13/11/2015
A tragédia que aconteceu em Bento Rodrigues, em Minas, tem proporções inimagináveis. O desastre é enorme em diferentes aspectos: humanos, materiais, culturais, econômicos, sociais e ambientais. Homens, mulheres, crianças estão em situação lastimável, sem documentos, pertences, história. Tudo foi enterrado na lama. A tragédia trouxe mortos, desaparecidos e muitas sequelas.
Além disso, os estragos não ficarão em uma única localidade e município. Foi anunciado que a lama já chegou a áreas mais distantes do estado, e que também já alcançou o Espírito Santo.
O ocorrido contribuirá para elevadíssima degradação ambiental, da fauna e flora, que repercutirá por décadas, e a deterioração da qualidade da água para consumo humano, com consequências de médio e longo prazos para o abastecimento das populações.
Preocupa o fato de este tipo de acidente em barragens de rejeitos ter ocorrido de forma sistemática nas últimas décadas em Minas. O histórico recente impressiona. Setembro de 2014: o talude de uma barragem na Mina Retiro do Sapecado, da Herculano Mineração, se rompeu e deixou três mortos e um ferido. Janeiro de 2007: uma barragem com rejeitos da mineradora Rio Pomba Cataguases rompeu e inundou as cidades de Miraí e Muriaé com mais de dois milhões de litros de lama de bauxita. Março de 2003: uma barragem de rejeitos industriais se rompeu em Cataguases, com incalculáveis litros de lixívia negra — resíduo da produção de celulose —, que contaminaram o Rio Paraíba do Sul e córregos próximos por 200 quilômetros, atingindo também o interior do Rio de Janeiro e deixando 600 mil pessoas sem água.
Em 2001, houve um acidente grave em Macacos, quando lama e resíduos de mineração encobriram dois quilômetros de uma estrada, após o rompimento de uma barragem da mineradora Rio Verde.
Chamam a atenção o descaso, a ineficiência e a incompetência técnica das empresas, que permitem a ocorrência sistemática de tais eventos. Fatos assim mostram a necessidade de um rigoroso e cuidadoso levantamento das barragens existentes, visando a medidas preventivas e planos de contingência. O princípio da precaução deve presidir a abordagem a ser realizada.
O desastre em Bento Rodrigues não é natural. Tem responsáveis explícitos, e a mineradora Samarco deve dar imediatamente toda a assistência aos atingidos, minimizando os impactos. É absolutamente indispensável que o cuidado com a população atingida nesta tragédia seja abordado a partir do princípio de seus direitos humanos e que sejam garantidas adequadas condições, que minimamente restaurem a sua qualidade de vida.
Essa é uma tragédia inaceitável. A empresa tem que ser responsabilizada sumariamente, e seus deveres devem ser firmemente cobrados pelos agentes públicos, que também têm responsabilidade em assegurar a proteção das pessoas e a recuperação ambiental.
*Léo Heller é pesquisador da Fiocruz Minas e Zélia Profeta é pesquisadora e diretora da Fiocruz Minas.
O artigo foi originalmente publicado no jornal O Globo (RJ) em 12/11/2015.