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20/07/2005

No gambá, a solução para mordidas de cobras

Catarina Chagas


Um tratamento mais eficaz para o envenenamento por mordidas de cobras pode estar a caminho. Geralmente tratados com soros antiofídicos, os acidentes causam hemorragias e problemas teciduais locais, entre outros efeitos. Pesquisadores do Laboratório de Toxinologia do Instituto Oswaldo Cruz (IOC) trabalham na produção em laboratório de inibidores de toxinas ofídicas originalmente isolados do sangue do gambá sul-americano (Didelphis marsupialis) capazes de impedir tais seqüelas.


Alguns animais, como as próprias serpentes e alguns mamíferos, apresentam resistência ao envenenamento por mordida de cobras. Foi ao observar essa propriedade entre os gambás que a equipe do IOC decidiu estudar que composto presente no sangue do animal poderia neutralizar o efeito das toxinas encontradas no veneno de cobras como a jararaca, da família Viperidae. "A sabedoria popular falava da resistência do gambá às cobras, então fomos verificar se isso era verdade e como seria possível", conta o bioquímico Jonas Perales, chefe do Laboratório de Toxinologia e coordenador do projeto.


A equipe identificou, então, duas principais proteínas que estariam envolvidas no processo de neutralização: DM43 e DM64. Enquanto a primeira inibe a ação das metaloproteases do veneno, compostos que atuam destruindo algumas proteínas do animal afetado e gerando hemorragia, a segunda age sobre as fosfolipases ou miotoxinas, responsáveis pelo efeito miotóxico, ou seja, pelos transtornos musculares causados à vítima. "Com isso, confirmamos que o sangue do gambá tem "armas" contra os efeitos mais graves dos venenos de cobras", afirma Perales.


Para avaliar a atividade exercida pelas moléculas, foram feitos testes com camundongos e coelhos. "O tratamento com DM43 e DM64 mostrou-se mais eficiente até do que os soros antiofídicos normalmente usados para tratar pacientes mordidos por cobras", revela o bioquímico. O passo seguinte foi descobrir uma maneira de produzir artificialmente as moléculas que, embora não sejam anticorpos, pertencem à família das imunoglobulinas.


Os pesquisadores clonaram, então, a parte do DNA do gambá relativa à produção das duas proteínas. "Esse processo auxiliou a caracterização e o seqüenciamento das moléculas", relata Perales. "Agora, estamos trabalhando em um método específico para 'fabricá-las' em laboratório, para possibilitar a produção em larga escala". Segundo o pesquisador, a utilização do soro retirado diretamente do gambá não seria vantajosa porque, além da baixa concentração dessas proteínas no sangue do animal, o processo de purificação seria longo e custoso.


Perales espera que, futuramente, a equipe consiga determinar a melhor forma de produzir as moléculas e sintetizar um medicamento para o tratamento dos acidentes ofídicos. A produção em larga escala, no entanto, não está nos planos dos pesquisadores, que pretendem continuar o estudo verificando a eficiência da DM43 e da DM64 contra patologias como algumas neoplasias e a osteoartrite, que também têm a participação de metaloproteases e/ou fosfolipases.

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