada município tenha condições de dar respostas às suas adversidades. "Quando acontecem catástrofes como esta do Rio de Janeiro, será que o município terá condições de responder a ela? Nossa preocupação é dizer: o município X está vulnerável, mas por quê? O objetivo do trabalho é dar condições de resposta a essa questão. Não para amedrontar a população ou criar uma falsa expectativa, mas para trabalharmos de forma transparente".


Ainda de acordo com a pesquisadora, o objetivo do mapa é apresentar vulnerabilidades dos municípios para que o estado possa atuar com políticas públicas. "Se há uma política que facilita o ajuste para que a população não jogue lixo na rua, ou que não tenha bueiros entupidos, é possível diminuir algumas doenças. A expectativa é que o resultado do trabalho contribua para que os tomadores de decisão possam utilizá-lo para melhorar as condições de vida das populações dos municípios indicados como vulneráveis".


Segundo Diana, o Rio de Janeiro tem hoje um conjunto de problemas relacionados à infraestrutura. E tem uma explicação histórica. "As principais vias de acesso do município, como a Avenida Brasil, são resultados de aterros. Quando chove muito, alaga e algumas regiões viram um pântano. As chuvas torrenciais desta terça-feira resultaram de uma soma de eventos: frente fria, massa de ar quente, alta de maré. Com o volume de chuva absurdamente alto, a cidade parou. O Rio precisa, com urgência, de importantes melhoria em sua infraestrutura", disse a pesquisadora.


Alerta da OMS


A OMS alerta que as pessoas pobres que vivem em áreas urbanas sofrem de forma desproporcional de um amplo número de problemas de saúde, por estarem mais expostas a altos índices de violência, doenças crônicas e doenças infecciosas como a tuberculose e a Aids. Os fatores sociais considerados determinantes no cenário da urbanização, de acordo com o órgão, não se restringem apenas ao ramo da saúde, mas também envolvem infraestrutura, governança local, distribuição de renda e oportunidades em educação.


Planejamento urbano


O planejamento urbano, segundo a OMS, é capaz de promover comportamentos saudáveis por meio de investimentos no transporte ativo (bicicletas e outros veículos não motorizados), na prática de atividade física, no controle do tabaco, na segurança alimentar e no saneamento básico. "Tais medidas não requerem, necessariamente, fundos adicionais, mas o compromisso de redirecionar os investimentos para intervenções prioritárias", conclui o órgão.


A expectativa da campanha Mil cidades, mil vidas é de que, até domingo (11/4), sejam inaugurados espaços de saúde por meio de atividades em parques, mutirões de limpeza e fechamento parcial de avenidas para veículos motorizados. A OMS planeja recolher ainda mil histórias dos chamados "campeões de saúde pública" - pessoas que, de alguma forma, tiveram impacto significativo na saúde das cidades onde vivem. Os vídeos podem ser postados aqui.


Publicado em 8/4/2010.

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