13/01/2012
Elisa Andries
Durante uma semana representantes da Escola de Altos Estudos em Saúde Pública da França, da Presidência da Fiocruz e da Escola Nacional de Saúde Pública (Ensp/Fiocruz) se reuniram no Rio de Janeiro para alinhavar acordos de cooperação técnica para 2012. Três projetos foram desenhados e devem sair do papel este ano: um no campo da gestão hospitalar, com o objetivo de apoiar e colaborar com a implementação do Instituto Nacional de Infectologia e do Instituto Nacional da Mulher e da Criança na Fiocruz; outro no campo do saneamento, voltado para o fomento de intercâmbio nas atividades de ensino e pesquisa; e o último, mais geral, para intercâmbio de professores e alunos entre as duas instituições.
Para o vice-diretor de Desenvolvimento Institucional e Gestão da Ensp, Francisco Braga, o destaque dessa cooperação é o trabalho conjunto pela implementação dos institutos nacionais na Fiocruz. "Os dois institutos compõem projetos prioritários do plano quadrienal da Instituição. São estratégicos tanto para a Fiocruz quanto para o próprio SUS", destaca Francisco Braga, em entrevista ao Informe Ensp, a seguir.
Qual é o objetivo da cooperação com a Escola de Altos Estudos em Saúde Pública da França?
Francisco Braga: O objetivo é trabalhar áreas de interesse comum, onde há expertise e onde se reconheçam lacunas, desafios. No caso da gestão hospitalar, uma das áreas mais bem estabelecidas na escola francesa, eles têm reconhecida expertise. Por outro lado, a organização e a gestão hospitalar no país ainda apresentam muitos problemas.
Não é a primeira vez que assinamos um acordo de cooperação com a Escola de Altos Estudos em Saúde Pública da França, antiga Escola Nacional de Saúde Pública Francesa - uma instituição ligada ao Ministério de Assuntos Sociais e ao Ministério de Educação do governo francês. A instituição tem diversas atribuições, sobretudo na formação dos quadros de saúde pública para o governo francês. Também desenvolve atividades de pesquisa e começa a ter cursos stricto sensu, em parceria com universidades francesas.
Já tivemos um acordo de cooperação com essa instituição nos anos 1990, que foi voltado para dois campos: o primeiro na área de gestão hospitalar e o segundo tendo por objeto a implantação de um sistema de acreditação de centros formadores em saúde pública no Brasil. As duas iniciativas transcorreram com sucesso. Na área da gestão hospitalar, a cooperação era voltada, sobretudo, para a reformulação do curso de especialização em gestão hospitalar. Tivemos, de fato, mudanças importantes a partir desse curso e, durante um período inicial, contamos, inclusive, com a participação de professores franceses no nosso curso. Nesse período também foram realizadas visitas e estágios de alunos da Ensp em hospitais franceses. No campo da acreditação, o projeto também evoluiu bem, mas não tivemos condições de implantar tal modelo de acreditação no Brasil.
Como surgiu a oportunidade de assinar um novo acordo de cooperação com a Escola de Altos Estudos em Saúde Pública da França?
Braga: Margareth Portela (vice-diretora de Pesquisa e Desenvolvimento Tecnológico da Ensp) e eu visitamos a escola francesa no ano passado e estabelecemos os primeiros contatos para fechar possíveis cooperações. Agora, a delegação de dirigentes e professores da Escola de Altos Estudos esteve aqui no fim do mês de novembro. Tratamos de três projetos, todos eles importantes para esse novo acordo de cooperação. O primeiro está ligado, mais uma vez, ao campo de gestão hospitalar, com o objetivo de apoiar e colaborar com a Fiocruz nos macroprojetos de implementação do Instituto Nacional de Infectologia e do Instituto Nacional da Mulher e da Criança. Os dois institutos representam projetos prioritários do plano quadrienal da Fiocruz. E a ideia é que especialistas da Ensp e da escola francesa venham colaborar não só na elaboração dos projetos desses institutos nacionais, como na chamada gestão da mudança dos atuais hospitais. Gestão da mudança implica a preparação da transição dessas duas unidades hospitalares da Fiocruz para se tornar institutos nacionais de referência. Esse é o projeto na área de gestão hospitalar.
