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31/08/2007

Morre Roberto Chabo, o homem que simbolizou a honradez


Um dos ícones do movimento pela Reforma Sanitária brasileira, o médico Roberto Chabo morreu na quarta-feira (29/08), de falência múltipla dos órgãos, aos 71 anos, no Rio de Janeiro. Pernambucano do Recife, Chabo deixa duas filhas, duas netas e uma companheira. O enterro ocorreu nesta quinta-feira (30/08), no Memorial do Carmo, no Rio.


 Chabo: uma vida dedicada à saúde pública brasileira e à luta pela liberdade

Chabo: uma vida dedicada à saúde pública brasileira e à luta pela liberdade


Nascido em 29 de janeiro de 1935, Chabo se formou pela Faculdade Médica de Pernambuco em 1961 e depois se especializou em nefrologia pelo Hospital dos Servidores do Estado do Rio de Janeiro (HSE). Participou do staff do hospital, como efetivo no setor de nefrologia, de maio de 1966 até sua aposentadoria, em 1994. Chabo participou do primeiro transplante de rim da América Latina, em 1964, como assistente da equipe de nefrologia, chefiada por Jayme Landman, Alberto Gentili e outros.


Naquele mesmo ano, motivado por antecedentes políticos, por sua militância socio-estudantil na UEE (União Estudantil dos Estudantes) desde 1956 e por ser participante efetivo da UNE , foi preso e levado das dependências do Hospital dos Servidores, pela polícia política, onde permaneceu durante 30 dias. No retorno às atividades, iniciou um programa de hemodiálise periódica no Rio de Janeiro, dando treinamento à médicos do HSE.


Em 1966, num clima de muita intimidação, Herbert de Souza (o Betinho), matriculado como paciente no HSE, naquele momento, egresso do Uruguai e seguido pela polícia, foi preso durante atendimento médico prestado por Chabo, que também foi levado preso novamente, dessa vez como suspeito de participação no esquema da AP (Ação Popular) por estar prestando serviços médicos a Betinho. A partir de 1966, e durante 1967 e 1968, Chabo tentou reorganizar o movimento médico, que era então extremamente conservador, juntamente com colegas como Miguel Olympio Cavalcanti e Almir Dutton, dentre outros. Como ele era muito “visado”, o movimento foi feito quase que de forma clandestina, “à noite”, nos plantões dos hospitais durante vários meses, buscando apoio dos colegas médicos para necessárias reivindicações trabalhistas e melhores condições de trabalho. Miguel Olympio foi então eleito presidente do Sindicato dos Médicos do Rio de Janeiro, mas em seguida foi destituído pelo Serviço Nacional de Informações (SNI), que recomendou ao Ministério do Trabalho que não permitisse “certas pessoas” entre os eleitos, e, indicou o nome de Charles Damian, que assumiu e ficou no sindicato até 1978. 


 Chabo participou da equipe que fez o primeiro transplante de rim da América Latina, em 1964

Chabo participou da equipe que fez o primeiro transplante de rim da América Latina, em 1964


Em 1978, o movimento Renovação Médica, unido com todas as forças de esquerda, envidou esforços e retomou o sindicato, através do voto, elegendo presidente Rodolpho Rocco, tendo na vice-presidência João Carlos Serra, que assumiu a presidência após sua renuncia. Em dezembro de1980, com a ruptura do grupo Renovação Médica, surge outro movimento, com facções do grupo anterior e Roberto Chabo foi eleito presidente do sindicato. Naquela época, o Cremerj, sob intervenção, tinha toda a demanda ética dos profissionais de saúde acudida pelo Sindicato dos Médicos. O grupo eleito, sob a presidência de Chabo, fez grande mobilização nos hospitais, promovendo atos públicos em luta por melhores salários, melhor condição de trabalho e atendimento à população, com expressiva cobertura da imprensa.


Fez visitas às autoridades federais, estaduais e municipais e durante três meses de reivindicações, sem qualquer retorno destas mesmas autoridades, e com a união de todas as forças progressistas mobilizou a primeira grande greve dos médicos da rede pública de um dia, em 18 de março de1981, em pleno regime militar. Até junho do mesmo ano ocorreram outras paralisações, que somaram 57 dias (não de forma continuada). Naquele período, durante assembléia com cerca de cinco mil médicos discutindo propostas de negociação, foi anunciada a intervenção do sindicato. A Sociedade de Medicina e Cirurgia passou a abrigar o sindicato.


