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18/06/2010

Ensp/Fiocruz inicia projeto que integra saúde, ambiente e educação em Rondônia

Informe Ensp


Avaliar o risco ao ecossistema da bacia do Rio Madeira e à saúde humana das populações ribeirinha e urbana de Porto Velho em relação às mudanças socioambientais no arco do desmatamento, com foco nos projetos de desenvolvimento para a Amazônia, é o objetivo do projeto da pesquisadora da Escola Nacional de Saúde Pública (Ensp/Fiocruz) Sandra Hacon, contemplada no edital Inova Ensp, junto com o vice-coordenador, Salvatore Siciliano. Além de traçar um perfil de saúde e mortalidade das comunidades ribeirinha e urbana antes dos impactos provenientes do desenvolvimento local, o trabalho consiste também em uma análise integrada entre os campos da saúde humana e animal, o meio ambiente e a educação, tendo como foco as escolas da região.


 O Rio Madeira, em Rondônia, nas proximidades de Porto Velho

O Rio Madeira, em Rondônia, nas proximidades de Porto Velho


A pesquisadora explica que na bacia do Rio Madeira, em Rondônia, existe um passivo ambiental com elevada carga de mercúrio, resultado da atividade garimpeira de ouro desde os anos 80. Até os anos 60, a economia do então território era baseada na exploração da borracha e de castanha-do-pará. O crescimento acelerado só ocorreu a partir dos anos 70 com a política de incentivos fiscais e os intensos investimentos do governo federal, como os projetos de colonização dirigida, estimulando a imigração, em grande parte originária do Centro-Sul. Além disso, o acesso fácil à terra fértil e barata atraiu grandes empresários interessados em investir na agropecuária e na indústria madeireira.


Naquela mesma época, a descoberta de jazidas de cassiterita, ouro e a abertura de rodovias estimularam o crescimento econômico, o povoamento e a degradação ambiental. Em 1981, o Território de Rondônia passou a condição de estado. Atualmente, a capital Porto Velho apresenta os problemas decorrentes do crescimento desordenado, sem infraestrutura de saneamento básico, saúde, energia, dentre outros, somados aos grandes impactos socioambientais com reflexos diretos na saúde das populações.


A dinâmica populacional de vetores, capazes de desencadear novos focos ou surtos de doenças endêmicas da região, além dos existentes, é outro impacto potencial que poderá ocorrer na região. Alguns estudos apontam que, apesar de um acelerado processo de crescimento econômico, Rondônia, principalmente na capital, sofre com uma elevada degradação socioambiental, com consequências para os ecossistemas da região, para a área urbana, gerando pobreza, conflitos sociais e aumento da morbidade e mortalidade da região.


"Junto a isso, a construção das hidroelétricas de Santo Antônio e Jirau, em Porto Velho, embora utilizando tecnologias de ponta na área da construção civil e reduzindo alguns dos impactos sociais e ambientais, pode provocar importantes alterações ambientais na disponibilização do mercúrio nas águas e sedimentos e, consequentemente, na cadeia alimentar dos organismos aquáticos, principalmente peixes, aves e mamíferos da região", explica Sandra.


Outro problema enfrentado na região, e que faz parte do projeto, é o impacto das queimadas no ecossistema amazônico. Entretanto, os efeitos à saúde humana ainda não foram estudados de forma integrada ao componente ambiental em virtude das emissões de gases no ar. A Amazônia Legal, da qual Rondônia faz parte, concentra mais de 85% das queimadas que ocorrem de forma frequente no Brasil durante o período de estiagem das chuvas na região. Além de comprometerem a saúde das populações expostas, as queimadas também afetam o ciclo biogeoquímico do mercúrio, acelerando sua transferência para a cadeira trófica dos organismos aquáticos. Esses organismos também serão estudados buscando identificar indicadores sentinelas para o monitoramento de organismos aquáticos.


