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06/03/2008

Estudo identifica proteínas essenciais ao desenvolvimento da hanseníase

Bel Levy


Uma iniciativa promovida pelo Instituto Oswaldo Cruz (IOC) da Fiocruz, em parceria com a Universidade do Colorado, nos Estados Unidos, dá novo impulso ao estudo do agente etiológico causador da hanseníase – a micobactéria Mycobacterium leprae – ao pôr em prática uma abordagem até então pouco utilizada na área: a proteômica. A partir do seqüenciamento genético da bactéria, obtido em 2001 pelo Instituto Pasteur, pesquisadores do IOC deram início a análises proteômicas do patógeno, a fim de identificar proteínas essenciais à expressão da micobactéria e ao desenvolvimento da hanseníase, indicando novos caminhos para a investigação de métodos diagnósticos e vacinas para a doença que registra 300 mil novos casos por ano no mundo, segundo dados da Organização Mundial de Saúde (OMS).


 Análises proteômicas <EM>in vivo</EM> indicam quais as proteínas essenciais para a evolução da <EM>M. leprae</EM> no organismo hospedeiro, apontando alvos terapêuticos e marcadores imunobiológicos da hanseníase

Análises proteômicas in vivo indicam quais as proteínas essenciais para a evolução da M. leprae no organismo hospedeiro, apontando alvos terapêuticos e marcadores imunobiológicos da hanseníase


“O seqüenciamento do genoma da M. leprae abriu novas perspectivas para o estudo da biologia deste patógeno ao revelar algumas peculiaridades, como um número reduzido de genes em relação à bactéria ancestral que o originou. Esta redução é resultado, provavelmente, de um processo de seleção natural que teria eliminado parte do genoma da bactéria ancestral, preservando apenas os genes essenciais à sobrevivência da M. leprae. A partir desta informação, aplicamos técnicas proteômicas sobre o material genético da micobactéria a fim de identificar as proteínas expressas pelos genes preservados, essenciais para a evolução da bactéria no organismo hospedeiro”, apresenta a bioquímica Maria Cristina Vidal Pessolani, pesquisadora do Laboratório de Microbiologia Celular do IOC e coordenadora do estudo.


A equipe de pesquisadores precisou ultrapassar um importante obstáculo ao estudo da M. leprae: não há cultura in vitro da micobactéria, que apenas se desenvolve no sistema nervoso periférico humano. Também não existe modelo experimental animal que reflita fielmente a infecção no homem. A amostra utilizada na pesquisa, preparada pela Universidade do Colorado, foi purificada a partir de tecido de tatus infectados em laboratório, único animal artificialmente suscetível à doença. Vencido o desafio, tiveram início as análises proteômicas in vivo, no Laboratório de Toxinologia do IOC.


“A tecnologia proteômica permite identificar e quantificar simultaneamente as proteínas expressas por um determinado organismo. É uma ferramenta estratégica, especialmente para o estudo da M. leprae, em que nem todas as proteínas são expressas pelo código genético. A contribuição da proteômica neste caso é fundamental porque permite determinar quais proteínas realmente são expressas pelo genoma, isto é, quais as estruturas imprescindíveis à sobrevivência da micobactéria e ao estabelecimento da infecção, informações de grande valor para o estudo de doenças infecciosas, como a hanseníase. E, como a amostra utilizada é proveniente do tecido de um animal infectado em laboratório, podemos dizer que executamos análises proteômicas in vivo, o que confere maior segurança aos dados obtidos” garante o chefe do Laboratório de Toxinologia do IOC, Jonas Perales.


Agora, o objetivo dos pesquisadores é identificar, a partir do resultado das análises proteômicas, possíveis alvos para a investigação de marcadores imunobiológicos que subsidiem o desenvolvimento de um método diagnóstico para a identificação precoce da hanseníase. Assim, será possível iniciar o tratamento anteriormente à evolução da doença e ao aparecimento de sintomas, interrompendo o quanto antes a transmissão e evitando seqüelas graves.

 

Pesquisa contribui também para estudo de micobactéria causadora da tuberculose


A análise proteômica in vivo da M. leprae produz resultados também para o estudo da Mycobacterium tuberculosis, agente etiológico causador da tuberculose. As duas micobactérias provêm de uma mesma bactéria ancestral e apresentam genomas semelhantes: dos 1.600 genes que compõem a M. leprae, 1.450 são encontrados na M. tuberculosis. A partir da premissa de que se os dois patógenos compartilham genes e proteínas, é possível que desfrutem dos mesmos alvos terapêuticos e marcadores imunobiológicos. Assim, os pesquisadores do IOC acreditam poder sugerir indiretamente novos alvos para a pesquisa em tuberculose, a partir do conhecimento sobre a M. leprae.


“Devido ao compartilhamento genético e proteômico das duas micobactérias, podemos deduzir que as proteínas expressas pela M. leprae, que regulam seu ciclo de vida e o desenvolvimento da hanseníase, sejam as mesmas expressas pela M. tuberculosis. Portanto, podemos supor que as proteínas identificadas como alvos terapêuticos e marcadores imunobiológicos para a hanseníase podem ser aplicadas também para a tuberculose”, Maria Cristina explica.


“De forma análoga ao estudo da hanseníase, a grande vantagem desta pesquisa para a produção de conhecimento sobre tuberculose é a análise in vivo das proteínas que compõem as micobactérias, o que nos dá a certeza de que os dados obtidos são realmente referentes às patologias em questão”, comemora Perales.

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