Agência Fiocruz de Notícias

Localizado no campus da Fiocruz, no Rio de Janeiro, o Centro de Pesquisa Rio do Estudo Longitudinal de Saúde do Adulto (Elsa) foi inaugurado no último dia 16 de junho, marcando uma etapa importante do estudo multicêntrico, desenvolvido com outras cinco instituições de ensino e pesquisa do país. Dois mil voluntários, servidores da Fiocruz, participarão da primeira pesquisa longitudinal brasileira sobre a influência de fatores sociais, biológicos e hábitos de vida na ocorrência de doenças cardiovasculares e diabetes, que estão entre os principais problemas de saúde pública no Brasil. Ao todo, 15 mil voluntários participarão da pesquisa. O centro de pesquisa conta com equipamentos modernos para exames clínicos e laboratoriais, voltados para a saúde cardiovascular e metabólica. Em entrevista, as coordenadoras do estudo e pesquisadoras da Escola Nacional de Saúde Pública (Ensp) da Fiocruz Dora Chor e Marília Sá Carvalho discorrem sobre o estudo inovador e da sua importância para a Fundação e para a epidemiologia brasileira.

Qual é a importância do Elsa para a Fiocruz? E para o Brasil?

Marilia Sá Carvalho: O Estudo Longitudinal de Saúde do Adulto (Elsa) é uma investigação multicêntrica, que envolve seis instituições públicas de ensino e pesquisa do país – UFBA, Ufes, UFMG, UFRGS, USP e Fiocruz – ,e é financiado pelo Departamento de Ciência e Tecnologia do Ministério da Saúde, pelo CNPq e pela Finep. Trata-se do maior estudo epidemiológico financiado no Brasil. É inovador no país porque é um estudo de coorte que, por permitir acompanhar ao longo do tempo as mudanças no estado saúde-doença, é o exemplo por excelência de estudo epidemiológico voltado para a identificação de possíveis causas do adoecimento. É inovador também porque trata de doenças do coração e de diabetes, que são as maiores causas de morbimortalidade de adultos no Brasil.

A maior tradição de pesquisa na Fiocruz é em doenças transmissíveis. O porte desse estudo abrirá um imenso campo de pesquisa em doenças crônicas não-transmissíveis na Fiocruz, com todo o impacto potencial daí decorrente, incluindo a geração de informações que possam subsidiar a formulação de políticas públicas visando à prevenção dessas doenças no Brasil.

Como será o processo de atendimento dos voluntários?

Dora Chor: Até o momento, cerca de 500 servidores fizeram contato com o Elsa-Rio. Esse contato pode ser feito por meio de e-mail (elsa@fiocruz.br), telefone, site, preechimento da ficha de contato (ainda a ser distribuída). No primeiro contato, todos os aspectos do estudo serão detalhadamente explicados, bem como serão solicitados a leitura e a assinatura do termo de consentimento para participação em pesquisa. A partir daí, o servidor responderá a perguntas iniciais e terá agendada sua visita ao centro de pesquisa para responder a um questionário e dar início a um conjunto de exames previstos.

Quando surgiu a idéia do estudo e por quê?

Dora: A idéia surgiu da compreensão da necessidade de realizar um estudo longitudinal sobre as doenças cardiovasculares, primeira causa de mortalidade no Brasil, e do diabetes mellitus tipo 2. Existem inúmeros fatores reconhecidos internacionalmente como aqueles que aumentam o risco de desenvolver essas doenças (fumo, sedentarismo, dieta rica em gordura etc), mas não se conhece a relação entre esses fatores e as características específicas do contexto social e psicossocial do país. Baseados na experiência de outras experiências bem-sucedidas de acompanhamento, ao longo do tempo (longitudinal), de coortes de trabalhadores, diversos epidemiologistas, que vinham trabalhando com essas doenças, se reuniram, em 2004 e 2005, planejando o estudo multicêntrico no Brasil.

Por que a escolha do Rio de Janeiro como uma das cidades a serem analisadas?

Marilia: Segunda maior cidade do país, com uma população superior a seis milhões de habitantes, o município do Rio de Janeiro abriga 40% da população residente no estado. Localizada entre o mar e a montanha, a cidade apresenta uma configuração geográfica peculiar, com corredores estreitos e longos, que implicam em grandes distâncias a serem percorridas para o deslocamento em seu interior. O crescimento de comunidades sem serviços urbanos essenciais e a violência representam outros problemas vivenciados por sua população.

Com uma proporção relativamente alta de idosos na população (13%), os cariocas têm, nas doenças cardiovasculares e no diabetes, causas importantes de morbidade hospitalar e mortalidade. Em 2005, foram observadas, nessa população, 19.895 hospitalizações por doenças cardiovasculares e 2.430 por diabetes - 15% do total de hospitalizações (excluindo gestação, parto e puerpério) em unidades de saúde financiadas pelo Sistema Único de Saúde. Em 2003, essas doenças responderam por 37% dos óbitos com causas definidas, sendo 14.056 por doenças cardiovasculares e 2.343 por diabetes. Considerando o contexto urbano complexo da cidade e seu perfil demográfico e epidemiológico, é extremamente oportuna a inclusão do município do Rio de Janeiro como um dos centros a serem investigados pelo Elsa. A população de estudo prioritária do Centro de Investigação Elsa-RJ (Fiocruz-Uerj) é representada pelos servidores efetivos da Fiocruz, com 35 anos de idade ou mais. Serão recrutados cerca de dois mil participantes, que serão acompanhados no Centro de Investigação Elsa-RJ, no campus de Manguinhos.

Qual é o parâmetro internacional deste estudo?

Marilia: Outros estudos de coorte importantes voltados para a avaliação das doenças crônicas não-transmissíveis são o Atherosclerosis Risk in Community (Aric) e o Multi-Ethnic Study of Atherosclerosis (Mesa), também realizados nos Estados Unidos.

Qual é a expectativa do projeto na Fiocruz? E na sua totalidade?

Dora: As doenças cardiovasculares e o diabetes, principais causas de morbimortalidade acima dos 40 anos no Brasil, são os desfechos de interesse da pesquisa. Serão investigados diversos aspectos associados à gênese dessas doenças, incluindo fatores biológicos, comportamentais, ambientais, ocupacionais, psicológicos e sociais. Na verdade, a contribuição científica deste estudo transcende o contexto brasileiro, pela possibilidade de avanço na investigação de uma população mais jovem do que a maioria dos estudos clássicos, com grande heterogeneidade social e geográfica, que possibilitará estudar aspectos comuns da causalidade das doenças cardiovasculares e do diabetes na atual pandemia de obesidade.