"Nosso grupo de pesquisa, em parceria com USP, UFRJ,UNB, PUC, UFRN e Unemat, já vem desenvolvendo estudos em Rondônia com o Laboratório de Biogeoquímica da Unir na área de mineração de cassiterita na bacia do Rio Jamari, no município de Ariquemes, sob a coordenação do biólogo Wanderlei Rodrigues Bastos. Esse estudo já contou com a participação da Escola Padre Ângelo Spadari, da Secretaria de Saúde e Meio Ambiente do município e do estado", explica a pesquisadora. Ela revela que essa parceria integra também o Programa de Pós-Graduação em Saúde Publica e Meio Ambiente da Ensp e o mestrado em desenvolvimento regional e meio ambiente da Universidade Federal de Rondônia. No projeto Inova Ensp, a parceria será ampliada para outros cursos de pós-graduação da Escola.


Sandra cita que a qualidade do ar em Porto Velho nunca foi medida, embora esse seja o segundo estado com o maior número de focos relativos de queimadas no período de 2005 a 2009. O desenvolvimento do projeto permitirá, por meio da parceria com a USP, medir em tempo real e contínuo a cada 15 minutos, por um período de dois anos, um conjunto de poluentes (PM2,5, PM10, O3 e carbono orgânico) para quantificar a exposição à saúde humana e avaliar o incremento de risco para as doenças respiratórias e cardiovasculares, principalmente para os grupos etários mais vulneráveis na bacia do Madeira. A abordagem metodológica proposta irá integrar a saúde, o ambiente e a educação. Uma análise de risco também será realizada para avaliar a exposição e o incremento de risco ao mercúrio por meio do consumo de peixe e do indicador de exposição com a quantificação do mercúrio em cabelo de crianças de 6 a 14 anos.


O grupo de condução do projeto, que conta com 19 pesquisadores e alunos da Ensp e de outras unidades da Fiocruz e de instituições externas já mencionadas, acredita que, pela abordagem participativa junto aos moradores da região, poder público local e lideranças comunitárias, seja possível contextualizar melhor a realidade integrada entre saúde, ambiente e desenvolvimento, refletindo assim as preocupações das comunidades expostas aos impactos ambientais da Bacia do Madeira.


"Para tanto, torna-se fundamental uma abordagem metodológica que contemple uma ampla discussão, ao nível local, sobre o projeto e sua inserção no cenário local e regional, um inquérito epidemiológico, incluindo a autoavaliação da saúde, a quantificação da exposição aos poluentes atmosféricos e aquáticos, com as estimativas do incremento de risco, a avaliação das tendências de morbidade e mortalidade em relação aos novos cenários socioeconômicos e ambientais relacionados aos projetos de desenvolvimento da região, os indicadores de vulnerabilidade para as comunidades expostas e a percepção socioambiental das mudanças socioambientais", destaca Sandra Hacon.


A pesquisadora ressalta que a pesquisa não se limita somente à avaliação dos efeitos à saúde, mas também ao bem-estar humano. "O projeto pretende contribuir diretamente para a inserção da dimensão da saúde na avaliação dos impactos socioambientais em projetos de desenvolvimento através de sua abordagem integrada com os atores sociais do território desde o inicio do projeto", disse.


O projeto também tem a preocupação de discutir a abordagem metodológica da integração da saúde, ambiente e educação com as secretarias municipais e do estado. Para harmonizar essa discussão, o projeto tem como um dos objetivos estruturar e realizar um curso de curta duração em dois módulos, um teórico e outro prático, em dois momentos da pesquisa, de modo a permitir que os atores envolvidos no projeto compreendam como podemos trabalhar com essa abordagem integrada vivenciando estes três componentes: saúde, ambiente e educação, ou seja "aprender fazendo".


"Esses e outros produtos serão importantes para as políticas públicas de saúde, meio ambiente e educação, considerando o atual estágio de desenvolvimento da região com foco na construção das hidroelétricas de Santo Antonio e Jirau. O projeto conta com a adesão das secretarias de Saúde, Meio Ambiente e Educação de Porto Velho", conclui Sandra.


Publicado em 15/6/2010.

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