Com o desdobramento houve intimidações e a proposta de liberação do sindicato, no entanto, sem Chabo como presidente. Em 25 de junho de 1981, na Sociedade de Medicina, em reunião ordinária com a diretoria do Sinmed, surgiu um cidadão em trajes civis acompanhado de seis soldados armados com metralhadora, que solicitou a condução de Chabo ao DPPS. O advogado do sindicato, Celso Soares, exigiu o mandado de prisão e recebeu desse cidadão, que comandava o grupo armado, a seguinte resposta: “Essas armas e essas fardas caracterizam o mandado". A Avenida Mem de Sá estava ocupada militarmente pela Força Pública, por carros com mais soldados armados e Chabo, sem esboçar qualquer reação, foi conduzido para as dependências do DPPS.


Essa prisão obteve no dia seguinte matéria de primeira página nos jornais de grande circulação, no Jornal do Brasil lia-se: “Seqüestrado presidente do Sindicato dos Médicos do Rio de Janeiro”. Já no Dops, Chabo aguardou durante horas a definição “legal” de sua prisão, até o momento em que o governador e o secretário de Segurança Pública do Rio de Janeiro deram legalidade à sua prisão.


 Chabo no momento em que foi preso por agentes do Dops (Foto: Arquivo JB)

Chabo no momento em que foi preso por agentes do Dops (Foto: Arquivo JB)


Ouvido durante 12 horas, Chabo tomou conhecimento, pelo então ouvidor, que este havia sido admoestado pela própria filha, “que não lhe tocasse num fio de cabelo”. A filha do mesmo era médica. Ficou preso durante quatro dias, advertido de que seria enquadrado na Lei de Segurança Nacional. Mas membros da Igreja, das Forças Armadas, políticos e funcionários do próprio Governo Federal intercederam para evitar o enquadramento e este foi anulado.


Em 1981 Chabo foi eleito Médico do Ano pela Sociedade de Medicina e Cirurgia do Rio de Janeiro. No ano seguinte foi reeleito para a presidência do Sindicato dos Médicos. Permaneceu como Membro Efetivo do Cremerj até 1993. Eleito presidente da Federação Nacional dos Médicos do Rio de Janeiro – Gestão 1986/1991. Naquele mesmo ano (1991) recebeu a Medalha Nacional do Mérito Médico. Já em 1992 foi convidado para assumir a Secretaria Nacional de Vigilância Sanitária – na gestão de Jamil Haddad – do Governo Itamar Franco.


 O então sindicalista Luiz Inácio Lula da Silva discursa ao lado de Chabo, numa manifestação no Rio

O então sindicalista Luiz Inácio Lula da Silva discursa ao lado de Chabo, numa manifestação no Rio


Durante o período em que esteve no Ministério da Saúde visitou quase todos os estados na discussão sobre a aprovação do decreto lei 793, a Lei dos Genéricos, proposta pelo então ministro Jamil Haddad. Ao deixar o cargo no Ministério retornou ao Setor de Nefrologia do HSE e manteve atendimento em consultório particular.


Em 1994 se aposentou e foi convidado para chefiar o Setor de Clínica Médica do Hospital da Ordem Terceira do Carmo. Mais tarde assumiu a direção técnica desse setor até abril de 2000. Ele então licenciou-se da direção e assumiu a Subsecretaria de estado, convidado por Gilson Cantarino O’Dwyer, então secretário de Saúde do Rio de Janeiro, até janeiro de 2002, quando foi nomeado coordenador do Rio-Transplante, onde permaneceu até julho de 2003, quando retornou à direção técnica do Hospital do Carmo e, concomitantemente, assumiu o cargo de auditor-chefe da Secretaria de Estado de Saúde. Em janeiro de 2007, convidado pelo atual secretário de Estado de Saúde e Defesa Civil do Rio de Janeiro, Sérgio Cortes, assumiu o cargo de ouvidor-geral, onde permaneceu até a morte.


Chabo publicou vários trabalhos dentro da especialidade, apresentados em congressos, escreveu textos sobre terapia intensiva e nefrologia. De 1982 a 1994 foi paraninfo e/ou patrono de várias turmas de médicos formandos: duas vezes na Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), na Universidade Gama Filho, na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e na Universidade de Campos dos Goytacazes.


