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13/09/2007

Exposição e livros lembram o centenário de nascimento de Amilcar Vianna Martins

Elizabeth Fleury


Na noite dessa terça-feira (11/09) a Academia Mineira de Medicina, a Associação Médica de Minas Gerais, a Fundação Ezequiel Dias, o Instituto Cultural Amilcar Martins, a Universidade Federal de Minas Gerais e a Fiocruz se uniram para prestar homenagem ao centenário de nascimento do pesquisador Amilcar Vianna Martins. A cerimônia reuniu centenas de pesquisadores, contemporâneos, além familiares e amigos do cientista, lotando o salão nobre da Associação Médica de Minas Gerais, em Belo Horizonte. A solenidade também contou com a abertura de exposição de painéis biográficos e lançamento de dois livros – Amilcar Vianna Martins: ciência para a saúde, de Beatriz Borges Martins, e Professor Amílcar Vianna Martins: ciência para a saúde, organizado por Lisabel Klein. Na ocasião, o ex-diretor do Instituto René Rachou (IRR), unidade da Fiocruz em Minas, e pesquisador do Laboratório de Esquistossomose da instituição, Naftale Katz, recordou em seu discurso oficial as passagens mais importantes da carreira científica de Amílcar Vianna Martins.


 Membros da Academia de Medicina de Minas Gerais na homenagem a Amilcar Martins (Fotos: IRR)

Membros da Academia de Medicina de Minas Gerais na homenagem a Amilcar Martins (Fotos: IRR)


A exposição dos oito painéis com textos e fotos sobre sua carreira profissional foi organizada por Lisabel Klein, assessora da Vice-presidência de Desenvolvimento Institucional e Gestão do Trabalho da Fiocruz. Além dos painéis, que têm textos de Pamela Lang e designer gráfico de Luís Cláudio Calvert, haverá uma vitrine com medalhas, diplomas e microscópio, instrumentos de trabalho do pesquisador. Sobre o livro Prof. Amílcar Vianna Martins – ciência para a saúde, que também será lançado na cerimônia de homenagem ao centenário do pesquisador, Lisabel antecipa alguns detalhes.


 A viúva de Amilcar, Beatriz Borges Martins, autografa o livro

A viúva de Amilcar, Beatriz Borges Martins, autografa o livro


“O livro tem um texto de Nara Azevedo e Simone Kropf . Conta ainda com uma entrevista que ele concedeu à Casa de Oswaldo Cruz em 1988, com a edição de Wanda Hamilton. Depois tem um texto do Naftale Katz  (As contribuições científicas de Amilcar Vianna Martins, pesquisador e sanitarista), que faz uma análise da produção científica do professor Amílcar”. São republicados três artigos originais do professor Amílcar sobre as três doenças nas quais ele trabalhou – um deles é um trabalho importante sobre o método de sedimentação e concentração (é de 1937 publicado em uma  revista já extinta); outro trabalho sobre um foco de leishmaniose tegumentar americana em Minas. É um trabalho que ele publicou com Zigman Brener, José Pellegrino e M. T. Barretto. O terceiro é um trabalho sobre doença de Chagas, publicado nas Memórias do Instituto Oswaldo Cruz em 1940, sobre a tripanosomíase americana em Minas e no Brasil. Amílcar Martins, Valdemar Versiani e Antônio Tupinambá assinam o trabalho.



“Colocamos no livro também alguns documentos - correspondências do Henrique Aragão, do Amílcar para o Evandro Chagas, do Fernando Lobo (embaixada brasileira em Washington), que comunica ao ministro Capanema (de Educação e Saúde), falando da estadia de Amílcar e Emmanuel Dias nos Estados Unidos, para onde vão estudar a febre maculosa. Tem uma carta escrita por Evandro Chagas, comunicando a Amílcar a publicação de seu artigo nas Memórias do IOC. Alguns recortes de jornal, por exemplo um de O Globo, sobre a contaminação de Amílcar Martins por Chagas. Esta contaminação na verdade ocorreu em 1936 e O Globo fala disto 19 anos depois, em agosto de 1957. Creio que foi quando começaram os sintomas. Terminamos o livro com um caderno de fotos interessante, com registros por exemplo da época da Segunda Guerra, quando o professor participou da  campanha na Itália (foi para o Hospital do Exército)”, conclui Lisabel.


 O pesquisador publicou 104 trabalhos científicos de 1935 a 1991

O pesquisador publicou 104 trabalhos científicos de 1935 a 1991


Entre as atividades comemorativas do centenário, haverá ainda uma exposição de fotos que se inicia no Instituto René Rachou, em Belo Horizonte, a partir desta quinta-feira (13/09). Finalmente, ainda no René Rachou, a comunidade científica lembrará, com uma pequena cerimônia para os familiares do professor Amílcar Martins, marcada para as 14h de 28 de setembro.


