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12/12/2006

Espera por transplante tem solução, diz artigo da 'Cadernos de Saúde Pública'

Fernanda Marques


Um estudo pioneiro no Brasil apresenta estimativas dos tempos de espera nas filas para transplantes de diferentes órgãos. Sem levar em conta a taxa de mortalidade na fila, um paciente aguarda, em média, cerca de um ano e meio por um coração. E esse é o prazo mais curto. A espera por um rim pode ultrapassar 11 anos, de acordo com artigo publicado na edição de outubro da revista Cadernos de Saúde Pública.



Os dados revelam que o Sistema Único de Saúde (SUS) está sobrecarregado, embora o Brasil tenha o maior programa público de transplantes do mundo, pois financia 92% dos procedimentos, e seja o segundo país em número de transplantes, atrás apenas dos Estados Unidos. A boa notícia é que “existem grandes oportunidades para diminuir as longas filas para transplantes no SUS”, segundo o autor da pesquisa, o doutor em economia Alexandre Marinho, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj).



Em 2003, o Brasil fez 24 transplantes por dia, com gastos totais de R$ 334 milhões. Mas, no final daquele ano, em torno de 56 mil pessoas ainda aguardavam a sua vez em uma fila. Nos longos períodos de espera, os pacientes, invariavelmente, têm sua qualidade de vida prejudicada e seu estado de saúde agravado. Alguns falecem sem ter tido a oportunidade de um transplante. A mortalidade à espera de um fígado é de quase 55%.



As metas do governo são, em 2007, zerar a espera por córnea e reduzir a fila por órgãos sólidos em 12%. “Não são metas impossíveis, mas exigem mudanças estruturais, de médio e longo prazos. Mutirões e campanhas pontuais não têm efeitos duradouros. O grande desafio é melhorar a captação e o aproveitamento efetivo dos órgãos que podem ser doados. Temos capacidade tecnológica. O que nos falta é capacidade administrativa”, diz Marinho. No Brasil, há cerca de dez mil doadores potenciais, a maioria jovens vítimas de traumatismo craniano. De cada oito doadores potenciais, apenas um é notificado e, de cada cinco notificados, somente um é aproveitado como doador de múltiplos órgãos.



Na análise dos prazos de espera por transplantes de coração, córnea, fígado, pulmão, rim e pâncreas, o economista adaptou um modelo matemático tradicionalmente usado para estudar qualquer tipo de fila. Esse modelo mostra que, se as taxas de chegada de novos pacientes às filas de transplantes subissem 10%, os prazos de espera se tornariam infinitos. Por outro lado, se as taxas médias de serviços de transplantes tivessem aumento de 10%, as filas praticamente terminariam. Restariam apenas oito pessoas aguardando por transplantes de pulmão e pâncreas, com prazos de espera inferiores a cinco meses.



O desafio, então, é colocar em prática estratégias capazes de aumentar as taxas de serviços. O autor da pesquisa tem sugestões de como isso poderia ser feito. “Faltam comissões intra-hospitalares para administrar as doações. Os médicos desconhecem os procedimentos, não notificam pacientes com morte cerebral e, assim, desperdiçam potenciais doadores. Às essas deficiências de recursos humanos, somam-se as carências materiais. Para aproveitar os órgãos, pode ser necessário manter uma pessoa com morte cerebral na UTI por horas ou dias, o que gera um dilema, porque há pacientes com chances de cura que precisam ocupar esse leito. As taxas de serviço cresceriam se esses e outros problemas fossem equacionados”, opina Marinho, que já apresentou seus resultados em diversos seminários, como na Universidade Federal do Rio Grande do Sul e na Universidade de Coimbra.



De modo geral, o atendimento para transplante obedece a ordem de chegada dos pacientes à fila, com algumas exceções. No entanto, em junho de 2006, a publicação Saúde, Brasil, do Ministério da Saúde, divulgou que o critério para transplante de fígado havia sido alterado. No caso desse órgão, a fila, agora, passa a ser orientada em ordem decrescente de gravidade.

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