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28/07/2008

Especialista discute história sociocultural da tuberculose e do tabagismo

Fernanda Marques


O historiador argentino Diego Armus foi o palestrante do dia 24/07 no Encontro às Quintas, evento promovido pela Casa de Oswaldo Cruz (COC) da Fiocruz. Doutor pela Universidade da Califórnia-Berkeley e professor de História da América Latina no Swarthmore College, nos Estados Unidos, Armus apresentou seu último livro, La Ciudad Impura, que trata da história da tuberculose em Buenos Aires entre 1870 e 1950. O palestrante também adiantou alguns aspectos de seu novo projeto: um livro sobre a história do hábito de fumar na capital argentina.


 Capa do livro <EM>La Ciudad Impura</EM>, de Diego Armus

Capa do livro La Ciudad Impura, de Diego Armus





Em La Ciudad Impura, a tuberculose é utilizada como pano de fundo para abordar a história sociocultural de Buenos Aires. “Os aspectos biomédicos, o Estado e as políticas fazem parte do livro, mas não são temas centrais. A ênfase está em situações socioculturais, ou seja, usei a tuberculose para discutir outros problemas”, afirmou Armus.



O historiador destaca que, no período estudado, os indivíduos com tuberculose que circulavam nos hospitais de Buenos Aires eram poucos se comparados ao total de pessoas doentes. Isso indica que havia trajetórias terapêuticas diferentes da medicina dita científica e institucionalizada. Muitos indivíduos recorriam às medicinas chamadas populares.



No entanto, Armus questiona os estereótipos que contrapõem as figuras do médico e do curandeiro. “Havia médicos que utilizavam os recursos da medicina popular, assim como havia curandeiros que utilizavam recursos da medicina diplomada”, explicou. Para ilustrar a aproximação entre essas duas figuras, o historiador mostrou antigos anúncios de medicamentos. “Eram tônicos polivalentes, vendidos sem receita e recomendados tanto por médicos quanto por curandeiros”. Essa aproximação ocorria, em certa medida, devido à incerteza biomédica, inclusive porque, no período estudado, não havia uma terapia eficaz disponível contra a tuberculose.



Outro questionamento feito por Armus diz respeito à imagem do sanatório e seu caráter disciplinar. “Era uma instituição que tinha, sim, um lado disciplinar, mas também era um lugar de transgressões, como demonstra o relacionamento entre um diretor e uma paciente”, contou.

Na primeira metade do século XX, a tuberculose também representou um problema relativo à imigração, na medida em que se buscava selecionar os imigrantes evitando aqueles povos com uma suposta predisposição à doença. Nesse contexto, os galegos – em geral, pobres – eram considerados um grupo nacional predisposto à tuberculose. “Fazia-se uma interpretação arbitrária da epidemiologia da tuberculose”, disse Armus.



Nem mesmo o espartilho escapou do olhar atento do autor ao contar a história da tuberculose em Buenos Aires. “Médicos da época diziam que o espartilho facilitava a tuberculose, mas as mulheres continuavam usando. Por quê? Guardadas as devidas proporções – afinal, estamos falando de uma sociedade patriarcal –, o espartilho era um símbolo de auto-afirmação da mulher, um recurso de sedução”, argumentou. Não era à toa que, em jornais e revistas da época, anúncios de espartilhos ficavam próximos aos anúncios de tabaco, estes associados aos homens viris. 



Quanto à história do hábito de fumar na capital argentina, ela também tem sido alvo de pesquisa de Armus e será tema de seu próximo livro. A obra, conforme o historiador adiantou, será composta por quatro partes. Na primeira, ele abordará o hábito em si, o que engloba os espaços de fumar, como os cafés e os cabarés; a oferta e a comercialização dos cigarros; e a introdução de produtos ingleses e norte-americanos.



A segunda parte mostrará os discursos que sustentaram o hábito de fumar, o que inclui letras de tango, a literatura e a propaganda. Já a terceira parte será dedicada aos discursos que condenavam o cigarro, como aqueles que, desde as primeiras décadas do século XX, associavam o tabagismo a doenças.



Por fim, a quarta parte apresentará as trajetórias de fumantes, desde aqueles que sempre fumaram muito, sem planos de parar, até aqueles que deixaram de fumar e se transformaram em ferrenhos militantes anti-tabaco. “O tabagismo sempre foi culturalmente aceito na Argentina. Isto só começou a mudar a partir da criação do conceito de fumante passivo”, balizou Armus.


Publicado em 28/07/2008

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