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05/09/2006

Dissertação aponta falhas e propõe mudanças no ensino escolar de ciências

Pablo Ferreira


Existe uma distância entre a ciência feita pelos pesquisadores em seus laboratórios e a estudada nas escolas. Para diminuí-la é preciso criar novas metodologias de ensino, levando em conta a realidade dos alunos. Essas conclusões estão na dissertação de mestrado (defendida em 29 de agosto deste ano) Antenas ligadas para preservar a biodiversidade: concepções alternativas no ensino de ciências, da bióloga Andréa Ribeiro dos Santos.


O trabalho de Andréa surgiu quando ela começou a observar, graças a sua experiência como professora, deficiências no ensino básico escolar. "O ponto que mais me chamou a atenção foi a enorme dificuldade que os estudantes tinham em entender o processo de metamorfose, que ocorre com a maioria dos insetos", exemplificou a bióloga durante a defesa de seu projeto. Ela acredita que o programa de educação em ciências não atrai a atenção dos estudantes como deveria.


Para examinar a questão do modo apropriado, Andréa freqüentou a Escola Estadual Ubiratan Reis Barbosa, em Nilópolis (RJ), durante um ano letivo. Por meio de questionários e análise de desenhos feitos pelos estudantes, fez-se um levantamento das concepções das crianças sobre os insetos e o conhecimento de suas relações com o homem no ambiente em que elas viviam. A bióloga definiu duas causas principais para a deficiência do aprendizado em ciências: a distância do conteúdo dado em classe da realidade dos alunos e a existência de alguns livros didáticos e materiais de campanha em saúde com erros, tanto na parte visual como na parte textual, que induzem a interpretações não coerentes com a realidade.


O primeiro aspecto pôde ser comprovado pela análise das respostas dos diversos questionários transmitidos em sala de aula. Perguntados sobre a aversão a determinadas espécies de insetos, 42% dos alunos escolheram a abelha e 41%, a barata. Enquanto isso, somente 5% apontaram mosquitos e apenas 3% as moscas. "Surpreende o fato de não haver medo dos insetos transmissores de doenças", disse Andréa referindo-se às moscas e aos mosquitos, o que sugere uma falta de conhecimento sobre essas espécies. Com relação aos livros didáticos, durante sua defesa a bióloga mostrou como exemplo trecho de um deles que trata do dengue. O livro só trazia uma única página sobre o assunto e com um erro gravíssimo, a foto de um mosquito Anopheles sp. (vetor da malária) em vez de um Aedes aegypti (verdadeiro transmissor do dengue). O material de campanha para a prevenção do dengue na região de Nilópolis também continha imperfeições nos desenhos.


No entanto, os questionários também trouxeram algo positivo: os alunos (sobretudo os de idades entre 10 e 11 anos) mostravam curiosidade, interesse e abertura em estudar os insetos. Com isso, a bióloga resolveu inovar, propondo a confecção de insetários. A turma foi dividida em grupos e cada um deles criou larvas de uma espécie de besouro comum na região. O resultado foi surpreendente, pois pela observação dos estágios de desenvolvimento do besouro os alunos evoluíram sobremaneira no ponto em que apresentavam maior dificuldade - o entendimento do processo de metamorfose. "É possível trabalhar com práticas simples e atividades lúdicas para melhorar o processo de ensino e aprendizagem", afirmou Andréa.


Após um ano letivo de análises, Andréa pôde chegar a algumas conclusões. Em primeiro lugar, é importante observar a percepção dos alunos para a construção de novos métodos de ensino. É preciso, também, que haja um controle mais rigoroso sobre os livros didáticos e materiais de campanha. Para tanto, faz-se necessário maior participação dos docentes nas escolhas dos conteúdos a serem passados em sala de aula, assim como maior investimento em sua formação. De positivo, fica a comprovação do interesse dos alunos. Sua curiosidade deve ser explorada por meio de atividades simples e lúdicas, que popularizem e aproximem a ciência feita nos laboratórios da escolar. Por serem mais abertas ao conhecimento e por vezes mais ativas que os adultos, as crianças podem ajudar a melhorar a qualidade de vida no entorno onde moram (por exemplo, com o conteúdo apreendido em sala de aula, ajudar no combate ao dengue). "A escola é um excelente espaço para mudança dos hábitos de uma comunidade", concluiu Andréa.


Andréa Ribeiro dos Santos concluiu seu mestrado em ensino em biociências em saúde, no Instituto Oswaldo Cruz (IOC), uma unidade da Fiocruz. Ela foi orientada pelo entomologista Anthony Érico Guimarães.

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