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09/10/2007

Lançados livros para apoio à formação técnica de agentes comunitários de saúde

Catia Guimaraes


Professores do curso técnico de agente comunitário de saúde de todo o Brasil já podem contar com textos de referência para uma formação mais plena desses trabalhadores. A Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV) da Fiocruz acaba de lançar três livros da coleção Educação profissional e docência em saúde: a formação e o trabalho do agente comunitário de saúde, desenvolvida a partir de um projeto de pesquisa que contou com a colaboração de outras seis escolas técnicas do SUS, além de agentes comunitários de saúde (ACS) e de gestores estaduais e municipais da Saúde da Família.



Os livros são voltados principalmente para os docentes das escolas técnicas do SUS, que hoje são responsáveis pela formação de cerca de 220 mil agentes comunitários em todo o Brasil. A coleção é composta de seis livros que tratam de temas mapeados a partir dos referenciais curriculares do curso técnico de ACS e de oficinas promovidas durante o projeto. Tem como princípio básico o reconhecimento do agente comunitário de saúde como um profissional que realiza um trabalho complexo e que, portanto, requer conhecimentos para além da sua prática cotidiana.


Como diz o texto de apresentação: "Parte-se do princípio de que a historicidade do conhecimento — que passa por analisar suas condições de produção e de disputa — está no cerne da compreensão e da construção do trabalho e da formação do ACS, tanto quanto o conhecimento mais imediatamente associável à prática desse trabalhador". A série colocará os professores em contato com 44 textos. Os títulos dos livros são O território e o processo saúde-doença, Estado, sociedade e direito à saúde, Políticas de saúde: a organização e a operacionalização do Sistema Único de Saúde, Modelos de atenção e a saúde da família, O processo histórico do trabalho em saúde e Educação e saúde.


Elevação da escolaridade


Atores fundamentais da Estratégia Saúde da Família (que envolve o PSF e o Pacs) e da reorganização do modelo de atenção à saúde no país, os ACS trabalharam durante 18 anos recebendo apenas capacitações em serviço, geralmente curtas e focadas. Em 2004, depois de diversos debates coletivos e como resultado da luta organizada dos ACS, o Ministério da Saúde surpreendeu ao publicar, junto com o Ministério da Educação, o referencial curricular nacional de um curso técnico de agente comunitário de saúde, associado à elevação de escolaridade. Desde então, a discussão sobre a pertinência e a viabilidade da formação técnica dos ACS se transformou numa das grandes polêmicas do SUS.


De um lado, um discurso, vindo principalmente dos gestores, argumenta que essa formação vai tornar o agente um profissional caro. De outro, a Confederação Nacional dos ACS e diversas instituições — entre elas a Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio — defendem que nenhum trabalhador da saúde deve ter menos do que o curso técnico e que essa formação é fundamental para o trabalho desenvolvido pelo agente.


Além de reforçar essa posição, a coleção de livros-textos que a EPSJV acaba de lançar vem também negar a idéia de que aos profissionais de nível auxiliar e técnico bastam conhecimentos específicos e instrumentais para o trabalho. Como os organizadores explicam na apresentação da série: "A coleção buscou também contemplar o entendimento de que o ACS faz um trabalho complexo, cujas bases técnicas não podem ser descontextualizadas das relações sociais e políticas que as atravessam e condicionam". Isso explica que os livros tenham textos que tratam desde assuntos mais específicos, como uma análise dos problemas de saúde da população brasileira, até temas mais amplos sobre Estado, cultura de direitos e seguridade social.


Construção coletiva


A coleção é um dos produtos do projeto de pesquisa Material didático para os docentes do curso técnico de ACS: melhoria da qualidade na atenção básica, desenvolvido pela EPSJV e aprovado no edital do Programa de Desenvolvimento e Inovação Tecnológica em Saúde Pública: Sistema Único de Saúde (PDTSP-SUS) da Fiocruz, em 2004. A metodologia se baseou na construção coletiva dos eixos temáticos que orientariam os conteúdos dos livros, buscando articular conhecimentos gerais com as especificidades locais.


"Queríamos que a formação desse trabalhador tivesse uma referência nacional. Sabemos que o Brasil tem muitas diferenças regionais que precisam ser valorizadas e compreendidas como orientadoras dos processos educativos. Mas boa parte dessas diferenças é, na verdade, desigualdade. Portanto, se só trabalharmos com elas, corremos o risco de reforçar as desigualdades sociais", explica a coordenadora do projeto de pesquisa e da coleção, Márcia Valéria Morosini. Ela completa: "Por isso nos preocupamos em dar alguma unidade à formação desse profissional em todo o país. Nosso exercício foi de pensar e reunir os princípios que deveriam estar presentes em todo processo de formação técnica em saúde, independentemente das diferenças locorregionais".


Para dar conta dessa proposta, os temas que orientaram a organização dos livros foram pactuados em três oficinas: uma realizada na Escola Técnica de Saúde de Blumenau, outra no Centro de Formação de Pessoal Manuel da Costa Souza, do Rio Grande do Norte, e a terceira na Escola Técnica de Saúde Maria Moreira da Rocha, no Acre. Além das ETSUS, participaram também o Centro Formador de Recursos Humanos Caetano Munhoz da Rocha, do Paraná, a Escola de Formação em Saúde de Santa Catarina e o Centro Formador de Recursos Humanos da Paraíba, junto com os agentes comunitários de saúde e os gestores do Programa de Saúde da Família desses locais. No final desse processo, houve ainda uma oficina de consolidação dos eixos definidos nos encontros regionais e outra com os autores.


"A principal inovação instituída pelo projeto é a metodologia participativa e dialógica desenvolvida para a produção dos livros-textos, visando garantir a expressão dos vários sujeitos participantes das oficinas, representantes dos discursos dos ACS, dos docentes e dos gestores da Saúde da Família, o que aproxima esse material da realidade do trabalho e da formação desses profissionais", opina Márcia.


Ao longo de três anos, o projeto mobilizou 130 pessoas: 74 participantes das oficinas e 56 autores, responsáveis pela produção dos 44 textos, reunidos agora na coletânea. "O resultado é uma coleção que contempla o diálogo de diversas vozes, assumindo que elas podem, inclusive, estar em conflito", resume a coordenadora.

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