Depoimentos


"Chabo conseguiu aliar uma alta qualidade técnica, como excelente nefrologista que era, com uma atividade política muito rica, que incluiu a atividade sindical, e também o campo das políticas de saúde, justiça e cidadania. Perdemos um grande companheiro e eu perdi um amigo".

Paulo Buss, presidente da Fiocruz


"Chabo foi o ponto de convergência de várias camadas na luta pela questão da saúde no Brasil. Destacava-se por sua capacidade de acolhimento das divergências. Foi um traço de união que juntou gerações. Ele era, ao mesmo tempo, firmeza e sorriso. Sempre atuou sem estrelismo, com muita dignidade, tolerância e doçura. Estampava a convicção de ideais de futuro. Tive o privilégio de tê-lo como referência na minha formação política. Ele foi, sem dúvida, uma pessoa muito especial."

Paulo Gadelha, vice-presidente de Desenvolvimento Institucional e Gestão do Trabalho da Fiocruz


"Tive a honra, como ministro de Saúde, de contar com o Roberto Chabo ao meu lado no Ministério da Saúde. Chabo é um dos médicos a quem a população brasileiro mais deve na luta pela implantação do Sistema Único de Saúde (SUS). Homem sério, competente e probo, nunca deixou de cumprir seus deveres. Uma perda irreparável para a área de saúde".

Jamil Haddad, ex-ministro da Saúde do Governo Itamar Franco


"O que posso dizer sobre Roberto Chabo é que ele foi a maior liderança médica da história do país. Ele foi um fenômeno em um momento duro da vida nacional, no final dos anos 70 e início dos anos 80. Na luta pela redemocratização, houve dois importantes movimentos grevistas: o dos metalúrgicos, liderados por Lula, e o dos médicos, que começou no Rio, sob a lideraça de Chabo, e se tornou nacional. Lembro de uma foto marcante: Lula e Chabo em cima de uma kombi durante uma manifestação dos médicos. Essa foto expressa a liderança exercida por Chabo, homem marcado por sua postura ética."

Crescêncio Antunes da Silveira Neto, ouvidor do Ministério da Saúde


"O dr. Roberto Chabo foi, para nós, uma grande liderança em ética. Ele soube, com sua grande sabedoria e compromisso com a saúde do povo brasileiro, trabalhar na construção de um sistema de saúde capaz de respeitar cada cidadão. Para a Federação Nacional dos Médicos, Chabo foi um grande exemplo e com certeza não será esquecido".

Eduardo Santana, presidente da Federação Nacional dos Médicos


"Dentre os lutadores pela Saúde Pública nacional, o Chabo está não só entre os mais importantes, mas entre os mais coerentes, além de ter sido um grande amigo".

Leôncio Feitosa, diretor da Agência Nacional de Saúde


"Chabo foi presidente do Sindicato dos Médicos do Rio de Janeiro por duas vezes e presidente da Federação Nacional dos Médicos. Essa trajetória mostra que ele sempre teve uma inserção muito grande na luta dos médicos não só do Rio, mas do Brasil inteiro. Além de um exemplo de pai e chefe de família, Chabo foi um exemplo do médico brasileiro ideal. Seu trabalho foi a síntese do próprio código de ética médico. Ele foi, o tempo todo, líder solidário de seus colegas, mas sem perder de vista o objetivo último de seu trabalho: a saúde do povo brasileiro".

Jorge Darze, presidente do Sindicato do Médicos do Rio de Janeiro


"Roberto Chabo foi uma das pessoas mais maravilhosas que já conheci. Seu falecimento representa a perda de uma das mais importantes referências éticas e morais do Movimento Sanitário Brasileiro."

Oscar Berro, secretário de Saúde de Duque de Caxias


"O Chabo filosoficamente entendeu o mundo como um todo e com todos, no caminho de uma sociedade justa e fraterna."

Eraldo Bulhões, secretário do Sindicato dos Médicos do Rio de Janeiro


"Chabo é um exemplo de vida. Exemplo de dignidade, coerência e firmeza de ações e princípios. Com ele, aprendi nas lutas sindicais e políticas a importância de não esmorecer jamais, na construção de um país mais justo e de uma saúde de qualidade para todos os brasileiros. O mais importante, porém, foi que ele me ensinou a valorizar a solidariedade e a  tolerância e, principalmente, a cultivar as amizades. Vai fazer muita falta a todos nós".

