Livro aborda condições crônicas de saúde na infância e na adolescência

Publicado em - Atualizado em
Fernanda Marques (Editora Fiocruz)
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Com o objetivo de compreender como se constrói o cuidado às condições crônicas na infância e na adolescência em hospitais de média e alta complexidade, a psicóloga e sanitarista Camila Aloisio Alves estudou as relações entre crianças e adolescentes com doenças crônicas, seus familiares e profissionais da saúde, em ambientes de internação (neonatologia, pediatria e cirurgia pediátrica). Os resultados desse trabalho são apresentados no livro Tessituras do Cuidado: as condições crônicas de saúde na infância e adolescência, novo volume da coleção Criança, Mulher e Saúde da Editora Fiocruz. Tendo o cuidado como objeto de estudo e privilegiando um olhar inclusivo, a autora revela, a partir de situações críticas, encontros e vivências que possibilitam a construção de projetos de vida com e apesar do adoecimento crônico. Desse modo, o livro contribui para a compreensão dos elementos, desafios e potencialidades inscritos no cuidado dedicado a crianças e adolescentes crônicos e seus familiares.

Aparatos tecnológicos como respiradores, cateteres e dispositivos para alimentação e excreção fazem parte da rotina desses pacientes, que, até vinte anos atrás, talvez fossem considerados ‘incompatíveis’ com a vida. Hoje, porém, essas crianças crescem e se desenvolvem, reinventando a vida e as relações. “A cronicidade vivida na infância e adolescência não representa o fim da vida, mas condições de possibilidade para a promoção de novos laços entre os sujeitos”, destaca Camila. São trajetórias permeadas de sofrimentos e medos, mas também de superação e adaptação, além do aprendizado, notadamente para os profissionais da saúde.

“Para o profissional, o envolvimento com a assistência a esses pacientes e familiares é um contato não apenas com a experiência do outro, mas também com os limites e possibilidades de suas formas de atuação e intervenção”, afirma Camila. “O cuidado às condições crônicas em saúde na infância e adolescência mexe, a todo momento, com os modos de interagir com o outro, de ver a vida e de entender o sentido da própria prática profissional”, completa. Ou seja, segundo a autora, as condições crônicas são também caminhos para se reinterpretar a vida e repensar os processos de formação e trabalho de equipes, serviços e instituições, abrindo espaço para inovações nas práticas em saúde.

Nesse sentido, destaca-se a possibilidade de promover trocas horizontais onde antes prevaleciam relações verticalizadas. “O movimento de inclusão dos familiares no cuidado provido a seus filhos significa muito mais do que a mera transmissão de informações sobre o estado clínico e o cumprimento de suas obrigações como observadores da assistência. Essa inclusão diz respeito a acolhimento, dialogo e escuta, e os coloca no lugar de sujeitos ativos do processo para que se possa construir um cuidado compartilhado e corresponsável”, explica a autora.

Na pesquisa que originou o livro, Camila acompanhou as interações sociais e a produção do cuidado nos ambientes de internação, fez entrevistas com mães e também com profissionais da saúde. “Este livro trata de um tema que marca intimamente a vida de um grupo de sujeitos, mas não é demais lembrar que as condições crônicas de crianças e adolescentes referem-se a problemas que afetam toda a sociedade, o que demanda que o cuidado, objeto do presente estudo seja integral, intersetorial e incorpore valores que afirmem a humanização das relações”, avalia a pesquisadora.

De acordo com a orientadora do trabalho, Martha Cristina Nunes Moreira, professora do Instituto Nacional de Saúde da Mulher, da Criança e do Adolescente Fernandes Figueira (IFF/Fiocruz), a pesquisa de Camila chama a atenção para a importância da sensibilidade na atenção à saúde e para os riscos dos estigmas que inviabilizam a inserção social.  Crianças e adolescentes em condições crônicas de saúde e seus familiares, em sua maioria, vivem longas internações e frequentam intensivamente hospitais: são muito visíveis para um grupo específico de profissionais da saúde, mas, num contexto comunitário e social mais amplo, sofrem com os efeitos da invisibilidade, expostos, inclusive, a variadas formas de violência e negligência.

Um dos méritos do livro é, portanto, “o de falar de doenças de longa duração em crianças reconhecendo o direito que estas têm de existir na vida pública”, afirma Martha. “Trata-se de uma contribuição digna de ser lida e explorada, revista e discutida, ganhar vida e o mundo, tocando e tecendo outras leituras e referências”, resume a professora, sublinhando a necessidade de gerar planejamentos, políticas e ações que efetivamente considerem essas crianças e suas famílias.