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05/11/2012

Fiocruz auxilia no combate à endemia de esporotricose no Rio de Janeiro

Renata Moehlecke


Preocupada com a saúde de seu animal de estimação, a aposentada Lenice de Souza levou a gata Carmita ao Laboratório de Pesquisa em Dermatozoonoses em Animais Domésticos do Instituto de Pesquisa Clínica Evandro Chagas (Ipec/Fiocruz), único local no Rio de Janeiro a oferecer atualmente, mas no âmbito de projetos de pesquisa clínica, exame clínico, diagnóstico, tratamento e acompanhamento gratuito contra a esporotricose. Causada pelo fungo Sporothrix schenckii, a doença é uma micose que pode afetar animais e humanos. A esporotricose é considerada rara na forma de zoonose, ou seja, quando transmitida do animal para o homem. Porém, desde o final da década de 1990, no Estado do Rio de Janeiro, a ocorrência da doença em animais, especialmente em gatos, e sua transmissão para humanos assumiram proporções epidêmicas. De lá para cá, mais de 4 mil gatos e 200 cães com esporotricose já foram diagnosticados no Ipec, assim como já foram verificados mais de 2,2 mil casos em humanos.


 Nos gatos doentes, as manifestações clínicas da esporotricose são variadas: lesões na pele, que costumam evoluir rapidamente, e espirros frequentes são os sinais mais comuns. Foto: Peter Ilicciev. 

Nos gatos doentes, as manifestações clínicas da esporotricose são variadas: lesões na pele, que costumam evoluir rapidamente, e espirros frequentes são os sinais mais comuns. Foto: Peter Ilicciev. 


“A esporotricose é um problema de saúde pública, decorrente, principalmente, de situações como a ausência de um programa ou ações de controle da doença em humanos e animais, da falta de unidades de atendimento aos animais com o problema, de medicação gratuita para o seu tratamento em humanos e animais, do desconhecimento das medidas de controle da esporotricose por parte da população, além da dificuldade multifatorial no tratamento da micose nos gatos”, explica a médica veterinária Isabella Dib. “Hoje, o Ipec conta apenas dois ambulatórios para o estudo de animais com esporotricose e por este motivo não tem capacidade para atender a demanda exacerbada do Estado do Rio de Janeiro. Por ser uma instituição de pesquisa, somente os animais que se enquadram em projetos de pesquisa clínica são atendidos e tratados, conforme o que ocorre com todas as linhas de pesquisa do Instituto. Nosso principal objetivo é tentar obter respostas para o controle da doença, o que acaba incluindo também a assistência dentro dos projetos de pesquisa clínica. Dessa forma, encaminhamos os casos que não se enquadram em nossos estudos para outras instituições que oferecem esse auxílio veterinário”. 


A doença era comum em jardineiros, agricultores ou pessoas que tivessem contato com plantas e solo em ambientes naturais onde o fungo pudesse estar presente em materiais orgânicos. “Até 1998, a fonte de infecção era ambiental e o número de casos registrados no instituto não passa de dez por ano”, explica Isabella. Os pacientes eram provenientes, sobretudo, dos municípios de Duque de Caxias, São João de Meriti e Nova Iguaçu. “Não se sabe ao certo como a epidemia começou, mas, hoje, a situação já se tornou endêmica na região metropolitana do estado do Rio”, acrescenta.


A transmissão entre animais e na forma zoonótica tem ocorrido através de arranhaduras, mordeduras ou contato com as secreções de lesões de gatos doentes. “Os cães parecem não desempenhar um papel importante nesta epidemia, não havendo sido comprovada, a partir dos casos atendidos no Ipec, a transmissão ao ser humano por esses animais. Provavelmente, os poucos casos de infecção em cachorros foram devido ao contato desses com gatos doentes”, comenta a médica veterinária.


Nos gatos doentes, as manifestações clínicas da esporotricose são variadas: lesões na pele, que costumam evoluir rapidamente, e espirros frequentes são os sinais mais comuns e auxiliam a identificação do problema. O tratamento é prolongado (em casos mais graves, com duração de mais de um ano) e exige cuidados especiais pelo dono para que este não contraia a doença. Outras instituições públicas e privadas da Região Metropolitana do Rio de Janeiro (como a Unidade de Vigilância e Fiscalização Sanitária de Zoonoses Paulo Dacorso Filho, em Santa Cruz, o Unidade Municipal de Medicina Veterinária Jorge Vaitsman, a Universidade Federal Fluminense e a Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro) também realizam atendimento clínico, diagnóstico e prescrição de tratamento para a esporotricose. “No entanto, o grande problema é a indisponibilidade de medicamento gratuito”, aponta Isabella.


A médica veterinária ainda destaca que, como não existe notificação compulsória da doença, sua real incidência no Rio de Janeiro é desconhecida, sendo praticamente impossível estimar a dimensão da endemia. Ela acrescenta que diversos aspectos ainda tornam a situação difícil de ser controlada. “Muitos proprietários que são infectados pelos animais temem outros casos no domicílio e abandonam seus gatos longe das residências, favorecendo ainda mais a disseminação da doença”, destaca Isabella. “Outros sacrificam os animais, jogando os corpos em terrenos baldios ou enterrando-os nos quintais, favorecendo a perpetuação do fungo no meio ambiente”.


Carmita, a gata adotada por Lenice, constituía um desses casos de abandono de animal doente na rua. Após dez meses de tratamento, a aposentada agradece o acolhimento prestado pelos veterinários do Ipec. “O atendimento da Fiocruz não foi somente importante: foi tudo para mim. Conheço outras pessoas que tratam os seus bichos aqui e dizem a mesma coisa. Tenho muito carinho pela instituição porque, sempre que precisei, tive toda a atenção possível”, afirma.



Publicado em 5/11/2012.

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