Início do conteúdo

03/10/2008

Engenheira pede que estados e municípios se unam pelo banimento do amianto no Brasil

Informe Ensp


O amianto ou asbesto é uma fibra mineral natural extraída de rochas amiantíferas, constituído por feixes de fibras dos quais são produzidos diversos produtos, como telhas ou caixas d'água. Entretanto, as fibras são facilmente inaladas ou engolidas, podendo causar graves problemas de saúde como a asbestose ou mesotelioma. A engenheira civil, coordenadora da Rede Virtual-Cidadã pelo Banimento do Amianto na América Latina e fundadora da Associação Brasileira dos Expostos ao Amianto (Abrea), Fernanda Giannasi, participou de um seminário na Escola Nacional de Saúde Pública (Ensp) da Fiocruz que buscou soluções para a destinação do amianto no Rio de Janeiro. Ela conversou com o Informe Ensp sobre o que pode ser feito pelo banimento do material no país e pelo o que o amianto pode ser substituído para uso da população.


 Fernanda: A Fiocruz tem papel fundamental nas discussões sobre o amianto e é o protagonista número um da área institucional governamental na luta pela erradicação da fibra (Foto: Virginia Damas)

Fernanda: A Fiocruz tem papel fundamental nas discussões sobre o amianto e é o protagonista número um da área institucional governamental na luta pela erradicação da fibra (Foto: Virginia Damas)


Qual é o trabalho exercido pela Rede Virtual-Cidadã pelo Banimento do Amianto na América Latina?


Fernanda Giannasi: A Rede Virtual-Cidadã, como o próprio nome indica, é uma articulação da sociedade civil, que se constituiu após o advento da Rio-92 (Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e Desenvolvimento), no sentido de socializar informações em um primeiro momento e, posteriormente, buscar parcerias com entidades, instituições, outras ONGs e movimentos sociais com a finalidade de pressionar pelo banimento do amianto em toda a América Latina, como já vinha ocorrendo na Europa, gradativamente, desde o final dos anos 80. Hoje, esta é uma luta planetária e estamos engajados nela.


Que tipo de plano pode ser criado pelo governo para implementar o banimento do amianto no Brasil, uma vez que o material já é proibido na Argentina, Uruguai e Chile e em outros países do mundo?


Fernanda: De imediato, é fundamental a aprovação da lei de banimento em nível federal, porque o que temos hoje são leis municipais e estaduais, cada uma com suas peculiaridades. Precisamos uniformizar esta proibição em todo o país para evitar a guerra fiscal entre estados com maior ou menor exigências e a utilização dessa diversidade como desculpa para o adiamento dessas ações. Evidentemente que urgem outras ações governamentais, que vão desde o incentivo e fomento a alternativas econômicas viáveis e sustentáveis para a cidade de Minaçu - onde se situa a maior mina de amianto em atividade na América Latina, reduzindo os impactos socioeconômicos advindos do fechamento da atividade mineral -, até outras ações programáticas que contemplem a proteção social para os trabalhadores, em geral, como a transição segura dos postos de trabalho com a mudança tecnológica e, em particular, para os do setor mineral (aposentadoria antecipada, requalificação profissional dos quase 800 empregados diretos e indiretos do setor mineral que sofrerão maior impacto e que precisarão ser reinseridos no mercado de trabalho).


A conversão do processo produtivo, na indústria de transformação, para uso de tecnologias e materiais asbestos-free somada à vigilância epidemiológica das populações expostas direta (ocupacionalmente) e indiretamente (ambientalmente), a atenção à saúde dos doentes, aposentadoria por invalidez acidentária, indenizações, o inventário da situação das edificações públicas e privadas quanto ao material já instalado e apoio à substituição gradativa e de maneira sustentável e ambientalmente correta destes materiais já instalados contendo amianto, bem como a recuperação de áreas degradadas pela indústria e o resíduo acumulado de maneira irregular, também fazem parte desse repertório de ações que necessitam ser implementadas em nível governamental e através de políticas públicas responsáveis e urgentes.


Uma vez banido, qual o impacto para a população de baixa renda, que terá que trocar suas caixas ou telhas de amianto? A troca não pode ser feita de imediato, já que não há locais seguros para guardar o amianto e evitar assim a contaminação, correto?


Fernanda: Não faz parte dos objetivos das ações da Rede Virtual-Cidadã, e muito menos da Abrea, o incentivo a uma substituição indiscriminada e que ponha em risco a saúde da população. É preciso a normatização desses procedimentos e uma série de definições e responsabilidades, entre as quais, e a mais premente, que é para onde deverá ser transportado e disposto com segurança o lixo contendo amianto e a quem cabem essas ações e responsabilidades.


Que tipos de materiais/fibras alternativas existem para substituir a utilização do amianto?


Fernanda: São muitas as tecnologias asbestos-free que existem para o setor de materiais de construção - que consome 95% do amianto em nosso país -, indo desde as cerâmicas plásticas (muito usadas em caixas d'água e tubulações), metálicas, de argamassas e concreto reforçado, até a dos reciclados (como aparas de pastas dentifrícias, de papelões, de embalagens longa vida, escórias de alto-forno). As fibras que podem substituir o amianto no setor de construção civil já estão disponíveis no mercado brasileiro e muitas delas são usadas em diversos outros produtos há muito tempo, como é o caso da celulose, do PVA (polivinil álcool), fibras acrílicas e o polipropileno, sem nos esquecermos das fibras vegetais. Há, portanto, alternativas para cada gosto e bolso.


Como vê o papel da Fiocruz nessa luta pelo banimento do amianto e da promoção de um seminário como este, que discute o que fazer com o amianto no Rio de Janeiro?


Fernanda: A Fiocruz tem tido um papel fundamental nas discussões sobre o amianto no Brasil e é o protagonista número um da área institucional governamental na luta pela erradicação da fibra cancerígena. Este evento vem em muito boa hora, pois é uma discussão candente nos meios técnicos e extremamente necessária. E aí, mais uma vez, a Fiocruz se coloca junto à sociedade brasileira para propor soluções viáveis técnico-econômicas e socioambientalmente sustentáveis para essa difícil missão da destinação final de resíduo contendo amianto, pois, apesar de termos uma Resolução do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) que o classificou como perigoso - datada de 2004-, até hoje não se definiu nem no Rio de Janeiro e nem em São Paulo o que fazer com o lixo produzido pelo pequeno gerador (entulhos de obras residenciais).


O que temos visto, na prática, são numerosas caçambas/containeres de entulhos espalhadas por toda a cidade, regulamentados ou não, servindo de fonte de riqueza para os mais desprovidos socialmente criarem uma economia paralela, repassando esse risco para populações ainda mais socialmente vulneráveis - que irão reutilizar esses materiais em suas edificações precárias -, expondo-se a grande risco, pois o material já está degradado e fragmentado, liberando fibras para o ambiente. Quando estas pessoas morrem de câncer, ninguém os investiga para saber o que os levou ao adoecimento, e muito menos se apura quem são os culpados a serem responsabilizados.

Voltar ao topo Voltar