O segundo projeto de cooperação está no campo do saneamento. O chefe do Departamento de Saneamento e Saúde Ambiental (DSSA), Paulo Barrocas, apresentou à delegação francesa as atividades de ensino e pesquisa do departamento. Também manifestou interesse no intercâmbio de informações e atividades, já que a escola francesa tem reconhecida experiência nessa área. A ideia é que se estabeleçam os primeiros contatos para que isso tome corpo, possivelmente com a realização de algum seminário e o intercâmbio de professores e alunos que atuam nessa área.
O terceiro tema, este mais geral e que atende às duas escolas, é o intercâmbio de professores e alunos entre as duas instituições. A Escola de Saúde Pública francesa tem interesse em enviar estudantes para estágio aqui conosco. Este ano, três alunos franceses estiveram na Ensp e, conforme a cooperação evolua, vamos enviar também professores e alunos para participação em seminários, eventos e cursos.
Qual o maior desafio apresentado nessa cooperação internacional?
Braga: Neste primeiro momento, a cooperação toma corpo, sobretudo, via colaboração para a implementação dos institutos nacionais de Infectologia e da Mulher e da Criança na Fiocruz, em conformidade com a política estabelecida pelo Ministério da Saúde de criação de institutos nacionais. O Brasil conta, hoje, com três institutos nacionais: O Inca, o Into e o Instituto Nacional de Cardiologia de Laranjeiras.
Os projetos da Fiocruz são marcados pela inovação - daí a importância de contar com especialistas nacionais e internacionais. Na verdade, não se trata apenas de conceber tais institutos, o que por si só já é algo bastante complexo. À medida que o desenho da proposta avança, é necessário também planejar e promover a transição dessas unidades. É preciso que essas unidades da Fiocruz, pouco a pouco, se convertam, mudem sua cultura, entendam sua nova missão, se preparando para se tornar institutos de referência nacional.
Por que, entre as unidades da Fiocruz, a Ensp foi escolhida para esse trabalho?
Braga: A Ensp é uma das unidades da Fiocruz que possui a atribuição de formação de quadros para o SUS. No nosso mestrado profissional em política e gestão de ciência, tecnologia e inovação em saúde, por exemplo, e no curso de especialização em gestão hospitalar, já formamos um número importante de dirigentes para os hospitais públicos do país, alguns deles inclusive vinculados ao IFF e ao Ipec. No presente caso, assumimos tal compromisso por reconhecer o sentido estratégico desses macroprojetos institucionais e, logicamente, em razão da expertise técnica acumulada.
No campo específico da gestão hospitalar, temos participado de vários projetos de ensino, pesquisa e cooperação técnica no âmbito do SUS. Estivemos envolvidos com o projeto de formulação e implantação das fundações estatais de direito privado, proposta que não teve prosseguimento no plano federal, mas foi adiante em alguns estados e municípios. Temos participado de outros projetos voltados para o desenvolvimento institucional de unidades hospitalares e temos feito pesquisas e publicações na área de assistência e gestão hospitalar. Essa experiência, o quadro de especialistas que a Escola detém é que nos qualifica para prestar esse apoio agora para a Presidência da Fiocruz no enfrentamento desse desafio que é a implantação dos institutos nacionais de referência aqui na instituição.
Toda iniciativa de cooperação compreende uma relação de mão dupla. A meu ver, toda cooperação internacional em princípio é bem-vinda, pois representa uma possibilidade de aprendizado com outras experiências, outras situações e uma oportunidade também para colaborar e buscar colocar em prática nossos conhecimentos e experiências em contextos e realidades distintos. Essa é mais uma oportunidade para que isso aconteça. Temos grande afinidade com a Escola de Altos Estudos da França, de modo que as possibilidades e as expectativas em torno dessa cooperação são muito boas.
Para o projeto de criação dos institutos, já foi assinalada a importância de se promover a qualificação gerencial dos quadros dirigentes dos dois institutos. Também já estamos pensando na organização de um seminário, em nível nacional, no segundo semestre de 2012, com a participação de especialistas franceses e brasileiros, cujo tema central será o papel dos institutos nacionais no SUS. A ideia é que esse conceito de instituto nacional seja mais discutido e melhor compreendido.
Publicado em 13/1/2012.