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11/02/2016

Radis analisa tríplice epidemia provocada pelo Aedes

Ana Cláudia Peres (Radis)


Num dia qualquer de um já distante 1994, a médica sanitarista Lia Giraldo participava de uma atividade acadêmica corriqueira quando se deparou com uma cena que a deixou intrigada. Um agente de controle de endemias abriu a tampa da caixa d'água do antigo Hospital Pedro II, onde funcionava o Departamento de Saúde Coletiva da Fiocruz, em Pernambuco, e adicionou várias garrafinhas de um pó bege acastanhado. Curiosa, ela puxou assunto com o profissional, que lhe disse: “Há quinze anos, aqui é um foco de mosquito transmissor da dengue e então a cada 40 dias eu coloco esse remédio”.

O remédio era o temefós, um organofosforado da classe toxicológica III — o que, numa linguagem leiga, pode ser traduzido como um larvicida ligeiramente tóxico. Apesar da religiosidade com que o agente de saúde cumpria com a obrigação, adicionando repetidamente o produto na água de abastecimento, o foco de Aedes aegypti continuava ali, teimoso,
resistente. Aquilo era um equívoco, concluiu a professora, que passou a pesquisar uma série de outros hiatos no Programa Nacional de Controle da Dengue, adotado na época.

Noves fora o comprometimento da água potável, o que por si só é um fato grave, suas pesquisas apontaram ser um erro centrar as ações no mosquito e não nas condições que propiciam a sua proliferação — a saber: ausência de saneamento, oferta de água intermitente, acúmulo de lixo, falta de drenagem, limpeza pública, cuidados intradomiciliares e peridomiciliares, por exemplo.

“Enquanto o modelo de controle dessa doença complexa for centrada no vetor, como já é realizado há mais de 40 anos sem sucesso, não teremos possibilidade de solução”, disse a
pesquisadora do Programa de Pós-graduação em Saúde Pública da Fiocruz Pernambuco, em entrevista à Radis, muitos estudos depois do episódio com a caixa d'água. Lia explica que hoje o Brasil é endêmico para dengue, com um vetor altamente competente para a transmissão nas áreas com alta densidade habitacional e baixas condições sanitárias, onde está o maior estresse hídrico e de pobreza.

O assunto volta à tona no momento em que o Brasil vive uma “tríplice epidemia”, como o infectologista Rivaldo Venâncio da Cunha tem se referido à incidência dos casos simultâneos de dengue, chikungunya e zika — três tipos de vírus transmitidos pelo mosquito do gênero Aedes circulando ao mesmo tempo no país. Esse último, diga-se de passagem, vem alarmando a população e desafiando pesquisadores e autoridades, desde que em novembro do ano passado foi constatada sua relação direta com uma epidemia de microcefalia. De acordo com dados do Ministério da Saúde, em meados de janeiro já eram 3.893 casos suspeitos da doença, notificados em 724 cidades de 21 unidades da federação. Para Rivaldo, que é diretor da Fiocruz Mato Grosso do Sul, a epidemia de zika — cuja microcefalia é a consequência mais nefasta, mas não a única, tampouco a mais
frequente — já pode ser considerada o mais grave problema de saúde coletiva, depois da violência, e a maior ameaça para as próximas décadas se não houver um aporte tecnológico de curto prazo (ver matéria específica sobre zika e microcefalia nas páginas 18 a 21).

Continue a leitura da reportagem aqui

Confira na íntegra a edição de fevereiro da Radis (volume 161)

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