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16/09/2009

Jogo usa cheiros para apresentar a diversidade da flora brasileira às crianças

Fernanda Marques


Nativo da Amazônia, o pau-rosa (Aniba rosaeodora Ducke) ficou famoso por sua casca vermelha e cheirosa da qual se extrai o linalol, substância usada na composição de perfumes como o Chanel nº 5, o preferido de Marylin Monroe. Porém, por causa da exploração não sustentável do linalol, a árvore quase foi extinta. Daqui a pouco, possivelmente, você já não se lembrará mais dessas informações. Porém, se esta página de revista exalasse o cheiro do pau-rosa, talvez você nunca mais se esquecesse dessa história e da necessidade de proteger não só a espécie Aniba rosaeodora Ducke, mas toda a biodiversidade brasileira. Convictos de que, quanto mais sentidos são mobilizados, mais eficiente pode ser a divulgação científica, profissionais do Museu da Vida/Fiocruz criaram o jogo Cheiro de quê?, que utiliza o olfato para prender a atenção e aguçar a curiosidade de crianças de 7 a 12 anos.


 

 Os participantes precisam ser bons farejadores para descobrir os cheiros que compõem a história. Para ajudá-los, o texto e as ilustrações do livro fornecem algumas dicas

Os participantes precisam ser bons farejadores para descobrir os cheiros que compõem a história. Para ajudá-los, o texto e as ilustrações do livro fornecem algumas dicas


Um livro que conta uma história de aventura, cartões com dados sobre espécies vegetais encontradas no Brasil, fichas de atividades e potes com cheiros variados: esse é o conteúdo do jogo, para brincar sozinho ou, de preferência, com um grupo de amigos. "Nosso primeiro desafio era fazer divulgação científica usando sentidos menos explorados normalmente pelas crianças", conta a jornalista Luisa Massarani, pesquisadora do Museu da Vida e coordenadora do projeto. "O segundo era inserir o olfato no meio de uma trama que, ao mesmo tempo, combinasse literatura e ciência. Não queríamos um enredo fragmentado, como uma história de aventura que, vira-e-mexe, é interrompida por uma lição clássica de botânica. Nossa meta era misturar esses ingredientes da forma mais natural possível".


Trama do livro se passa em Narizópolis


O resultado é um livro no qual os leitores são colocados dentro da trama, que se desenrola em uma cidade fictícia com o sugestivo nome de Narizópolis. Os participantes do jogo experimentam os mesmos cheiros sentidos pelos narizopolitanos e, durante a leitura, são convidados a realizar atividades que os ajudam a compreender o que está acontecendo dentro da narrativa. Na história, um mesmo odor é agradável para um personagem, desagradável para outro e passa totalmente despercebido para um terceiro. Para constatarem, na prática, as diferenças e as semelhanças entre as pessoas quando o assunto é o olfato, os jogadores enfrentam alguns desafios, como tentar adivinhar um objeto só pelo cheiro, de olhos vendados e mãos para trás. "Teremos atingido nosso objetivo se, depois de jogarem, as crianças ficarem mais atentas aos cheiros à sua volta", conta Luisa.


Os participantes precisam ser bons farejadores para descobrir os cheiros que compõem a história. Para ajudá-los, o texto e as ilustrações do livro fornecem algumas dicas. Outras pistas podem ser encontradas nos cartões azuis que informam os jogadores sobre espécies da flora encontradas no Brasil. Nessas fichas, os leitores podem conhecer as principais características, usos e curiosidades de cada planta. A bananeira (Musa paradisiaca L.), por exemplo, nos engana com um falso tronco, pois o que vemos, na verdade, é a base das folhas. O caule, de fato, é subterrâneo. O orégano (Origanum vulgare L.), por sua vez, é uma palavra de origem grega e significa "alegria da montanha". Suas aplicações vão muito além de temperar massas e pizzas, incluindo facilitar a digestão e tratar tosse, bronquite e cólicas intestinais. A artemísia (Artemisia vulgaris L.) é mais uma espécie à qual têm sido atribuídas propriedades terapêuticas, contra malária, anemia e verminoses, entre outras doenças. Pau-brasil, manga, murici e abricó-de-macaco são outros exemplos de plantas contempladas pelos cartões azuis.


Considerando-se que o Brasil abriga, pelo menos, 55 mil espécies de plantas, que a flora brasileira representa cerca de um quarto das espécies existentes no mundo e que as plantas são verdadeiras fábricas de aromas, nada mais justo do que a botânica e o olfato serem os temas centrais do jogo. No entanto, ele reúne uma variedade de outros assuntos, como a valorização da cultura indígena. Um dos momentos mais divertidos da trama é o encontro das crianças da cidade com as de uma tribo, o que rende uma festa com direito ao som dos atabaques e a um banquete de cupuaçu, pupunha e tucumã, entre outros frutos. Nem tudo, porém, é festa: o livro também propõe uma reflexão sobre as línguas indígenas faladas no Brasil – que eram em torno de 1.270 no século 16 e hoje são apenas cerca de 180, sob risco de extinção. Outros problemas discutidos são o desmatamento de milhares de quilômetros quadrados de floresta a cada ano e as ameaças contra a nossa biodiversidade. "Buscamos a consultoria de especialistas para cada tema debatido no livro", destaca Luisa.


Escolas públicas, museus e centros de ciência e cultura receberão o jogo


O jogo é fruto de uma parceria entre o Museu da Vida/Fiocruz, o Instituto de Química da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e a empresa IFF Essências e Fragrâncias. O projeto foi aprovado no primeiro edital de difusão e popularização da ciência e tecnologia da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj), em 2007. Mas a ideia de brincar com o olfato é anterior. Sua origem foi uma viagem que Luisa fez à França, onde, por acaso, viu numa loja um jogo que usava cheiros. "As semelhanças entre o nosso jogo e esse que vi na França param por aí", avisa a pesquisadora. "Desenvolvemos um produto totalmente brasileiro, dirigido às crianças brasileiras", arremata.


Na primeira versão do jogo Cheiro de quê?, apoiada pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), não havia um livro, mas um tabuleiro, e o número de cheiros era maior. Foram produzidos apenas dez exemplares do produto. Seus criadores viram a necessidade de reformular a proposta e torná-la mais viável. Assim, com o apoio da Faperj, criaram a atual versão do jogo, que acaba de ficar pronta, com tiragem de 500 exemplares. Estes serão distribuídos, prioritariamente, para escolas públicas, museus e centros de ciência e cultura. As instituições interessadas em receber o jogo devem escrever para o Núcleo de Estudos da Divulgação Científica do Museu da Vida (Casa de Oswaldo Cruz/Fiocruz, Avenida Brasil 4.365 – Manguinhos, CEP 21045-900, Rio de Janeiro/RJ) ou nestudos@fiocruz.br.


Publicado em 14/9/2009.

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