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03/08/2007

Fiocruz lidera projeto pioneiro na área de bioarqueologia

Catarina Chagas e Fernanda Marques


Pela primeira vez, a Escola Nacional de Saúde Pública (Ensp) da Fiocruz está entre as instituições que coordenam um trabalho de escavação arqueológica. O local escolhido para o trabalho de campo é um sítio cuja data é estimada entre três e cinco mil anos, às margens do Rio Cubatão, em Joinville (SC). No sítio, chamado Cubatão 1, são encontrados muitos sepultamentos humanos, o que caracteriza um antigo cemitério do povo construtor dos sambaquis – construção pré-histórica formada por pedras, terra e conchas. A expectativa é encontrar mais de cem esqueletos, que ajudarão a traçar um perfil demográfico e de saúde do povo que habitou a região na pré-história – uma iniciativa inédita na América do Sul.


 Esqueleto adulto encontrado no sítio arqueológico Cubatão 1 (Fotos: Sheila M. de Souza)

Esqueleto adulto encontrado no sítio arqueológico Cubatão 1 (Fotos: Sheila M. de Souza)


De maio a julho, mais de 20 pessoas participaram da etapa inicial de escavação, trabalho que envolveu pesquisadores da Fundação, do Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro, do Museu Arqueológico do Sambaqui de Joinville e do Museu de Arqueologia e Etnologia da Universidade de São Paulo, entre outros. O projeto conta com financiamento do Centre National de la Recherche Scientifique, órgão francês de incentivo à pesquisa.


 Laboratório do Museu Arqueológico do Sambaqui de Joinville recebe materiais coletados na escavação

Laboratório do Museu Arqueológico do Sambaqui de Joinville recebe materiais coletados na escavação


A equipe da Ensp é considerada referência na América Latina no estudo das doenças no passado, mas, até agora, a maioria dos materiais analisados havia sido coletada por outros grupos, em escavações cujo objetivo principal não estava voltado às áreas da biologia e da saúde. “Nossa ida a campo possibilitará pesquisas mais aprofundadas, pois vamos estar lá no momento da coleta do material”, ressalta a paleopatologista Sheila Mendonça de Souza, que coordena o trabalho na Fundação. “Quando essa coleta é feita sem os cuidados próprios da bioarqueologia, alguns detalhes importantes para a compreensão das doenças que acometiam as populações antigas se perdem”.


 Vista do sítio arqueológico estudado, às margens do Rio Cubatão, em Joinville

Vista do sítio arqueológico estudado, às margens do Rio Cubatão, em Joinville


Algumas pistas para essa investigação, como resquícios de DNA e ovos de parasitos, podem não estar presentes nos esqueletos, mas sim no solo da sepultura. Além disso, a correta manipulação dos ossos – por vezes, muito frágeis – permite identificar lesões e outros sinais relevantes para a interpretação dos achados. Esse tipo de cuidado, necessário ao estudo das doenças na pré-história, é característico da bioarqueologia, ainda pouco explorada no Brasil.


O sítio em Joinville é um sambaqui de dez metros de altura. Os restos de uma mulher adulta sepultada ao lado de um jovem, ambos com as mãos espalmadas sobre o rosto e em posição fetal, foram os primeiros achados da expedição. Dezenas de amostras coletadas já estão em laboratórios para análise com diversos objetivos, como datação precisa do sítio, identificação de DNA humano, reconhecimento de lesões ósseas associadas a infecções e violências, detecção de material genético e ovos de parasitos, estudo da fauna e flora da época.


Até agora, a equipe interdisciplinar – composta por arqueólogos, geólogos, biólogos, médicos, museólogos, historiadores e outros profissionais – já explorou cerca de 40 metros quadrados do sambaqui. “Já nessa primeira etapa obtivemos amostras que vão gerar teses e dissertações”, comemora Sheila. “Mas isso é só começo. O projeto, incluindo escavações e análises laboratoriais, deve durar, pelo menos, quatro anos”. A próxima ida a campo está prevista para 2008, provavelmente entre maio e agosto, período menos chuvoso na região.

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