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18/02/2010

Estudo identifica motivos de satisfação e queixas com os serviços de saúde

Rita Vasconcelos


O grau de satisfação dos usuários com os serviços de saúde, tanto no atendimento ambulatorial como na internação hospitalar, foi o tema de uma tese de doutorado defendida este ano no Centro de Pesquisa Aggeu Magalhães (CPqAM/Fiocruz Pernambuco). A pesquisa incluiu não só os usuários do Sistema Único de Saúde (SUS), mas também aqueles que pagam pelos serviços ou utilizam os planos privados de saúde (denominados não-SUS). O item dos serviços que recebeu a melhor avaliação foi o respeito à intimidade, com 93,9% de satisfação para os usuários do SUS e 97,1% para os do não-SUS. Por outro lado, o principal motivo de insatisfação foi o tempo de espera por atendimento nos serviços ambulatoriais. No grupo do SUS, 55% dos usuários se queixaram da demora no atendimento ambulatorial – problema também detectado no grupo do não-SUS.


 Cerca de 25% da população brasileira são cobertos por planos privados de saúde e 75% usam o SUS

Cerca de 25% da população brasileira são cobertos por planos privados de saúde e 75% usam o SUS


O caso de Maria das Graças Mello, 45 anos, ilustra essa situação. Para ela, os movimentos do ponteiro do relógio na sala de espera parecem multiplicar cada segundo por dez. Há três horas ela aguarda para fazer um exame de rotina num consultório particular, no Recife. “A gente faz um esforço para pagar o plano de saúde, mas os atrasos são constantes”, conta a usuária. A tese de doutorado de Giselle Campozana Gouveia, pesquisadora do Departamento de Saúde Coletiva da Fiocruz Pernambuco, confirma que o caso de Maria das Graças não é isolado: de acordo com a pesquisa, 27% dos usuários do não-SUS estavam insatisfeitos com a demora no atendimento ambulatorial.


“Os principais problemas identificados pelos usuários foram os mesmos nos grupos do SUS e do não-SUS”, diz Giselle, orientada pelo professor Wayner Vieira de Souza. “No caso da internação hospitalar, a liberdade de escolha do profissional de saúde foi o item que demonstrou menor grau de satisfação em ambos os grupos”, acrescenta. A tese analisou dados oriundos da Pesquisa Mundial de Saúde (PMS), inquérito populacional de âmbito nacional realizado em 2003. Sob coordenação de Célia Szwarcwald, pesquisadora do Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica em Saúde (Icict/Fiocruz), a PMS revelou que 25% da população brasileira eram cobertos por planos privados de saúde, enquanto os 75% restantes utilizavam o SUS.


Segundo Giselle, embora fosse plausível que os usuários do não-SUS, com melhor condição socioeconômica, tivessem maior nível de expectativa e avaliassem mais rigorosamente os serviços prestados, com maior grau de insatisfação, os resultados da PMS não confirmaram tal hipótese. “Possíveis explicações podem estar na melhor qualidade da assistência privada e/ou na constatação de que existe um grau de expectativa já elevado na população, usuária ou não do SUS”, comenta a pesquisadora.


A tese se baseou em dados de entrevistas com cerca de 4 mil brasileiros. Giselle considerou como fatores determinantes da satisfação dos usuários não apenas a cura, a restauração da capacidade funcional e a redução do sofrimento. Ela também levou em conta o tratamento respeitoso por parte dos profissionais de saúde; o tempo de espera para o atendimento; a maneira como a intimidade foi respeitada durante os exames físicos e o atendimento. Foram analisados, ainda, a liberdade de escolha do profissional de saúde; a disponibilidade de tempo para fazer perguntas sobre o problema de saúde ou o tratamento; a clareza nas explicações dadas pelos profissionais de saúde; a privacidade na conversa com os profissionais; o sigilo das informações pessoais; e a limpeza das instalações e o espaço disponível das salas de espera e de exames.


Além disso, perguntou-se aos entrevistados se haviam sofrido discriminação nos serviços de saúde por conta de sua cor, sexo, idade, falta de dinheiro, classe social, tipo de doença ou nacionalidade. No caso dos usuários que passaram por internações hospitalares, foram considerados outros dois aspectos: a facilidade em receber visitas de familiares e amigos; e a facilidade de estar em contato com o mundo exterior.


Para identificar e solucionar problemas


Em 2004, o Governo de Pernambuco identificou como necessidade urgente avaliar o desempenho do sistema de saúde no estado, na perspectiva do usuário. Para otimizar esse trabalho, a Fiocruz, junto com outros centros colaboradores permanentes da Secretaria Estadual de Saúde de Pernambuco (SES-PE), foi contratada para realizar a Pesquisa Mundial de Saúde com foco na Atenção Básica (PMS-AB). Em 2005, utilizando questionários adaptados da PMS brasileira, a PMS-AB avaliou o desempenho do sistema de saúde de Pernambuco. Dessa forma, foi possível avaliar o grau de satisfação dos pernambucanos com os serviços básicos de saúde.


Os usuários de Pernambuco mostraram alto índice de insatisfação com a disponibilidade de medicamentos. Apenas 56,3% dos usuários do não-SUS e quase a mesma proporção dos usuários do SUS (56,6%) estavam satisfeitos com o acesso aos medicamentos. “Esses percentuais sugerem que havia problemas de ordem estrutural no âmbito da assistência farmacêutica estadual”, afirma Giselle. “Os números, porém, se referem a 2005 e, diante dos resultados, o estado já fez investimentos no sentido de melhorar a situação”, pondera. A segunda maior queixa dos pernambucanos foi a mesma dos demais usuários do país: o tempo de espera até o atendimento ambulatorial, com um pequeno agravante para os usuários do não-SUS: 31% de insatisfação.


Em busca da equidade


A partir dos dados da PMS e da PMS-AB, um terceiro estudo foi desenvolvido. Nele, a percepção dos usuários de Pernambuco sobre os serviços de saúde foi comparada com a dos usuários das cinco regiões do país. De acordo com essa análise, a menor chance de satisfação com os serviços de saúde foi verificada entre os moradores do Nordeste e, em especial, de Pernambuco. Os residentes na região Sul, por sua vez, tiveram a maior chance de satisfação com os serviços. Os resultados dessa comparação também indicaram que jovens, usuários exclusivos do SUS, com baixa escolaridade e percepção negativa da própria saúde eram os mais propensos à insatisfação com os serviços em todo território nacional. “Somente com a aplicação real do conceito de equidade será possível reduzir as diferenças regionais em saúde”, destaca Giselle.


Publicado em 18/2/2010.

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