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29/10/2020

Livro da Editora Fiocruz destaca o legado da psiquiatria rebelde de Nise da Silveira

Marcella Vieira (Editora Fiocruz)


Se a saúde mental se tornou tema de importância ainda maior diante dos enormes desafios causados pela pandemia de Covid-19, é essencial pensar a trajetória desse campo no país. Diante disso, é impossível não evocar o legado de Nise da Silveira e sua psiquiatria rebelde. É o que propõe o antropólogo Felipe Magaldi com Mania de Liberdade: Nise da Silveira e a humanização da saúde mental no Brasil. O título será lançado pela Editora Fiocruz em 29 de outubro, e estará disponível para aquisição em dois formatos: impresso, via Livraria Virtual da Editora, e digital, por meio da plataforma SciELO Livros. O volume integra a lista de originais selecionados a partir de chamada pública para livros autorais da Editora Fiocruz.

A obra é um desdobramento da premiada pesquisa de doutorado desenvolvida pelo autor no Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social do Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro (PPGAS/MN/UFRJ). Ganhador do Prêmio Capes de Tese 2019, nas áreas Antropologia/Arqueologia, Felipe Magaldi apresenta aos leitores o que ele mesmo chama de Admirável Mundo Nise, mostrando a fascinante vida da psiquiatra alagoana e sua complexa relação com a luta antimanicomial no Brasil.

O livro aborda a trajetória e a memória da doutora Nise, com foco em seu trabalho no Rio de Janeiro, a partir da década de 1940 até os dias atuais, em que permanece inspirando novas políticas públicas e produções culturais. “Trato de estudar, então, a trama de atores, saberes e instituições envolvidas através de sua vida e obra”, afirma o pesquisador. 

O título revela como o trabalho da médica – nascida em 1905, em Maceió – se destacou pelo combate às intervenções biomédicas violentas e pela defesa de atividades expressivas, especialmente pintura e modelagem, como forma de tratamento em saúde mental. Magaldi destaca que, para se aprofundar no legado da psiquiatra, mergulhou nas produções bibliográfica, documental e memorialística preexistentes sobre o trabalho dela. “Também realizei entrevistas com os seus colaboradores vivos e, principalmente, realizei um trabalho de campo, etnográfico, nas instituições vinculadas à memória e ao legado de Nise da Silveira”, revela. 

Entre as instituições exploradas durante a pesquisa de Magaldi, destacam-se o Instituto Municipal de Assistência à Saúde Nise da Silveira, em Engenho de Dentro, no Rio de Janeiro, onde estão localizados o Museu de Imagens do Inconsciente e a ocupação artística Hotel da Loucura. A Casa das Palmeiras, no bairro de Botafogo, também é um desses importantes espaços do legado nisiano. 

Uma personagem que jamais se dobrou aos saberes hegemônicos

Em sua imersão pelo mundo da médica alagoana, realizado na interseção entre antropologia e história, Felipe Magaldi busca analisar as ideias originais de Nise. “As imagens como forma de acesso ao inconsciente, o afeto catalisador, o método de leitura das imagens baseado nas teorias junguianas [ela foi fortemente influenciada pelas ideias do psiquiatra suíço Carl Jung] e também a noção de doença como estado do ser”, resume o autor.  

Com o livro, o antropólogo chama a atenção para o fato de que, apesar dos mitos de revolução existentes em torno da obra e do legado de Nise da Silveira, falecida em 1999, seu trabalho ainda não ganhou o devido reconhecimento, tendo sido frequentemente apagado ou esquecido da história da psiquiatria brasileira. Segundo ele, tal apagamento se deve a uma soma de fatores. “Eu chamo a atenção, por exemplo, para o fato de ser uma trajetória feminina, de uma migrante nordestina, uma ex-presa política durante o Estado Novo”, analisa. 

Para Jane Russo, professora titular do Instituto de Medicina Social da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (IMS/Uerj), o livro é “extremamente oportuno, pois cobre uma injusta lacuna na história da psiquiatria rebelde brasileira. Trata-se de um importantíssimo resgate de uma figura ao mesmo tempo central e marginal. (...) Marginal porque se recusou à certeza de um movimento estável  e articulado”, assegura a pesquisadora, no texto de quarta capa. 

O autor da obra – dividida em duas partes, com um total de oito capítulos – corrobora e enfatiza a “mania de liberdade” de Nise como sua opção máxima de atuação, ou seja, “uma tentativa de nunca se conformar com os saberes hegemônicos e sempre tentar realizar o trabalho da maneira mais criativa e original possível”, finaliza. 

Lançamento integra lista de livros originais aprovados em edital

O volume é a quarta publicação oriunda de chamada pública para livros autorais da Editora Fiocruz. Em abril de 2019, a Editora lançou dois editais para encerrar o ciclo de comemorações de seus 25 anos. Em outubro do ano passado, os resultados das chamadas foram divulgados. Para a de livros autorais, 47 originais foram submetidos à Editora. Seis obras foram selecionadas, incluindo a de Felipe Magaldi. 

Autor

Felipe Magaldi é graduado em Ciências Sociais pela UFRJ. Concluiu o mestrado em Antropologia na Universidade Federal Fluminense (UFF) e é doutor em Antropologia Social pelo Museu Nacional da UFRJ, onde também é pós-doutorando. Durante a pesquisa de doutorado, foi bolsista “nota 10” da Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj). Também fez pós-doutorado na Universidade Nacional de Córdoba, na Argentina, como bolsista do Consejo Nacional de Investigaciones Científicas y Tecnológicas (Conicet). 

Livro Mania de Liberdade: Nise da Silveira e a humanização da saúde mental no Brasil
Editora Fiocruz
Primeira edição: 2020
356 páginas
Preço de capa (versão impressa):  R$ 64,00
Preço SciELO Livros (versão digital): R$ 38,40

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