O legado de Amilcar Vianna Martins


O significado científico da figura de Amílcar Vianna Martins em Minas Gerais ainda será objeto de muitas pesquisas no campo da história da ciência. Mas já é consenso na comunidade científica dizer que ele atingiu, em sua época, um peso à altura das tradições iniciadas por Carlos Chagas. Digamos que Amílcar Vianna Martins seria o Oswaldo Cruz dos mineiros, se é possível estabelecer uma comparação nestes termos. Porém, a figura do professor Amílcar ultrapassa os portões da academia para ingressar na história, em vista do significado de resistência política que seu grupo sempre teve para os democratas mineiros que viviam a dura experiência dos Anos de Chumbo, como já foi chamado o período dos governos militares. Esta semana se comemora o centenário de seu nascimento e os mineiros se mobilizam para uma revisão de sua vida e obra como se preparassem para um ritual.


 Desde o início da carreira, Martins associou o trabalho em um órgão de pesquisa com a universidade

Desde o início da carreira, Martins associou o trabalho em um órgão de pesquisa com a universidade


O centenário propriamente dito ocorreu em 9 de setembro, dia do nascimento do pesquisador e professor, em 1907, em Belo Horizonte. Dezessete anos depois o pesquisador ingressava no curso de medicina da então Universidade de Minas Gerais, hoje UFMG. Atraído logo cedo para a atividade de pesquisa, o jovem Amílcar se aproximaria do Instituto Biológico Ezequiel Dias (filial do Instituto Oswaldo Cruz) já no ano seguinte, em 1925, quando cursava o segundo ano de medicina. Hoje o Instituto se chama Fundação Ezequiel Dias, órgão estadual de pesquisa e produção de fármacos, soros e vacinas. “Seguramente, à época, era o mais importante centro de pesquisas de Minas Gerais”, garante o pesquisador Naftale Katz, do alto de seus mais de 30 anos dedicados às ciências da saúde, e autor destas informações, que constam do artigo que publica sobre o professor Amílcar no livro organizado por Lisabel Klein.


Curiosamente fundado no mesmo ano de nascimento de Amílcar, o Instituto Ezequiel Dias, conta Katz, recebia visita periódica dos grandes pesquisadores que trabalhavam no Instituto Oswaldo Cruz, no Rio de Janeiro, e também contava em seu quadro local com uma gama de pesquisadores de primeira ordem. Freqüentando um ambiente científico por excelência durante todo o curso médico, Martins também freqüentava como auxiliar acadêmico o Instituto Biológico Ezequiel Dias. “Após a formatura foi nomeado médico (pesquisador) do mesmo Instituto em 1930. Desde o início de sua carreira, Martins sempre associou o trabalho científico em um órgão de pesquisa com a universidade. De fato, de 1930 a 1935 foi sucessivamente assistente das cadeiras de fisiologia, histologia e parasitologia da Faculdade de Medicina da UFMG, concomitantemente com as atividades científicas desenvolvidas no Instituto Ezequiel Dias”, diz o artigo de Katz.


O pesquisador mineiro publicou 104 trabalhos científicos de 1935 a 1991, tendo o último aparecido no prelo quando já havia falecido (13 de abril de 1990). Seu primeiro trabalho científico foi publicado em 1935 e versou sobre grupos sangüíneos entre os índios botocudos do Rio Doce (Martins & Bastos 1935). “Fazendo um levantamento de suas publicações por grandes temas – registrou Katz em seu artigo –, pode-se ver que três foram principalmente as áreas onde este grande pesquisador e sanitarista esteve envolvido: esquistossomose, doença de Chagas e flebotomíneos”.


Segundo este artigo, Amílcar publicou 16 trabalhos na área de esquistossomose, especialmente sobre diagnóstico, tratamento e também caramujos, hospedeiros silvestres e distribuição geográfica; sobre doença de Chagas, 11 trabalhos versando sobre vetores e fases clínicas, especialmente a fase aguda e distribuição geográfica da doença e dos vetores; e sobre os flebotomíneos, 64 trabalhos, abrangendo a sua distribuição em todas as Américas e dando especial contribuição na descrição de dezenas de novas espécies.


“Em 1937, Martins publicou seu primeiro trabalho sobre esquistossomose”, registrou Katz. No trabalho, ele comparou o valor para o diagnóstico da busca de ovos de Schistosoma mansoni pelo método de sedimentação e concentração com o exame direto. Este trabalho foi publicado na revista Brasil-Médico, no Rio de Janeiro. A mesma revista que, em 1908, publicou a descoberta por Pirajá da Silva da esquistossomose no Brasil. “Neste trabalho e nos seguintes sobre diagnóstico, Martins faz interessante descoberta. Mostrou que autores anteriores que tentaram encontrar esquistossomose em diferentes estados brasileiros não o haviam conseguido ou o fizeram apenas em poucos casos, porque estavam utilizando o método diagnóstico errado”, registrou Katz.

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