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26/07/2017

Encontro debate atenção integral à criança em tempos de zika

Aline Câmera (IFF/Fiocruz)


Sob o contexto dos sérios acometimentos nas crianças causados pelo vírus zika, uma parceria entre a Estratégica Brasileirinhas e Brasileirinhos Saudáveis (EBBS), do Instituto Nacional de Saúde da Mulher, da Criança e do Adolescente Fernandes Figueira (IFF/Fiocruz), e a Secretaria Estadual de Saúde (SES) do Rio de Janeiro foi determinante para capacitar os profissionais da atenção básica envolvidos no atendimento a essas crianças e suas famílias. A experiência foi apresentada pela coordenadora da EBBS, Liliana Lugarinho, e pela representante da SES, Thais Severino, durante o Simpósio Brasileirinhas e Brasileirinhos Saudáveis, realizado na Academia Nacional de Medicina (ANM), no dia 13/7. A iniciativa reforçou a importância da integração entre as redes de atenção e as políticas públicas.

Durante a apresentação, elas ressaltaram que o plano de capacitação teve o objetivo de mobilizar as equipes na construção de um fluxograma e de uma linha de cuidado que levasse em consideração a vigilância e o acompanhamento integral das crianças afetadas pela zika e suas famílias “Diante do aumento de casos de microcefalia e, as vésperas das Olimpíadas,   nosso pensamento foi somar esforços para potencializar o trabalho da assistência, no que diz respeito não apenas ao diagnóstico, mas também  ao acolhimento  dessas crianças”, explicou Liliana Lugarinho.

A parceria rendeu resultados importantes. Entre seminários, grupos de discussão, rodas de conversa e oficinas específicas, duas iniciativas chamaram atenção. A primeira, envolveu a Coordenação Técnica de Fisioterapia Motora do IFF/Fiocruz, que realizou a capacitação de um grupo composto por 11 profissionais da Baixada Litorânea do Estado, como desdobramento do curso promovido anteriormente pela EBBS. A segunda refere-se à Oficina de Dança Materna e Hidroginástica promovida com mães e bebês, como uma forma de estimulação precoce das crianças.

O fio condutor da apresentação da diretora do Departamento de Ações Programáticas e Estratégicas (Dapes), do Ministério da Saúde (MS), Thereza de Lamare, foi a estratégia de atenção integral às crianças e famílias afetadas pela Síndrome da Zika Congênita e outras doenças infecciosas e o plano de ação que vem sendo desenvolvido em seis estados do nordeste (MA, CE, RN, AL, SE e BA). Foi destacado que a iniciativa se dá no contexto da implantação da Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Criança (PNAISC) e seus sete eixos, com ações que incluem desde a humanização na atenção perinatal e ao recém-nascido, até o desenvolvimento integral das crianças, com especial atenção para doenças crônicas, deficiências e demais situações de vulnerabilidades: “Em março de 2016, foi iniciada a Estratégia de Ação Rápida. Tínhamos quase cinco mil crianças notificadas com a suspeita de microcefalia e o grande desafio era identificá-las e saber onde elas estavam”, apontou a diretora do Dapes.

Além da identificação e da confirmação do diagnóstico dos casos notificados, a estratégia, oficializada pela Portaria Interministerial Nº 405, de 15/3/2016, também incluiu a questão social. “Era preciso considerar a realidade dessas famílias. A maioria delas era do interior e não tinha condição de se deslocar por conta própria. Por meio da parceria com o Ministério do Desenvolvimento Social, evidenciamos a importância de as crianças receberem benefícios de prestação continuada”.  O acesso ao cuidado em curto prazo e a proteção social às crianças e suas famílias nos casos suspeitos de microcefalia foram garantidos por meio de um repasse aos municípios. “Foi um grande mutirão nacional que envolveu a contratação de transporte e hospedagem para levar as crianças até os centros de referência capacitados”, declarou.

A experiência do Maranhão

O painel que apresentou as contribuições do estado do Maranhão no que diz respeito aos dispositivos de atenção, vigilância, gestão e pesquisa diante da zika, foi composto pelo secretário estadual de Articulação de Políticas Públicas, Marcos Pacheco, da pesquisadora e professora da Universidade Federal do Maranhão (UFMA) Zeni Lamy e pela neuropediatra Patrícia Souza. Ao compartilhar a experiência da equipe que está à frente do atendimento às crianças afetadas pela Síndrome da Zika Congênita e suas famílias no Ninar (Centro de Referência em Neurodesenvolvimento, Assistência e Reabilitação de Crianças) Patrícia Sousa encantou os presentes. “Algo muito forte gritava dentro de nós, enquanto acompanhávamos a chegada daquelas famílias: mães solteiras, avós, mães adotivas, casais jovens. Precisávamos fazer algo a mais por eles, além da consulta médica. Havia uma angustia muito grande, uma necessidade de dar colo a cada uma daquelas pessoas”, lembrou a neuropediatra.

Foi assim que surgiu a Casa de Apoio do Ninar. Dispositivo de atenção destinado às famílias de crianças com distúrbios no desenvolvimento neuropsicomotor, a Casa de Apoio do Ninar surgiu em março do ano passado com uma proposta inovadora: mais do que prestar um serviço de apoio, orientação e assistência multidisciplinar às famílias, a intenção é permitir que os pais possam viver a maternagem que, como apontou a neuropediatra, “lhes foi roubada no momento do diagnóstico precoce da Síndrome da Zika Congênita”. “Não podemos entregar para esta família uma criança com o aspecto físico que eles idealizaram durante a gestação. Contudo, está ao nosso alcance fazer esta criança existir para a sua família, do jeito como ela é. Esta criança não é filha da zika. Esta criança tem uma história que precisa continuar a ser construída”, afirmou a especialista em tom emocionado.

Coube ao acadêmico da ANM José Gomes Temporão, que foi ministro da Saúde, encerrar a sessão solene que marcou a despedida do presidente da Academia Francisco Sampaio deste período de dois anos de sua gestão: “Nesta sessão, apreciamos uma maneira diferente de olhar a questão do desenvolvimento infantil, o que muito contribuiu para a formulação da PNAISC. Por outro lado, foi muito interessante ouvir o relato carregado de emoção sobre os bebês e as famílias que estão envolvidas neste problema tão sério de saúde pública que é a Síndrome da Zika Congênita. As demandas que se colocam na vida real são de tal complexidade que na maioria das vezes nem o arranjo institucional, nem o que pensamos ser uma política adequada conseguem dar conta da carga emocional, técnica e de múltiplas intervenções que estão envolvidas. Por isso, necessitamos construir, como diria Winnicott, políticas públicas suficientemente boas”, finalizou Temporão.

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