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26/11/2007

Documentário dá voz a moradores das comunidades de Manguinhos

Ricardo Valverde


Acostumadas a um cotidiano difícil, de miséria e desigualdade, as 13 comunidades situadas no entorno da Fiocruz, no bairro de Manguinhos, verão, pela primeira vez, as histórias de seus moradores registradas em um documentário. A produção, intitulada Manguinhos: histórias de pessoas e de lugares, estreou no sábado (24/11) e é fruto do projeto Laboratório Territorial de Manguinhos, que reúne unidades da Fiocruz como a Escola Nacional de Saúde Pública, a Escola Politécnica de Saúde, a Casa de Oswaldo Cruz e o Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica em Saúde (Icict), a TV comunitária Atrever e a rede CCAP.


 Alguns dos moradores entrevistados para o documentário

Alguns dos moradores entrevistados para o documentário


Os responsáveis pelo projeto e pelas entrevistas que estão no documentário são a historiadora Tania Fernandes e o arquiteto Renato Gama-Rosa, que coordenaram o trabalho dos bolsistas que colheram os depoimentos dos moradores das comunidades. Em função das entrevistas, Tania analisou a ocupação histórica da região e Gama-Rosa se debruçou sobre a ocupação urbanística. O resultado é o documentário que estréia agora e, futuramente, haverá o lançamento de um site e um livro.


“As comunidades são muito diferentes entre elas. No entorno temos tanto aquela típica imigração portuguesa dos subúrbios cariocas, como no caso do bairro do Amorim, com arruamento, azulejos e decoração lusitanos, quanto comunidades extremamente miseráveis e que surgiram recentemente”, diz Tania. Segundo ela, a história das comunidades de Manguinhos é um resumo da história das políticas habitacionais do Rio de Janeiro. A historiadora afirma que os depoimentos dos moradores deixam claro que as comunidades criam laços de sociabilidade e proximidade, bem longe do estereótipo que associa as favelas a um cotidiano em que só existe violência e nada mais.


 A primeira comunidade que surgiu em Manguinhos, o Parque Oswaldo Cruz, antes dos aterros

A primeira comunidade que surgiu em Manguinhos, o Parque Oswaldo Cruz, antes dos aterros


As comunidades contam, atualmente, com cerca de 50 mil habitantes, que vivem uma área originalmente formada por mangues, que foram sendo aterrados. A região é demarcada pelos rios Jacaré e Faria Timbó e pelo Canal do Cunha, responsáveis por grande parte da poluição da Baía de Guanabara. Essas comunidades surgiram a partir da remoção de populações pobres que moravam na Zona Sul do Rio de Janeiro, da construção de conjuntos habitacionais e parques proletários, migrações de pessoas que saíram de outras comunidades devido a incêndios e inundações e também de regiões como o Nordeste e invasões. A primeira ocupação, chamada Parques Oswaldo Cruz (hoje conhecida como Amorim) se deu em 1904. Hoje, as comunidades são: Amorim, Parque Carlos Chagas, Vila São Pedro, comunidade Agrícola de Higienópolis, Vila Turismo, Parque João Goulart, CHP-2, Vila União, Conjunto Nélson Mandela, Conjunto Samora Machel, Mandela de Pedra, Embratel (Samora II) e Vitória de Manguinhos (Conab).


O que animou os pesquisadores na concepção do projeto foi a esperança, transmitida pelos moradores, de que nem tudo está perdido, apesar das dificuldades que rodeiam as comunidade de Manguinhos. “O Brasil ainda tem jeito, minha filha”, diz Nelson Soares, de 76 anos, com a bandeira do Brasil ao fundo, em sua casa. Em um dos depoimentos, este morador lembra de uma época em que a polícia procurava “comunistas” na Escola de Samba Unidos de Manguinhos: “Tavam (sic) denunciando que tem comunista. Aí eu disse pra eles: ‘aqui não tem comunista não, só tem morto de fome’”.


 As 13 comunidades do entorno da Fundação, em 2007

As 13 comunidades do entorno da Fundação, em 2007


A segunda etapa do projeto – a primeira será encerrada com o site e o livro – prevê o desenvolvimento de uma metodologia que contribua para a promoção da saúde entre os moradores e invista na recuperação e preservação da memória. “Queremos auxiliar os moradores no acompanhamento das obras previstas para a região e que fazem parte do Plano de Aceleração do Crescimento (PAC) do governo federal. Assim eles poderão dialogar com as autoridades e avaliar as políticas públicas que a eles são destinadas”, diz uma das coordenadoras do Laboratório Territorial de Manguinhos, Fátima Pivetta.

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