Início do conteúdo

25/10/2011

Evento aborda criação de sistema nacional de defesa civil nos moldes do SUS

Filipe Leonel


Uma das maiores tragédias climáticas da história do país não deixou apenas mortos, feridos e desabrigados no estado do Rio de Janeiro. Nove meses após as chuvas que atingiram a região serrana do estado (cerca de 900 pessoas morreram e mais de 30 mil ficaram desabrigadas ou desalojadas), os setores saúde e defesa civil ainda buscam tirar lições da tragédia, dar respostas à população e atuar na prevenção de riscos. Em evento na Escola Nacional de Saúde Pública (Ensp/Fiocruz), realizado na última quarta-feira (19/10) em função da Semana Nacional de Ciência e Tecnologia, do Dia Nacional de Redução de Desastres de Origem Natural e da Semana Nacional de Redução de Desastres, foi discutida a importância de ter um sistema nacional de defesa civil nos moldes do SUS, além da necessidade de saber traduzir e transmitir as informações à população.


 Os setores saúde e defesa civil ainda buscam tirar lições da tragédia, dar respostas à população e atuar na prevenção de riscos. 

Os setores saúde e defesa civil ainda buscam tirar lições da tragédia, dar respostas à população e atuar na prevenção de riscos. 





Primeiro a falar, o coronel Roberto Robadey Júnior, da Secretaria de Estado de Defesa Civil do Rio de Janeiro (Sedec) e do Corpo de Bombeiros Militar do Estado do Rio de Janeiro (CBMERJ), afirmou que a tragédia ocorrida na região serrana do Rio de Janeiro pode ser considerada o oitavo maior evento de deslizamentos do mundo, em função do número de mortos e de deslizamentos numa mesma região. Na ocasião, de acordo com ele, choveu cerca de 220mm em um período de 10 horas. "A Defesa Civil entra em alerta quando a precipitação de chuvas passa de 80mm em 24 horas", explicou Robadey.


O coronel afirmou que a chuva causou danos em todos os setores da cidade, interrompendo o abastecimento de energia, água e telefonia fixa, e também atingindo todas as rodovias de acesso, hospitais, transportes públicos, indústria, turismo e comércio. "Nova Friburgo era o maior produtor de hortaliças do estado. Tudo foi destruído", comentou. Robadey revelou, em seguida, que os deslizamentos ocorridos no Peru em 1983 tinham sido os mais caros da história, com um custo de US$ 988 milhões necessários para reerguer o local, segundo o The International Disaster Database. "O orçamento calculado para reerguer Nova Friburgo chega a US$ 1 bilhão", admitiu, para ressaltar, logo em seguida, que o orçamento municipal é de R$ 350 milhões.


Em relação ao trabalho realizado após a tragédia, foram identificadas 431 áreas de deslizamento, com o detalhamento de 251 áreas. "Um sistema de sirenes, como é utilizado hoje em dia no Rio de Janeiro, é uma importante forma de alertar a população. Entretanto, seu custo gira em torno de R$ 50 mil. Com os recursos destinados à Defesa Civil de Nova Friburgo naquela época seria impossível empregar esse tipo de equipamento", ressaltou. O palestrante concluiu lembrando que a tragédia ocorrida em janeiro deste ano foi um grande desastre nacional, e alertou para que todos os setores da sociedade e da política fiquem atentos à possibilidade de um próximo evento.


Vigilância na qualidade da água e ações educativas em saúde


Na palestra seguinte, a subsecretária de Vigilância em Saúde da Secretaria de Estado de Saúde do Rio de Janeiro, Helen Miyamoto, abordou as ações e o enfrentamento do setor saúde em situações de calamidade. Segundo ela, em situações de calamidade, cabe ao SUS a vigilância da qualidade da água para consumo humano, o controle de vetores e reservatórios, a assistência ao paciente, além de ações de educação em saúde. "Após o evento de calamidade, o setor saúde deve tomar medidas de prevenção permanentes, alertar para o surgimento de doenças após a passagem da chuva e orientar residências afetadas pelas chuvas quanto a fios desencapados, escapamento de gás e desinfecção do reservatório de água",afirmou a subsecretária.


Miyamoto falou sobre o trabalho de inspeção sanitária realizado em estabelecimentos de gênero alimentício e nos abrigos criados para receber as populações, além dos atendimentos feitos. "Em Nova Friburgo tivemos 1.780 atendimentos hospitalares, 580 consultas com assistentes sociais, 87 consultas de assistência psicológica e 420 bolsas de sangue coletadas, o que correspondeu a 210 litros", disse. Ela citou ainda as ações de vigilância epidemiológica, com vacinação contra tétano, hepatite A e raiva (em animais). Por fim, apontou a realização do Curso de Ações de Saneamento em Situações de Emergência, fruto da parceria estabelecida com a Funasa, a SES e a Secretaria de Estado de Defesa Civil, que rendeu aulas práticas e teóricas em todos os municípios do estado.


"Não podemos perder essa referência da redução de impactos como uma função da saúde publica"


O coordenador da mesa, o pesquisador do Cesteh/Ensp Carlos Machado, lembrou que a Organização Panamericana de Saúde (Opas) definiu como 11ª função essencial da saúde pública a redução dos impactos das emergências e desastres em saúde pública. Entretanto, sua adaptação pelo Conselho Nacional de Secretários Estaduais de Saúde do Brasil eliminou essa função, incluindo a descentralização e a regionalização. "Não podemos perder essa referência da redução de impactos como uma função da saúde publica", destacou o pesquisador.


Machado finalizou destacando a importância de o Sistema Nacional de Defesa Civil possuir um financiamento nos moldes do SUS, estabelecido por critérios epidemiológicos, que perpasse municípios, estados e o governo federal. "Ameaças de vulnerabilidade deveriam nortear os critérios de financiamento", afirmou.


O tenente-coronel Márcio Motta, subsecretário municipal de Defesa Civil e debatedor da mesa, falou sobre o sistema de alertas, que, segundo ele, deixa as pessoas "minimamente acordadas nos locais de risco", e comentou a definição de desastre. "O desastre é um evento indesejado e inesperado. Indesejado ele é, mas não podemos afirmar que é inesperado. Quando perguntamos às crianças nas escolas qual a época do ano que mais chove, elas respondem dezembro e janeiro. Portanto, sabemos que o evento vai acontecer. Precisamos é alertar toda a sociedade, saber traduzir e transmitir as informações, além de agir de forma convincente e íntima com a população", esclareceu.



Publicado em 25/10/2011.

Voltar ao topo Voltar