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08/02/2012

Nova metodologia leva apenas 24 horas para diferenciar amostras de rotavírus A

Cristiane Albuquerque


O combate ao rotavírus no Brasil conta, desde março de 2006, com um importante aliado: a vacinação gratuita, incluída no calendário nacional de imunizações. A vacinação, no entanto, coloca um desafio para os cientistas: o rotavírus tipo A – o maior responsável por casos de gastroenterite infantil aguda em todo o mundo – pode apresentar uma série de pequenas variações genéticas, compondo um conjunto de diferentes genótipos. Por isso, eventualmente, mesmo uma criança vacinada poderá ser infectada e apresentar um quadro menos grave de gastroenterite aguda. Quando a criança é infectada pelo genótipo G1P[8] – o mesmo utilizado na produção da vacina Rotarix©, adotada no Brasil –, como, então, diferenciar se a amostra clínica da criança contém vírus vacinal ou selvagem? Na busca de uma resposta para esta pergunta, os pesquisadores do Laboratório de Virologia Comparada e Ambiental do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz), que atua como referência em rotaviroses junto ao Ministério da Saúde, estudou quais seriam as técnicas mais adequadas para uma diferenciação segura. O resultado é um método inovador, eficaz, altamente específico e que pode ser executado em apenas 24 horas, o que é indispensável na investigação de casos de crianças vacinadas que foram novamente infectadas pelo rotavírus A.


 No estudo, os pesquisadores analisaram o genoma viral (chamado dsRNA, um RNA de dupla fita, contendo 11 segmentos) em amostras de três diferentes lotes da vacina Rotarix®

No estudo, os pesquisadores analisaram o genoma viral (chamado dsRNA, um RNA de dupla fita, contendo 11 segmentos) em amostras de três diferentes lotes da vacina Rotarix®





Rotavírus e vacinação

 

Os rotavírus A estão associados às gastroenterites agudas e são responsáveis pela morte de aproximadamente 511 mil crianças menores de 5 anos, anualmente, sobretudo nos países em desenvolvimento. Transmitidos principalmente por via oro-fecal, por água, alimentos e superfícies contaminadas e pelo contato direto com pessoas infectadas, provocam um quadro de diarreia, vômito e febre branda nos pacientes.

 

A vacinação é a estratégia de controle mais eficaz contra o rotavírus, pois reduz a forma grave da doença. Para gerar imunidade, a vacina inclui em sua formulação partículas virais atenuadas. No Brasil, a vacina adotada pelo Ministério da Saúde é a monovalente (G1P[8] / Rotarix®).

 

Análise do genoma viral

 

O Laboratório de Virologia Comparada e Ambiental do IOC propõe uma nova abordagem para realizar a diferenciação entre os vírus vacinal e selvagem. “Atualmente, temos crianças que foram imunizadas com doses da vacina e que, depois, foram infectadas com rotavírus A. Então, a principal questão proposta pelo estudo é, em uma determinada amostra, primeiramente, verificar se existe a presença do genótipo G1P[8] do rotavírus A e, em segundo lugar, analisar se este genótipo é de origem selvagem ou vacinal”, explica o chefe do Laboratório e coordenador da pesquisa, José Paulo Leite.

 

No estudo, os pesquisadores analisaram o genoma viral (chamado dsRNA, um RNA de dupla fita, contendo 11 segmentos) em amostras de três diferentes lotes da vacina Rotarix®. A partir das amostras, foram sequenciados 10 dos 11 genes do rotavírus A que codificam proteínas estruturais (VP1, VP2, VP3, VP4, VP6 e VP7) e não estruturais (NSP1, NSP3, NSP4 e NSP5). Os genes foram multiplicados por técnicas de amplificação genômica (RT-PCR).

 

“Comparamos as sequências que conseguimos obter com as de todos os genótipos de rotavírus A disponíveis no banco de dados internacional GenBank”, conta o pesquisador. De acordo com os resultados, o gene que codifica a proteína não estrutural NSP3 se mostrou o mais adequado para a diferenciação entre os genótipos G1 de origem vacinal e selvagem. “Atualmente, preconiza-se o uso do gene que codifica a NSP3 para o diagnóstico de rotavírus A pela metodologia de amplificação genômica quantitativa. Observamos que, pelo fato de ter uma mutação única, este gene se enquadraria em nossa proposta, que consistia em obter um método fácil e relativamente rápido para a distinção entre as amostras vacinal e selvagem dos rotavírus A com genótipo G1”, lembra a pesquisadora visitante do Laboratório de Virologia Comparada e Ambiental do IOC Tatiana Rose. A metodologia proposta tem como base a amplificação parcial do gene que codifica a proteína NSP3, seguida de análise com uma enzima (endonuclease de restrição BspHI).

 

Vantagens

 

Um grupo holandês já havia demonstrado a diferença entre amostras selvagem e vacinal do rotavírus A com base na análise do gene VP7. No entanto, essa metodologia tem um custo mais elevado e demora, em média, 48 horas para ser concluída. “A técnica que desenvolvemos apresenta como principais vantagens o menor risco de reação cruzada e o menor custo em comparação a outros métodos publicados”, compara Leite. “A técnica que utilizamos é também mais rápida e sensível para distinguir entre o gene NSP3 da vacina Rotarix® e o da amostra selvagem do rotavírus A. Com o nosso método, em apenas 24 horas é possível saber se a amostra é vacinal ou selvagem”, ressalta Tatiana.

 

De acordo com os pesquisadores, o trabalho terá efeitos importantes na saúde pública, especialmente no Brasil, na América Latina e nos países que adotaram a vacina Rotarix®, pois o monitoramento dos genótipos circulantes do rotavírus A e a diferenciação entre amostras são cruciais. “Teremos, assim, a possibilidade de avaliar o impacto do esquema vacinal na prevalência dos genótipos mais comuns, no surgimento de genótipos que ‘escapam’ da imunização e, ainda, no estudo da evolução dos rotavírus A”, justifica Leite.


Publicado em 7/2/2012.

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