11/08/2017
César Guerra Chevrand e Ricardo Valverde (Agência Fiocruz de Notícias)
O terceiro e último dia da reunião do Conselho Nacional de Saúde (CNS), nesta sexta-feira (11/8), começou com a participação da presidente da Fiocruz, Nísia Trindade Lima. O presidente do CNS, Ronald Santos, disse que, no momento atual, “o Estado está esvaziado e o mercado, privilegiado”. Fazendo uma alusão ao Dia do Estudante, comemorado nesta sexta-feira, ele disse que “somos, todos, eternos estudantes, sempre aprendendo”. Ao final da participação de todos os conselheiros inscritos para falar, os presidentes do CNS e da Fiocruz assinaram uma carta de intenções que prevê capacitação de recursos humanos, a elaboração de estratégias e ações comuns, o desenvolvimento de pesquisas e o compartilhamento de dados entre as duas instituições.
O presidente do CNS, Ronald Santos, e a presidente da Fiocruz, Nísia Trindade Lima, participam da abertura do evento (foto: Peter Ilicciev)
Logo depois, a presidente Nísia destacou que a comunidade da Fiocruz se sente honrada e orgulhosa de sediar um evento como a reunião do CNS. “Isso faz parte do entendimento que temos do nosso papel no campo de C&T&I. O pensamento crítico, que é uma marca da Fiocruz, é também do CNS. Esperamos que a Fundação possa contribuir, cada vez mais, para a apropriação do conhecimento pelas políticas públicas. Pesquisadores e sanitaristas de duas das nossas unidades, a Escola Nacional de Saúde Pública, e a Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio, tiveram uma participação importante na discussão sobre a atenção básica, que foi um dos pontos fortes desta reunião do CNS”, afirmou Nísia, acrescentando que o ocorreu nestes três dias foi uma “festa da democracia”.
“Esta é uma instituição que respira história. E o Ano Oswaldo Cruz [iniciativa que lembra os 100 anos da morte do cientista Oswaldo Cruz e que tem como slogan Ciência e saúde no projeto nacional] vem reforçar essa característica”. Há mais de 100 anos, quando Oswaldo Cruz dirigia o Instituto que viria a ser o embrião da Fiocruz, o Brasil era um país onde o analfabetismo grassava e vastos territórios do interior sequer dispunham de atendimento médico.
“Oswaldo atuou firmemente nesse amplo processo de intervenção nacional que se deu quando os sanitaristas adentraram os sertões e conheceram a realidade da saúde pública. Desde aquela época eles sabiam que sem melhorar as condições de saúde não se constrói uma nação”, observou a presidente, lembrando ainda que, segundo pesquisas, a Fiocruz é a instituição pública de C&T mais conhecida pelos brasileiros.
Nísia também recordou a 100ª reunião do CNS, ocorrida na Fiocruz em 2000 – até agora a única realizada na instituição. Ela mostrou fotos do evento, citou a participação da médica Zilda Arns, que à frente da Pastoral da Criança fez um importante trabalho pela redução da mortalidade infantil, e comentou uma manifestação feita à época na frente do Castelo, para salientar que a democracia sempre foi algo muito valioso para a instituição.
Em seguida, Nísia apresentou números sobre a produção de vacinas na Fundação, as pesquisas desenvolvidas, os mais recentes avanços obtidos pela Fiocruz, as parcerias com outras instituições de pesquisa públicas e privadas. Atualmente são 271 linhas de pesquisa e 1.665 projetos de desenvolvimento tecnológico. A Fiocruz 275 patentes depositadas no exterior e 83 no Brasil. Cerca de 1,8 mil pesquisadores trabalham com tecnologias para o SUS. “Aqui funciona uma parte significativa do SUS, aqui trabalham companheiros que defendem a vida, a saúde e a ciência e tecnologia nacionais”. Ao final da fala, o presidente do CNS disse que “fortalecer a Fiocruz é fortalecer a capacidade de fazer ciência e saúde em defesa da vida”.
O pensamento crítico, que é uma marca da Fiocruz, é também do CNS. Esperamos que a Fundação possa contribuir, cada vez mais, para a apropriação do conhecimento pelas políticas públicas (foto: Peter Ilicciev)
Santos passou então a palavra aos conselheiros inscritos para participar. O conselheiro Geraldo Adão, de Nova Lima (MG), elogiou a atuação e a programação do Canal Saúde e pediu que a abrangência da emissora atinja todo o país. Antônio Lacerda Souto, representante da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag) no CNS, afirmou que os agentes comunitários de saúde (ACS) representam o Estado naqueles lugares onde ele não se faz presente, como favelas, periferias e comunidades rurais.
