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09/10/2007

Encontro reúne institutos nacionais de saúde da AL

Fernanda Marques, Ricardo Valverde e Wagner Oliveira


Termina nesta sexta-feira (12/10) a primeira reunião dos institutos nacionais de saúde pública da América Latina. O evento, organizado pela Associação Internacional de Institutos Nacionais de Saúde Pública (Ianphi), teve a colaboração da Fiocruz e o financiamento da Fundação Bill e Melinda Gates. O objetivo foi o de discutir temas de saúde pública de interesse global e fortalecer a colaboração e a comunicação entre os institutos nacionais de saúde pública da região. O presidente da Fiocruz, Paulo Buss, que é membro do Conselho Executivo da Ianphi, deu entrevista à Agência Fiocruz de Notícias (AFN) antes do evento. Na entrevista ele discorreu sobre os avanços já obtidos desde a criação da instituição, listou os desafios que a Associação terá daqui para frente em suas diversas áreas de atuação, abordou a relação com a Organização Mundial de Saúde (OMS) e as parcerias entre os institutos de saúde, comentou a criação do primeiro congênere após o surgimento da Ianphi, que ocorreu na Guiné Bissau, e antecipou os temas abordados na reunião latino-americana.


 

 Buss prega ampliar intercâmbio para melhor auxiliar países latino-americanos e africanos (Foto: André Az)

Buss prega ampliar intercâmbio para melhor auxiliar países latino-americanos e africanos (Foto: André Az)


AFN: O avanço da pneunomia asiática (Sars) e da gripe aviária nos anos recentes colocou em evidência a cada vez mais crescente globalização das doenças. Como a Ianphi, que atualmente conta com a participação de 50 institutos de saúde pública de diferentes partes do mundo, pode atuar nessa frente em virtude de sua representatividade mundial?

Paulo Buss:
Pela experiência dos institutos associados à Ianphi no diagnóstico de doenças transmissíveis, seus laboratórios têm participação crucial no sistema de vigilância que a OMS está liderando mundialmente para o controle destas doenças.


AFN: Em janeiro de 2007, ao completar um ano, a Ianphi conquistou o financiamento da Fundação Bill e Melinda Gates para um plano de cinco anos. Quais as ações previstas nesse plano e o que já foi realizado até agora?

Buss:
A preparação de recursos humanos e o financiamento de pesquisas estratégicas, juntando dois ou mais institutos, é uma das atividades importantes que vem sendo implementadas pela Ianphi. O apoio ao aperfeiçoamento de institutos existentes ou a criação de novos institutos também recebe o apoio da Ianphi. Exemplos, no caso dos países da CPLP, são o Instituto de Moçambique e o novo Instituto da Guiné Bissau, aos quais, com os recursos da Ianphi, a Fiocruz vem apoiando tecnicamente. Muito importante também foi a elaboração de um documento de marco de referência sobre institutos de saúde pública, uma espécie de roteiro para que os novos aproveitem da experiência acumulada globalmente pelo conjunto de associados do Ianphi, e a assessoria técnica in loco para apoiar as direções que estão reformulando suas instituições.


AFN: Para os institutos que compõem a Ianphi, essa iniciativa significa oferecer ajuda aos parceiros e também receber auxílio deles. Em relação à Fiocruz, até agora, em quais aspectos ela mais ofereceu ajuda e em quais mais recebeu auxílio?

Buss:
O intenso intercâmbio que temos estabelecido com as experiências de outros institutos traz significativa contribuição para o aperfeicoamento das atividades da Fiocruz. Nós temos ajudado muito à Ianphi no apoio aos institutos de países menos desenvolvidos que o Brasil, particularmente aos de língua portuguesa da África e outros da América Latina. Dois exemplos: a constitutição da rede de institutos nacionais de saúde da CPLP e, após esta reunião de institutos da AL aqui no Rio, com a criação da rede latino-americana. Nossa experiência com planejamento e gestão de C&T e servicos de referência é a melhor contribuição que temos dado ao conjunto de institutos. No caso da Argentina, por exemplo, estamos oferecendo um mestrado em laboratórios de saúde pública em Buenos Aires.


AFN: A Ianphi reúne institutos nacionais de saúde pública de todo o mundo e objetiva multiplicá-los, fortalecê-los e estreitar a colaboração entre eles, para fazer frente aos problemas de saúde das populações do planeta. Sendo assim, como a Ianphi se relaciona com a Organização Mundial da Saúde (OMS)?

Buss:
A OMS participa desde as primeiras discussões para formar a Ianphi, principalmente através de Tim Evans, que é um subdiretor da OMS, designado para acompanhar todo o processo. A Ianphi solicitou seu reconhecimento como instituicão associada e colaboradora da OMS, o que será examinado pelo board da OMS em uma de suas próximas sessões.


AFN: Entre os temas que serão abordados nesta reunião dos institutos nacionais de saúde pública da América Latina, destacam-se a pesquisa, o desenvolvimento tecnológico e a inovação em saúde e em ciência e tecnologia em países como Argentina, Chile, Costa Rica, Cuba, Guatemala, México e Panamá. Como anda a questão da inovação em saúde no Brasil e nos nossos vizinhos da América Latina? Quais os principais desafios?

