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02/10/2007

Neuroinfecções por HTLV-1 são tema de artigos de médicos da Fiocruz em revistas

Catarina Chagas


Embora pouco conhecida pela população, estima-se que a infecção pelo vírus linfotrópico humano para células T tipo 1 (HTLV-1, na sigla em inglês) atinja cerca de dois milhões de brasileiros. Debruçados sobre o tema, pesquisadores do Instituto de Pesquisa Clínica Evandro Chagas (Ipec) da Fiocruz publicaram, este ano, dois estudos inéditos sobre a infecção e suas formas de evolução para doenças. Um deles, no periódico Journal of Neuroimmunology, relaciona carga pró-viral (contagem de linfócitos T infectados pelo vírus) e evolução para doenças, enquanto o outro, na revista Journal of Neurovirology, trata de formas rápidas de evolução da mielopatia – doença da medula espinhal – causada pelo vírus.


 Lateral do prédio histórico do Instituto de Pesquisa Clínica Evandro Chagas (Foto: Ana Limp)

Lateral do prédio histórico do Instituto de Pesquisa Clínica Evandro Chagas (Foto: Ana Limp)


Resultado do trabalho de doutorado do neurologista Marcus Tulius Silva, o primeiro artigo aponta que pacientes infectados com HTLV-1 que desenvolveram doenças associadas ao vírus – cerca de 5% do total de infectados – apresentam uma carga pró-viral significativamente maior do que a dos pacientes assintomáticos. No Rio de Janeiro, a Fiocruz é a única instituição que quantifica a carga pró-viral dos pacientes portadores de HTLV-1, uma informação que pode ajudar a entender por que alguns pacientes evoluem para doenças e outros não.


Tradicionalmente, o HTLV-1 é associado à paraparesia espástica tropical, mielopatia que consiste na inflamação da medula espinhal e causa perda de movimentos. No entanto, o estudo de Silva apontou que a infecção pode ser causadora de outras doenças, como bexiga periférica isolada, neuropatia periférica e déficit cognitivo mínimo, que não costumam ser associadas ao vírus. Como nos casos de mielopatia, os pacientes que desenvolveram tais doenças apresentaram carga pró-viral maior do que as dos portadores assintomáticos.


A descoberta pode ser uma dica de como identificar precocemente a infecção por HTLV-1, ganhando tempo para tratá-la antes que chegue ao estado da parapesia, doença mais grave causada pelo vírus. “Muitas vezes, os pacientes chegam ao Ipec já com dez anos de infecção, porque apresentaram sintomas como dor lombar e dificuldade para correr ou mesmo caminhar, que os médicos nem sempre desconfiam estarem relacionadas ao HTLV-1”, conta o pesquisador. “Nesse estágio, pode não ser possível reverter o quadro da doença. Sabendo que o vírus pode gerar outros sintomas, é possível detectar mais rapidamente a infecção e controlá-la”.


A corrida contra o tempo é também um aspecto do trabalho de outro neurologista do Ipec, Marco Antonio Sales Dantas de Lima. Embora a mielopatia se desenvolva em até 20 anos de infecção, o especialista mostrou que, dos quase 700 pacientes com HTLV-1 atendidos na unidade, 8% apresentaram uma forma mais rápida de evolução da doença, em apenas um ano. “É a primeira vez que esta prevalência da mielopatia rapidamente progressiva entre portadores do HTLV-1 é estabelecida no Brasil”, explica. “O número está dentro dos resultados esperados a partir de estudos internacionais, que apontam evolução rápida em cerca de 10% dos casos”.


Atualmente, o pesquisador investiga os fatores determinantes para este tipo de parapesia. Por enquanto, sua equipe, que atua em parceria com especialistas da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), descartou a hipótese da carga pró-viral, que não apresenta diferenças significativas entre os casos de evolução rápida e lenta. “Desconfiamos que seja algo relacionado à resposta imunológica do indivíduo ou a algum fator genético”, adianta. “Nosso trabalho agora é descobrir por que esses pacientes ficam doentes tão rápido e como podemos impedir ou reduzir os danos desse processo”.

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