Início do conteúdo

02/07/2015

Especialistas cobram mudanças na política de drogas no Brasil

César Guerra Chevrand


Modernizar as políticas públicas relacionadas à maconha e às drogas no país, com base em informações científicas e nas experiências internacionais de descriminalização, é o principal desafio apontado por especialistas do tema, reunidos nesta quarta-feira (1º/7), no primeiro dia do seminário Maconha: usos, políticas e interfaces com a saúde e direitos, realizado no auditório da Escola de Magistratura do Rio de Janeiro (Emerj).

A Lei de Drogas de 2006 foi um dos temas da mesa Maconha: Usos, políticas públicas e pesquisa científica (fotos: Peter Ilicciev)
 

Mediada por Isabela Soares dos Santos, pesquisadora da Escola Nacional de Saúde Pública (Ensp/Fiocruz) e vice-presidente do Centro Brasileiro de Estudos de Saúde (Cebes), a mesa Maconha: Usos, políticas públicas e pesquisa científica contou com a presença de representantes do Programa Institucional Álcool, Crack e outras Drogas (PACD) da Fiocruz, do Ministério da Justiça e da Saúde e da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

Coordenador do PACD/Fiocruz, Francisco Inácio Bastos defendeu a mudança da legislação brasileira, à luz da ciência e das experiências internacionais
 

Pesquisador do Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica em Saúde (Icict/Fiocruz) e coordenador do PACD/Fiocruz, Francisco Inácio Bastos chamou a atenção para os exemplos de reformulação de políticas de drogas em países como Portugal, Espanha e, mais recentemente, Uruguai. Bastos apontou ainda que a produção científica refinada e consistente sobre o tema infelizmente não se transforma em decisões políticas objetivas.

“De todas as substâncias, a maconha é a que é mais colocada no fio da navalha, entre o legal e o ilegal, o terapêutico e o danoso. A ciência brasileira precisa enfrentar essa questão de forma não preconceituosa e criteriosa. O Brasil precisa de uma avaliação sistemática de todas as possíveis aplicações de derivados da maconha, da mesma forma que é feita em outros países”, afirmou o coordenador do Programa Institucional Álcool, Crack e outras Drogas da Fiocruz.

Representante da Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas (Senad), Leon Garcia fez duras críticas à Lei nº 11.343, de 2006
 

Diretor de Articulação e Coordenação da Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas (Senad) do Ministério da Justiça, Leon Garcia elogiou a parceria da Fundação Oswaldo Cruz com o governo federal e apresentou dados alarmantes sobre os impactos do sistema legal brasileiro em relação a usuários e traficantes de drogas no país. “A Lei nº 11.343, de 2006, despenalizou o porte para consumo, mas aumentou substancialmente o número de presos por tráfico de drogas no país. A legislação não estabelece critério objetivo de diferenciação entre usuário e traficantes”, criticou Garcia.

Citando dados do Sistema Integrado de Informações Penitenciárias (InfoPen) relacionados a drogas, o representante da Senad apontou a prevalência de presos primários, com participação pouco relevante na estrutura do tráfico, e disse ser alta a probabilidade da prisão de usuários como se fossem traficantes. “É importante que a gente não discuta a questão das drogas apenas pelo ponto de vista da segurança pública. Muitos fazem uma correlação simplista entre uso de drogas e violência, uma correlação que não se encontra demonstrada cientificamente”, disse, apontando o alto consumo de drogas e os baixos índices de violência na Europa e nos Estados Unidos.

Ivo Bucaresky afirmou que a Anvisa já aprovou mais de 700 pedidos de uso de canabidiol no Brasil
 

Presidente da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), Ivo Bucaresky reafirmou o papel fundamental de sua agência na regulação das pesquisas clínicas e dos produtos que chegam à sociedade brasileira, garantindo sua eficácia e segurança. Ao analisar o caso do canabidiol, um derivado da maconha com utilidade médica para tratar diversas doenças, Bucaresky disse que o uso medicinal de uma droga não se confunde com seu uso recreativo.

“Nós temos que ir além de qualquer preconceito. A morfina é um ótimo exemplo de uma droga que também pode ser usada como medicamento. Nós tiramos o canabidiol da lista de substâncias proibidas e passamos para a lista de substâncias controladas. Qualquer pessoa que queria utilizar o canabidiol, com uso medicamentoso, pode utilizar a substância com a autorização da Anvisa”, disse o presidente da instituição, afirmando que já foram aprovados 769 pedidos de uso de canabidiol no país.

Roberto Tykanori discutiu o uso e abuso de drogas sob o ponto de vista da Saúde Mental
 

Representante da Coordenação Geral de Saúde Mental, Álcool e Outras Drogas (CGMAD) do Ministério da Saúde, Roberto Tykanori falou dos impactos para a saúde pública de uma possível substituição do álcool pela maconha. “Muitos pesquisadores apontam a maconha como o melhor substituto para o álcool, reduzindo os danos e os custos que a sociedade tem com acidentes de trânsito, por exemplo. Do ponto de vista da Saúde Pública, parece de fato uma alternativa para o menor dano individual e social”, assinalou.

Leia mais:

Informação científica qualifica debate sobre drogas no país

Voltar ao topo Voltar