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18/03/2008

Tese investiga fósseis de flebotomíneos conservados em âmbar por 20 milhões de anos

Catarina Chagas


Por sua coloração atraente, âmbares são facilmente encontrados em lojas de jóias adornando anéis ou colares. Para o taxonomista José Dilermando Andrade Filho, da Fiocruz Minas, porém, eles assumem um significado completamente diferente: são objetos valiosos para a pesquisa de fósseis. Em seu trabalho de doutorado recém-defendido no Instituto Oswaldo Cruz (IOC) da Fiocruz, o pesquisador descreve o que encontrou em meio ao material, incluindo a descrição inédita de sete espécies de flebotomíneos, insetos transmissores das leishmanioses.


 Imagem do flebotomíneo <EM>Pintomyia killckorum </EM>(Fotos: José Dilermando Andrade Filho) 

Imagem do flebotomíneo Pintomyia killckorum (Fotos: José Dilermando Andrade Filho) 


Ao todo, foram estudadas 97 amostras de âmbar, que continham um total de 162 flebotomíneos fossilizados do período Mioceno (cerca de 20 milhões de anos atrás). O material foi coletado na República Dominicana, uma das maiores fontes de âmbar com inclusões – isto é, fósseis – no mundo. Devido às condições ambientais e à presença de árvores tropicais que secretam uma resina que, após milhões de anos, constitui o âmbar, as amostras provenientes de lá são mais claras e melhor preservadas do que as demais. O bom estado de conservação faz também com que os fósseis sejam muito procurados e legalmente comercializados no país.


O trabalho consistiu na preparação dos âmbares, que em alguns casos exigia lixar e polir a resina. Durante a análise dos insetos no microscópio óptico, Andrade Filho observava estruturas da cabeça, tórax e abdômen para identificar e classificar os animais. Foram encontradas sete espécies de flebotomíneos que nunca haviam sido descritas: Pintomyia killickorum, Pintomyia brazilorum, Pintomyia paleotownsendi, Pintomyia paleotrichia, Micropygomyia brandaoi, Micropygomyia dorafeliciaangeli e Pintomyia dominicana. Todas elas estão extintas na República Dominicana e as duas espécies encontradas atualmente no país nunca foram registradas como fósseis.


“Entretanto, os flebotomíneos fósseis da República Dominicana são muito semelhantes morfologicamente às espécies atuais”, afirma Andrade Filho. “Provavelmente uma das espécies descritas nesse trabalho atuava como vetor de Leishmania na época, mas é muito difícil de se provar essa hipótese”. Atualmente, são registradas mais de 500 espécies de flebotomíneos, das quais cerca de 30 atuam como transmissoras de doença.


 Foto de <EM>Pintomyia falcaorum</EM>

Foto de Pintomyia falcaorum


Além da importância médica, o estudo contribui para a descrição da diversidade da fauna da República Dominicana na época, antes desconhecida pela comunidade científica. Os flebotomíneos atualmente estão distribuídos em todos os continentes, o que aponta para uma longa história evolutiva de suas espécies ainda por ser desvendada pelos pesquisadores.


No entanto, nem todos os lugares apresentam oferta de fósseis em âmbar tão rica quanto na República Dominicana. No Brasil, por exemplo, embora já tenham sido encontrados âmbares, nenhum continha animais fossilizados. A escassez de material de pesquisa reforça a importância de um trabalho de descrição das espécies como o feito na Fiocruz Minas. “O trabalho com fósseis de flebotomíneos é inédito no Brasil e essa tese foi a primeira a trabalhar com fósseis em âmbar na América Latina”, orgulha-se o Andrade Filho, que foi orientado por Reginaldo Brazil, do IOC, e Eunice Galati, da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo.


Por outro lado, o trabalho está apenas começando: os próximos passos do pesquisador incluem a análise mais precisa de alguns flebotomíneos que, por não estarem em bom estado, seja pela sua posição no âmbar ou pela presença de bolhas ou rachaduras, não puderam ser identificados nas primeiras análises.

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