Francisca Valda Silva, da Associação Brasileira de Enfermagem (ABEn), pediu que os profissionais de saúde precisam “tirar a roupa de trabalhadores e vestir a de usuários do SUS”, para assim defender melhor o Sistema. As presidentes dos conselhos Estadual e Municipal de Saúde do Rio de Janeiro, respectivamente Étila Elane de Oliveira Ramos e Maria de Fátima Gustavo Lopes, criticaram os gestores e o que chamaram de desmonte do SUS.
A enfermeira Rebeca Santos, da residência multiprofissional em saúde da família da Fiocruz, emocionou os presentes ao fazer uma veemente e apaixonada defesa do Sistema Único de Saúde. “Todos aqui temos que lutar pelo SUS. Há pessoas que passam fome, outras que morrem de diarreia ou, em pleno século 21, apresentam doenças como sarna. Não podemos permitir que isso continue a acontecer. Viva a saúde pública!”, bradou emocionada e chorando.
O representante do Ministério da Saúde no CNS, Neilton Araújo dos Santos, discordou da quase totalidade dos presentes à reunião. Sob vaias e chamado de “golpista”, ele disse que “existe um esforço para construir um projeto que atenda a maioria e esses encontros também servem para se ouvir o contraditório. “A partir do debate é que vamos encontrar os pontos que temos em comum, que acredito serem muitos. O que hoje pode ser visto como retrocesso terá outra avaliação no futuro”. O presidente Ronald Santos precisou intervir para que Neilton conseguisse expor seu pensamento, devido às vaias.
Depois das participações de todos os conselheiros, a presidente Nísia voltou a se manifestar. Ela disse que está consciente da missão que é estar à frente da Fiocruz neste momento e se declarou confiante na força da democracia. Nísia afirmou que a comunicação pública é fundamental para o processo de defesa do SUS e citou as experiências da Fundação na área, como o Canal Saúde, a revista Radis e o Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica em Saúde (Icict/Fiocruz). Por fim, os dois presidentes assinaram uma Carta de Intenções da Fiocruz com o Conselho, para formalizar o início de uma agenda de colaboração, com ações futuras a serem definidas por uma assessoria técnico-científica. Santos convidou as presidentes dos conselhos Estadual e Municipal de Saúde, Étila Elane e Maria de Fátima, para servirem de testemunhas da assinatura.
Os dois presidentes assinaram uma Carta de Intenções da Fiocruz com o Conselho (foto: Peter Ilicciev)
A última atividade dos conselheiros foi uma visita ao campus da Fiocruz, na qual puderam conhecer o Castelo da instituição, a unidade de produção de vacinas (Bio-Manguinhos) e outros espaços.
CNS promove 296ª Reunião Ordinária em Manguinhos (RJ)
A 296ª Reunião Ordinária do Conselho Nacional de Saúde (CNS) foi marcada por uma série de atividades no auditório da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca (Ensp/Fiocruz), em Manguinhos (RJ). A Comissão Intersetorial de Orçamento e Financiamento (Confin) da CNS esteve reunida e manifestou preocupação com a escassez de recursos e o esvaziamento da saúde pública no Brasil. Durante o encontro, os conselheiros debateram o relatório do 1º Quadrimestre (ampliado para junho de 2017) e aprovaram, por unanimidade, uma proposta de minuta. Também foi aprovado, por unanimidade, a Programação Anual de Saúde (PAS) 2017.
Outro item de pauta em votação foi a proposta de atualização da Carta dos Direitos dos Usuários da Saúde. Após debater as contribuições apresentadas pelo Grupo de Trabalho e pela consulta à sociedade, os conselheiros aprovaram, por unanimidade, uma nova versão da carta. No último ponto de pauta da reunião de quinta-feira (10/8), também foram apreciados encaminhamentos para a 1ª Conferência Nacional de Vigilância em Saúde (1ª CNVS) e a 2ª Conferência Nacional de Saúde das Mulheres (2ª CNSMu).
Prevista para acontecer entre 21 e 24 de novembro em Brasília, a 1ª CNVS já teve seu documento guia aprovado e terá como tema principal a Vigilância em Saúde: Direito, Conquista e Defesa de um SUS Público de Qualidade. Entre os seus principais desafios está o estabelecimento de um modelo de atenção à saúde voltado para a redução do risco da doença e de outros agravos, em que a promoção, a proteção e prevenção recebam a mesma importância do que a recuperação e a assistência.
A etapa nacional da 2ª Conferência Nacional de Saúde das Mulheres está programada para acontecer entre os 17 a 20 de agosto, em Brasília, 31 anos após a realização da sua primeira edição. Com o tema de “Saúde das mulheres: Desafios para a integralidade com equidade”, a 2ª CNSMu terá como eixo principal a implementação da Política Nacional de Atenção Integral à Saúde das Mulheres. De acordo com os membros do CNS, a meta é ampliar a mobilização e o engajamento das mulheres com a agenda de resistência e de lutas contra os retrocessos na saúde. Confira aqui o documento orientador da 2ª CNSMu).