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29/12/2008

Livro discute inovação e acesso no setor de medicamentos

Fernanda Marques


Uma das particularidades da área da saúde é estar profundamente associada tanto à esfera social quanto à industrial. Essa característica representa oportunidades interessantes, mas também grandes desafios. Trata-se de um campo aberto à reflexão e à ação, à discussão acadêmica e à formulação de políticas públicas. Toda a riqueza desses debates foi reunida em um livro recém-lançado pela Editora Fiocruz. O título – Medicamentos no Brasil: inovação e acesso – já oferece pistas sobre os objetivos da obra: não se trata apenas de fomentar o desenvolvimento tecnológico e fortalecer a produção nacional, mas também de garantir que esses avanços beneficiem a toda a população brasileira. Em outras palavras: “inovação não pode estar desligada da idéia de acesso”, como afirma o próprio ministro da Saúde, José Gomes Temporão, no prefácio da obra.



Organizado por três profissionais da Fiocruz – o presidente, Paulo Marchiori Buss, o vice-presidente de Pesquisa e Desenvolvimento Tecnológico, José da Rocha Carvalheiro, e a gerente do Projeto Inovação em Saúde, Carmen Phang Romero Casas –, o livro reúne os pontos de vista da academia, do governo e do setor produtivo público e privado. A obra é constituída por artigos produzidos por cerca de 50 autores. As abordagens privilegiam o contexto nacional, mas também refletem sobre a posição brasileira no cenário internacional. Os textos – que compõem 22 capítulos divididos em seis partes – dão conta de fazer um diagnóstico da área de medicamentos no país, avaliar seus problemas e potencialidades, e apresentar recomendações concretas para a superação dos obstáculos e o melhor aproveitamento das oportunidades.


“A indústria farmacêutica – produção de fármacos e medicamentos – responde por cerca de 60% do déficit comercial nacional em saúde, sendo o segmento mais crítico do ponto de vista tanto da política de saúde quanto da política de inovação industrial”, revela o terceiro capítulo, assinado pelos economistas Carlos Gadelha e José Maldonado, ambos da Fiocruz. “Tal situação implica uma elevada vulnerabilidade para o país no presente e para suas perspectivas futuras num contexto dinâmico em que a fronteira tecnológica evolui aceleradamente”. No capítulo, os dois autores também destacam o problema dos investimentos em pesquisa e desenvolvimento: para a indústria farmacêutica brasileira, esses gastos representam apenas 0,53% do valor das vendas; no âmbito internacional, o percentual chega a 18%. Apesar dos gargalos, Gadelha e Maldonado vêem possibilidades para o fortalecimento das empresas nacionais do setor, cuja participação já havia aumentado para 40% do mercado em 2006.


Muitas vezes polêmicos, os temas abordados pelo livro incluem o desenvolvimento do mercado de produtos farmacêuticos genéricos no Brasil; a Relação Nacional de Medicamentos Essenciais (Rename); os ensaios clínicos; o papel dos laboratórios públicos na capacitação tecnológica; a produção nacional no setor privado; a arena do Fórum de Competitividade da Cadeia Produtiva Farmacêutica; a nova política de plantas medicinais e fitoterápicos; as licenças compulsórias; e as patentes de segundo uso. Apesar da complexidade dos temas discutidos, a obra tem uma linguagem acessível mesmo para o leitor que não é especialista no assunto. Por exemplo: o livro afirma que, entre inventar um medicamento e colocá-lo no mercado, passam-se, em média, dez anos, e tal afirmação é acompanhada por um esquema explicativo que ilustra as fases e a duração do processo de pesquisa e desenvolvimento de um medicamento. (ver quadro abaixo)



Outro quadro (ao final deste parágrafo) apresenta, de forma bastante objetiva, as vantagens, as desvantagens competitivas e os desafios para o setor farmacêutico. A base científica local, o poder de compra do Estado, a biodiversidade e as leis da Inovação e de Patentes são algumas das vantagens apontadas. Entre as desvantagens, a baixa qualidade da educação básica, o pouco alinhamento de cientistas e pesquisadores com as demandas do mercado e os fatores macro-institucionais, como controle de preços e carga tributária. Os desafios, por sua vez, incluem maiores investimentos privados em pesquisa e desenvolvimento, e o fortalecimento de redes entre as instituições públicas e a indústria privada.



Além de esquemas, quadros e recomendações, também não faltam no livro gráficos e tabelas com números, utilizados para aumentar a consistência dos argumentos. Um dos gráficos, por exemplo, mostra a aquisição de medicamentos pelo Ministério da Saúde. A leitura do gráfico revela que os laboratórios oficiais são responsáveis por 84% das unidades adquiridas e por 32,7% do custo, enquanto os laboratórios privados estrangeiros correspondem a apenas 6,8% das unidades adquiridas e por quase metade do custo (47,5%).


Por fim, cabe destacar que Medicamentos no Brasil: inovação e acesso é o segundo volume de uma série temática sobre pesquisa, desenvolvimento e inovação nos segmentos industriais da saúde. Realizada no âmbito do Projeto Inovação em Saúde da Presidência da Fiocruz, a série teve início com o livro Vacinas, soros e imunizações no Brasil, de 2005. Ambos os volumes demonstram o importante papel que a Fundação vem desempenhando tanto na discussão quanto na construção do complexo produtivo da saúde no Brasil. Afinal, além de congregar unidades de pesquisa, ensino, produção e assistência médica, a Fiocruz desponta com iniciativas como o Centro de Desenvolvimento Tecnológico em Saúde (CDTS), o Programa de Desenvolvimento Tecnológico em Insumos para Saúde (PDTIS) e o Programa de Desenvolvimento Tecnológico em Saúde Pública (PDTSP).


Publicado em 29/12/2008.

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