05/10/2016
As infecções respiratórias são responsáveis por mortes e hospitalizações no mundo todo. Muitas vezes, o agravamento dos pacientes é causado pelo processo de inflamação dos órgãos do sistema respiratório. Apesar de ser uma resposta imunológica importante do organismo à invasão pelos mais variados micro-organismos, a reação inflamatória pode levar a quadros exacerbados. Nestas situações, o que deveria ser uma resposta benéfica pode acarretar efeitos danosos, como o comprometimento dos pulmões e o aumento da mortalidade. Pesquisadores do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz) estudam formas de reduzir os impactos nocivos do processo inflamatório durante as infecções respiratórias. Para isso, buscam formas de controlar a molécula CXCR2, uma das responsáveis por induzir a inflamação. O trabalho, ainda em fase de desenvolvimento, recebeu o prêmio Jovem Cientista de uma rede internacional de pesquisas vinculada à Fundação Mérieux. O projeto é realizado em parceria com a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
O estudo mostra que, durante testes com animais, houve benefícios no uso de um inibidor da molécula CXCR2 no tratamento de três quadros de infecção respiratória: a gripe causada pelo vírus Influenza A (H1N1); a pneumonia causada pela bactéria Streptococcus pneumoniae, uma das causas mais comuns desta doença pulmonar; e uma forma combinada dos dois quadros, com origem viral e bacteriana, o que procura simular a ocorrência de infecções secundárias, bastante comuns em pacientes. “Os experimentos foram desenvolvidos na UFMG, sob orientação do professor Mauro Martins Teixeira, durante meu doutorado. Atualmente, coordeno o estudo à distância”, afirmou Cristiana Couto Garcia, atual pesquisadora do Laboratório de Vírus Respiratórios e Sarampo do IOC/Fiocruz.
Para reduzir os níveis de inflamação, os pesquisadores utilizaram uma substância sintética chamada DF2162. Ela é capaz de inibir a molécula CXCR2, evitando que, no processo de resposta inflamatória, a ativação de glóbulos brancos no organismo se torne exagerada, com possíveis efeitos danosos para o organismo. Ao longo dos testes, os pesquisadores avaliaram o controle do processo inflamatório de acordo com uma série de parâmetros: os níveis de inflamação, com base na quantidade de neutrófilos, a carga de patógenos (vírus e bactérias, dependendo do caso), o peso corporal do animal e os índices de letalidade.
O tratamento com a substância DF2162 foi iniciado em diferentes momentos em cada uma das três situações estudadas. Na primeira delas, relativa à infecção pelo vírus da gripe, os camundongos receberam o tratamento nos cinco primeiros dias de infecção. Já na segunda situação, que utilizou a bactéria S. pneumoniae, os animais foram tratados de 6 a 48 horas após a infecção. Por fim, nos testes de infecção secundária, os camundongos infectados com o vírus influenza receberam tratamento entre o terceiro e o sexto dia de infecção, quando os sintomas aparecem. Depois de 14 dias, foram infectados também com a bactéria S. pneumoniae, tendo as condições avaliadas 48 horas após a segunda infecção.
De acordo com a análise, nas três situações a resposta inflamatória foi modulada a partir do bloqueio da molécula CXCR2 e resultou em melhorias na evolução dos quadros de infecção respiratória, sem comprometimento na resposta imune do organismo. Os resultados apontam que a administração da substância DF2162 reduziu os índices da perda de peso em todas as situações estudadas. Houve queda da letalidade nos casos de infecção pela bactéria S. pneumoniae e de infecção secundária. Na situação de infecção causada pelo vírus influenza, houve queda no nível de inflamação e nos danos pulmonares. Em relação à infecção por S. pneumoniae, também houve diminuição nas lesões pulmonares, embora não tenham sido constatadas alterações na carga bacteriana. “A partir dos resultados positivos, uma perspectiva de continuidade dos estudos seria investigar a inibição da molécula CXCR2 como estratégia terapêutica para o tratamento de infecções pulmonares em humanos, em combinação com medicamentos antibióticos e antivirais”, concluiu Cristiana.
Reconhecimento
O estudo recebeu o primeiro lugar em uma premiação dedicada a jovens cientistas da GABRIEL Network, sigla em inglês para Global Approach to Biological Research, Infectious Diseases and Epidemics in Low-income countries. Os resultados preliminares da pesquisa foram apresentados no encontro anual da Rede, realizado em Vientiane, capital do Laos, na Ásia. No evento, mais de 100 especialistas, de 25 países, compartilharam experiências, apresentaram oportunidades de parcerias e discutiram avanços científicos sobre doenças infecciosas.
Criada pela Fundação Mérieux, a GABRIEL Network promove o compartilhamento de conhecimentos na área das doenças infecciosas, com destaque para o treinamento de pesquisadores e técnicos para a identificação de agentes patogênicos e atuação em trabalho de campo. A rede reúne laboratórios de 11 países, incluindo o Laboratório de Vírus Respiratórios e Sarampo do IOC/Fiocruz, liderado pela virologista Marilda Siqueira, referência nacional para o vírus influenza, além de instituições da França, China e Haiti.