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21/08/2008

Estudo sugere novas recomendações para o calendário de vacinação

Informe Ensp


Administrar, simultaneamente, várias vacinas em uma mesma visita dos usuários aos serviços de saúde tem sido uma estratégia bastante utilizada para evitar a perda de oportunidades de vacinação. Mas será que isso não interfere no resultado das vacinas de vírus vivos atenuados, reduzindo a proteção esperada contra determinadas doenças? Procurar responder a esta pergunta foi o objetivo da farmacêutica Juliana Romualdo do Nascimento da Silva em sua pesquisa para o mestrado de saúde pública da Fiocruz. A dissertação Avaliação da interferência da vacinação contra febre amarela na vacinação contra rubéola traz resultados que podem embasar novas recomendações para o calendário vacinal no país.


 Abertura da Campanha Nacional de Vacinação para a Eliminação da Rubéola (Foto: Wilson Dias/ABr)

Abertura da Campanha Nacional de Vacinação para a Eliminação da Rubéola (Foto: Wilson Dias/ABr)


"O meu trabalho trata do componente rubéola da vacina tríplice viral - sarampo, rubéola e caxumba - e a interferência que a vacinação simultânea contra febre amarela poderia causar na resposta imunológica às vacinas", conta Juliana, que complementa: "Sempre tive interesse em estudar, de algum modo, as doenças negligenciadas. A oportunidade de trabalhar com a vacina contra febre amarela e a vacina triviral veio de um projeto, coordenado pelo meu orientador, no qual eu me inseri quando ingressei no mestrado. O aprofundamento do estudo no componente rubéola, por sua vez, se deu por sua relevância clínico-epidemiológica em razão dos surtos epidêmicos recentes, que vêm atingindo adultos jovens em várias partes do país, aumentando o risco de casos de rubéola congênita".


A rubéola é uma doença viral (causada por vírus) aguda, altamente contagiosa que atingia preferencialmente crianças, mas a implantação da vacinação há cerca de dez anos aumentou a importância da doença nos adultos. A síndrome de rubéola congênita (SRC) ocorre quando a mulher é infectada pelo vírus da doença durante as primeiras semanas da gravidez. A infecção da mãe, transmitida ao feto por meio da placenta, pode resultar em aborto, morte fetal ou anomalias congênitas como diabetes, catarata, glaucoma e surdez, entre outras. "Considerando que a rubéola é uma doença imunoprevenível (que pode ser evitada por meio de vacina) e que há um plano de erradicação da SRC nas Américas até 2010, todos os fatores que possam afetar a resposta à vacinação contra a doença devem ser cuidadosamente avaliados, a fim de subsidiar decisões para novas ações", justifica a pesquisadora.


A vacina contra rubéola existe nas formas dupla viral, combinada à vacina contra sarampo, e tríplice viral, que inclui ainda a vacina contra caxumba. Em campanhas de vacinação, como a que está ocorrendo desde 9 de agosto, ambas as formas são usadas.


Febre amarela e rubéola: vacinação simultânea pode reduzir eficácia da imunização


No Brasil, a vacina contra febre amarela e a vacina combinada contra sarampo, rubéola e caxumba (triviral) são dadas simultaneamente na rotina para crianças de 12 meses de idade apenas no Distrito Federal. Nos demais estados das regiões Centro-Oeste e Norte e algumas áreas das regiões Nordeste, Sudeste e Sul, onde a vacina contra febre amarela é feita aos 9 meses de idade, a administração simultânea dessas vacinas é recomendada para as crianças de 12 meses ou mais de idade que não receberam as duas vacinas.


Para avaliar a interação da vacina contra febre amarela e da vacina contra rubéola combinada com sarampo e caxumba, a pesquisa analisou amostras de sangue de crianças de 12 a 23 meses, usuárias de unidades públicas de saúde do Distrito Federal, que receberam, pela primeira vez, as vacinas triviral e de febre amarela concomitantemente ou com 30 dias de intervalo. "Eu analisei os dados de Brasília obtidos em crianças de 12 meses ou mais, mas este estudo foi multicêntrico e os resultados dos outros centros abordaram também as questões relativas a outros fatores potencialmente modificadores da resposta à vacina contra febre amarela em lactentes de 9 meses", ressalta Juliana.


Em crianças vacinadas simultaneamente, 90,6% ficaram imunizadas contra a rubéola e 66,8% contra a febre amarela. Nos vacinados contra febre amarela 30 dias após a triviral, as proporções subiram para 97,3% e 85,9% respectivamente, mostrando que existe interferência recíproca da resposta imune para o componente rubéola da triviral e para a vacina contra febre amarela.


A pesquisa mostrou que o excelente desempenho do componente rubéola na vacina triviral foi prejudicado pela aplicação simultânea à vacina contra febre amarela. A recíproca, no entanto, não foi tão clara por causa da combinação dos componentes sarampo, rubéola e caxumba, ainda que estudos anteriores tenham mostrado que a vacina contra febre amarela induziu cerca de 98% de resposta em crianças maiores e adultos. Nestes grupos etários, a interferência entre as vacinas talvez não seja tão relevante. É importante ressaltar também que estes resultados não se aplicam a indivíduos que estão sendo revacinados.


Para Juliana, os resultados da pesquisa indicam rever a recomendação do Programa Nacional de Imunizações brasileiro de vacinação simultânea contra febre amarela e rubéola para evitar oportunidades perdidas. Contudo, a campanha de vacinação contra rubéola e sarampo em curso no país não deverá ser afetada já que está dirigida a adultos e adolescentes.


"A estratégia de vacinação simultânea se baseia no interesse de que o indivíduo seja imunizado contra mais de um tipo de doença em uma mesma visita a um centro de saúde. Os resultados obtidos não desautorizam a aplicação simultânea das vacinas triviral e contra febre amarela, já que não há aumento nos eventos adversos quando as vacinas são aplicadas no mesmo dia, mas indicam uma revisão nas recomendações de saúde pública porque as respostas para rubéola e para febre amarela são mais baixas", afirma, enfatizando: "O contexto epidemiológico desses agravos deve ser analisado antes de se tomar uma decisão. Caso não seja possível adiar a aplicação de uma das vacinas devido a um surto ou epidemia, a idéia é recomendar a revacinação em período mais curto que o proposto atualmente".


As decisões, de acordo com Juliana, também devem levar em conta dados sobre ocorrência e distribuição das doenças em uma região. "As implicações dos resultados nas regiões endêmicas, onde a vacina contra febre amarela é feita aos 9 meses de idade, são diferentes das áreas não-endêmicas, onde esta vacina só é administrada em caso de deslocamento para zona endêmica", conclui.


Publicado em 21/08/2008.

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