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27/05/2008

Jornadas Latinoamericanas de Estudos Sociais da Ciência e da Tecnologia começam nesta quarta-feira

Fábio Iglesias


Uma prévia das Jornadas Latinoamericanas de Estudos Sociais da Ciência e da Tecnologia (Esocite), que começam nesta quarta-feira (28/5), foi dada nesta segunda-feira por Michel Callon, em sua palestra Tecnociências, mercados econômicos e democracia dialógica. O professor de sociologia na École de Mines de Paris relatou na Fiocruz o “excepcional” exemplo da Associação Francesa contra Miopatias, organização que lutou contra preconceitos e entraves políticos para incentivar a pesquisa clínica sobre a doença. Organizado pela Fiocruz, o evento conta com a participação de diversos profissionais da Fundação para inserir nas discussões de ciência e tecnologia temas como saúde e divulgação científica. Callon palestrará novamente nesta quarta-feira, no Instituto Militar de Engenharia (IME).


 Callon: quando um grupo interessado se encontra cercado de ignorância sobre um tema, tem de se engajar na construção de conhecimentos

Callon: quando um grupo interessado se encontra cercado de ignorância sobre um tema, tem de se engajar na construção de conhecimentos


Segundo Callon, na década de 50 não existiam muitos conhecimentos sobre as miopatias, doenças musculares que se apresentam ao nascimento decorrentes de defeitos em genes que codificam proteínas musculares. Como abatia muitas crianças, os médicos diziam aos pais para não criarem muitos laços, pois as chances da criança falecer eram grandes. Hoje o quadro é outro. A associação fez um pesado investimento em pesquisa e reorganizou em proporções significativas a política sobre a doença na França. “Esse caso, que para mim parece um conto de fadas, ilustra minha tese de que quando um grupo interessado se encontra cercado de ignorância sobre um tema, tem de se engajar na construção de conhecimentos”, disse Callon.


Dois caminhos foram adotados pela associação para reverter o quadro e promover um reconhecimento social da doença. Callon os esquematiza como caminho da cura e caminho da cidadania. Num primeiro momento, a associação investiu em pesquisa, acumulando diversos dados, como os efeitos de alguns tratamentos, as conseqüências de uso de algumas próteses, os resultados apresentados por algumas dietas etc. Solicitaram ainda a engenheiros a construção de máquinas para mensurar o esforço físico de alguns movimentos.


“Redes foram formadas pelas famílias, que trocavam álbuns de fotografias e vídeos para encontrar padrões sobre a evolução da doença e comparar a gravidade dos sintomas entre seus filhos”, explicou Callon. As famílias, segundo o professor francês, rejeitaram o antigo pensamento de que apenas os cientistas decidiriam o que pesquisar.


 Manifestação da Associação Francesa contra Miopatias para reivindicar direitos

Manifestação da Associação Francesa contra Miopatias para reivindicar direitos


Assim, o caminho para a cidadania foi uma conseqüência natural. Na medida em que as famílias tinham pouco dinheiro, financiaram médicos que quisessem investigar as miopatias. Com a doença inserida no mundo acadêmico e, em seguida, no político (visto o apoio às pesquisas pelo governo num momento posterior), os doentes adquiriram identidade. De monstros com os dias contados, para seres humanos enfermos com direito à vida. “Esse sucesso político na sociedade francesa demonstrou como grupos fracos na origem tornam-se fortes quando engajados”, conclui Callon.


Callon fará a conferência inaugural do Esocite, intitulada A contribuição dos estudos sociais de ciência e tecnologia para a renovação das concepções do social: o caso dos mercados econômicos. O Esocite ocorrerá de 28 a 30 de maio no IME (Praça General Tibúrcio 80, na Urca). A programação pode ser acessada aqui.

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