Luis Roberto Tenório, ex-presidente do Sindicato dos Médicos do Rio de Janeiro


 "Lamento a perda da maior liderança médica do país, responsável por grandes lutas e pela melhoria do acesso à saúde do povo brasileiro".

Jacob Kligerman, secretário municipal de Saúde do Rio de Janeiro


"Chabo é uma espécie de tótem da ética, com uma vida dedicada à causa da saúde pública. Uma grande perda."

Ricardo Peret, ex-diretor do Hospital de Ipanema e do Instituto Philippe Pinel


"Dr. Chabo é um amigo que não poderíamos perder. Estou super emocionada. Era um patrimônio da ética, moral e integridade. Nunca conheci um deslize dele profissionalmente, nem pessoalmente. Me considero a eterna assessora do Dr. Chabo, pois trabalhei com ele muito tempo e sei que fui uma pessoa de confiança. Foi um pai pra mim".

Magda Soares Isnard, assessora de Roberto Chabo


"Chabo pode ser considerado um patrimônio ético. Uma pessoa extremamente competente. Talvez a maior liderança do movimento médico, o que o levou a ser perseguido e preso pela ditadura. Sempre lutou pela democracia do país. Tenho muito orgulho de ter tido o Dr. Chabo nas minhas gestões na Secretaria de Saúde do Estado do Rio de Janeiro".

Gílson Cantarino, ex-secretário de Saúde do Estado do Rio de Janeiro


"Lembro de quando conheci Roberto Chabo. Ele trabalhava no setor de Nefrologia do Hospital dos Servidores, onde eu atuava em cirurgia. Nosso encontro político se deu algum tempo depois, quando trabalhamos juntos por dez anos no Conselho Regional de Medicina do Rio de Janeiro. Chabo era um eterno amigo, brilhante político e médico. Lamentamos muito sua ausência".

Laercio Vaz de Mello, ex-presidente do Cremerj



"Conheci Roberto Chabo em 1980, durante os primeiros movimentos importantes da saúde no Rio de Janeiro. Ele era uma pessoa extremamente combativa e defendia a categoria médica com muita garra. Tinha um caráter intocável e foi um grande amigo. É uma perda inestimável para todos os médicos."

Ismar Bahia, ex-superintendente da Secretaria de Saúde do Estado do Rio de Janeiro



"Minha melhor recordação do Chabo foi  vê-lo sobre os ombros dos médicos, carregado após a vitória da mobilização política no início dos anos 80. Hoje, tenho certeza que os anjos se encarregam disso."

Mauro Marzochi, médico e pesquisador da Fiocruz


"Chabo é um símbolo para a área de saúde que deixa como marca um conjunto de questões: foi um exemplo de ética, de assistência à população, de profissional dedicado à formação de médicos e que teve como marca, sobretudo, a combatividade. Deixa um legado para a profissão de médico e para outros profissionais do campo da saúde".

Jorge Luís "Bigu" Amaral, tesoureiro do Sindicato dos Médicos do Rio de Janeiro


"A lembrança que tenho do Chabo é das lutas e também das comemorações. A mesma veemência que mostrava nos discursos, manifestava nos momentos de descontração, alegria e prazer. Não me lembro de nenhum bom combate do qual o Chabo não tenha participado ou estivesse envolvido".

Luiz Paulo Viveiros de Castro, advogado do Cremerj


"Sabe o semblante tranqüilo, a sensação do dever cumprido? Este era o caso do dr. Chabo. Guerreiro com nome de anjo - um dos sobrenomes dele é Gabriel -, Chabo sempre foi uma voz a favor da vida em sua amplitude mais significativa. Quando, em meados dos anos 80, trabalhei no Jornal do Brasil, cobria saúde pública e encontrava dificuldade com alguns entrevistados para tratar de temas mais espinhosos. Então eu recorria ao dr. Chabo, pois este, com o doce sotaque pernambucano, sempre nos receitava a verdade, sem rodeios, sem chavões. Tomara que a morte de Chabo seja comentada pelas escolas de medicina de todo o país, pois ele é um exemplo a ser seguido pelos jovens".