Buss:
Quase todos os institutos têm pesquisa, serviços de referência e ensino de qualidade razoável para boa. A inovação, contudo, depende de processos complexos e financiamento e aí esbarramos em dificuladades, porque o financiamento sustentável da pesquisa é uma das falhas que encontramos na maioria dos países. No caso do Brasil, observamos um enorme esforço de formação de doutores e financiamento que já começam a dar resultados, com a ampliação da presença do Brasil em publicações cientificas. Dentro em breve, tambem encontraremos repercussões na questão da inovação.


AFN: Entre os temas, também destacam-se a educação e a formação de recursos humanos em saúde em países como Brasil, Espanha, Honduras, Paraguai, Peru e Venezuela. Como a Fiocruz - que é referência na formação de profissionais para o SUS - tem contribuído para a formação de recursos humanos em saúde nos países que integram a Ianphi?

Buss:
Apoiamos a formação de mestres e doutores, com oferta de vagas em nossos programas. Mas o relamente inovador é a presença da Fiocruz com mestrados sendo desenvolvidos em outros países, casos de Angola, Moçambique e Argentina. A formação de técnicos de nível médio também começa a ser estruturada em países da CPLP e da América do Sul.


AFN: A Fiocruz integra a Organização do Tratado de Cooperação Amazônica, que congrega institutos de diferentes países e será apresentada aos participantes da reunião. Como a Ianphi pode contribuir para as pesquisas envolvendo a saúde das populações amazônicas?

Buss:
Foi idéia nossa ampliar o acordo de CT&I entre instituições brasileiras para os demais países que compartilham a floresta amazônica. Em Belém, diurante a SBPC de 2007, firmou-se o acordo entre Brasil, Venezuela, Suriname, Colômbia, Equador, Peru e Bolívia para a rede pan-amazônica de cooperação em pesquisa.


AFN: O continente africano dispõe de pouca infra-estrutura de pesquisa e ensino em saúde, em geral.  Como participante do comitê da Ianphi, a Fiocruz pretende ampliar a parceria com países africanos, visto que já vem atuando no apoio à produção de vacinas e medicamentos naquele continente?

Buss:
Como disse, com o apoio a Angola, Moçambique, Guiné Bissau, Cabo Verde e São Tomé e Príncipe nas àreas de desenvolvimento institucional e de recursos humanos de institutos de saúde pública, escolas de saúde pública e escolas politécnicas de saúde. O apoio da Capes, CNPq e ABC tem sido fundamental, compondo-se uma parceria para levar adiante a política externa brasileira que tem na saúde na CPLP e América do Sul suas principais áreas de atuação. Em março vamos instalar o Escritório da Fiocruz na África, credenciado junto à União Africana e com sede física em Maputo, em Moçambique. O presidente Lula e os ministros José Temporão e Celso Amorim têm acompanhado todo o processo, o que se constituti em enorme fator de impulso a estas iniciativas.


AFN: A reunião se encerrará com propostas para a organização da rede Ianphi na América Latina. Quais as propostas que a Fiocruz levará para o encontro?

Buss:
A principal proposta é a elaboração de um plano de cooperação de pelo menos três anos para o desenvolvimento institucional dos institutos, nas áreas de pesquisa, ensino e serviços de referência. A Ianphi vai apoiar os primeiros passos do processo e projetos específicos. Em conjunto, os institutos buscarão outras fontes de financiamento para desenvolver o plano como um todo. É um processo complexo e muito desafiador, mas sinto que todos estão dispostos a trabalhar em conjunto para sua consecução.


AFN: Há alguma outra instituição brasileira que também participe da Ianphi?

Buss:
Cada país tem apenas um instituto participante. No caso do Brasil, é a Fiocruz.


AFN: Os institutos africanos, asiáticos e latino-americanos participam da Ianphi em pé de igualdade com seus congêneres europeus e norte-americanos? Ou, como em grande parte das organizações internacionais multilaterais, ocupam um lugar secundário?

Buss:
Esta tem sido a grande sabedoria da Ianphi: a eqüidade entre seus sócios. Veja por exemplo que o board, órgão máximo de condução da Ianphi, tem como membros Brasil, Marrocos, Nigéria, Tailândia, República Checa e China. São quatro países em desenvolvimento, o que é um bom exemplo da distribuição equitativa do poder na associação.


AFN: Num mundo de recursos econômicos limitados e de grandes constrastes entre os países, realidade que também se reflete na saúde pública, como conciliar as agendas desses institutos nacionais e uma atuação conjunta deles, com as necessidades globais, já que acompanham os objetivos estratégicos de seus governos?

Buss:
O mundo globalizado não admite mais o isolamento de países. Por isso, cada país sabe que será beneficiado da solidariedade entre seu instituto e os demais.


AFN: A Ianphi estimula a criação de institutos nacionais de saúde nos países que ainda não contam com tais organizações. Algum instituto nacional já foi criado a partir da atuação da Ianphi?

Buss:
A Guiné Bissau tem seu instituto em processo de formação, bem como visitas ao Malawi, por exemplo, indicam que brevemente poderemos ter um outro sendo criado lá. A prioridade é a África, mas tambem países da América Latina e da Ásia poderão apresentar projetos para, com apoio técnico de institutos mais experientes, virem a formar suas novas instituições. Os recursos do Ianphi são importantes para o começo do processo, mas os países devem assumir o desenvolvimento dos mesmos, pois estamos falando de institutos públicos e governamentais.

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