Edmilson Oliveira da Silva, jornalista


"O Chabinho foi uma referência de afeto, delicadeza, generosidade. Anjo Gabriel da doçura. Amigo dos amigos, o poder jamais lhe subiu à cabeça. Nunca o vi levantar a voz. O timbre só saía forte, alto e firme quando da defesa da liberdade, da justiça, da ideologia que defendia por todos nós. É um lider carismático que não abandonou a antiga utopia, do qual muitos até esqueceram do signicado. Deixa duas filhas, duas netas e a companheira. Cercado por mulheres, Chabinho não deixa bens materiais. A gente se encontra. Viva Roberto Gabriel Chabo! Axé!"

Chris Tavares, uma amiga da Fiocruz


Homenagem


A assunção do outro anjo Gabriel, o Chabo*


Antes que algum cartunista o faça, liricamente desenhe isto, asseguro-lhes que o céu está mais feliz desde ontem, porque Betinho (o sociólogo Herbert de Souza) terá, de volta, ao lado dele, o médico e companheiro de lutas dr. Roberto Domingos Gabriel Chabo, que, como se diz lá na minha terra, a Bahia, passou desta pra melhor, ontem, derrotado por falência múltipla de órgãos. Com o sorriso doce e largo de sempre, Betinho recepcionará Chabo, o médico pernambucano, que, pelo pouco que conheci dele, em entrevistas e alguma vivência na área de assessoria de imprensa na área da saúde, tenho certeza, vai logo querer saber do sociólogo mineiro: você que está aqui há mais tempo, e a saúde aqui, como é que anda!?


Deixando esse papo de céu de lado, ontem à noite, no Memorial JK, em Brasília, posso imaginar o quanto deve ter crescido a já alta responsabilidade que Helvécio Magalhães, Secretário de Saúde de Belo Horizonte, passou a encarar o cargo de presidente do Conselho Nacional dos Secretários Municipais de Saúde (Conasems), quando o mnistro da Saúde, José Gomes Temporão, iniciou o discurso de boas vindas ao médico, também mineiro, com “a triste notícia” da morte do Roberto Chabo, ou apenas Chabo, que é como os companheiros dele de tantas lutas na área da saúde, notadamente os sanitaristas, tratavam esse guerreiro, o outro anjo Gabriel, o Chabo.


Nefrologista na especialização, pioneiro em várias frentes, Chabo se dedicou tanto à saúde pública que pode ser considerado, sem a menor dúvida, doutor em saúde social, dada a dedicação que empregou pelo bem-estar das pessoas, obtido por meio da saúde das instituições. Em lugar da medicina privatista, capitalista, excluidora, Chabo professou e viveu integralmente a medicina pública. E basta dar uma olhada no currículo dele, para constatar o quanto ele foi fundamental para a saúde pública brasileira, o quanto contribuiu, a exemplo de tantos outros, para a construção do SUS, o maior plano público de saúde pública do mundo.


Antes de ser ovidor da Secretaria Estadual de Saúde do Rio de Janeiro, Chabo desempenhou papel imprescindível no começo da consolidação do Rio Transplante. Defensor do SUS, militante constante da boa guerra da saúde pública de qualidade, podia ter recusado o posto que lhe traria, como lhe trouxe, muito o que fazer, mas, no fundo, no fundo, embora a lida fosse muita, podia-se notar, no mesmo semblante tranqüilo do d. Chabo que ele estava feliz por estar em um posto avançado do que o comentarista turrão da tevê chamou de “peça de ficção”, o SUS: ele estava cuidando de uma das pontas mais modernas e democratizantes do SUS, o acesso a transplantes, procedimentos, que, há coisa de uma década, era exclusividade de alguns muitos poucos de nós brasileiros. Os endinheirados.


E por falar em dinheiro, tento adivinhar o restante da prosa entre Betinho e Chabo, lá nas alturas:


–  Se  ainda tem gente com fome aqui em cima, a gente vê o que pode fazer, ou melhor, você me diz o que fazer, afinal, nisto você é o especialista – diria Chabo.


–  A gente podia pensar em um leilão para este seu estetoscópio e, com o dinheiro arrecadado, a gente poderia comprar brinquedos pros anjinhos brasileiros. O que você acha!? – responderia Betinho.


–  “Bate outra vez, com esperanças o meu coração (...)” – acho que é o Cartola chegando, riria Chabo.


*escrito por Edmilson Oliveira da Silva, jornalista

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