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08/07/2009

O uso do Trypanosoma cruzi em terapia contra o câncer na Guerra Fria é tema de palestra

Renata Moehlecke


No verão de 1946, logo após o final da Segunda Guerra Mundial, dois pesquisadores soviéticos anunciaram a descoberta de uma propriedade no protozoário Trypanosoma cruzi, causador da doença de Chagas, que estaria auxiliando pesquisas de combate ao câncer em pacientes. Nomeada “KR”, a novidade chamou atenção de estudiosos sobre a doença em diversos países, como França, Brasil, Estados Unidos e Holanda, que investiram na nova linha de pesquisas. No entanto, esse entusiasmo oscilou e começou a decrescer nas décadas que se seguiram e a Guerra Fria acabou tendo um papel importante na condução dos estudos. Isso é o que contou o canadense Nikolai Krementsov em palestra no Simpósio Internacional Comemorativo do Centenário da Descoberta da Doença de Chagas que ocorreu nesta quarta-feira (8/7) no Hotel Sofitel, em Copacabana, no Rio de Janeiro.


 Krementsov: esperanças de que a divulgação de seu trabalho estimule investigações sobre os efeitos da Guerra Fria na ciência (Foto: Gutemberg Brito)

Krementsov: esperanças de que a divulgação de seu trabalho estimule investigações sobre os efeitos da Guerra Fria na ciência (Foto: Gutemberg Brito)



 

O pesquisador foi um dos participantes de uma mesa redonda dedicada à apresentação de trabalhos sobre o T. cruzi e a doença de Chagas na história. Professor da Universidade de Toronto, no Canadá, Krementsov aponta que as pesquisas relativas ao T. cruzi e a luta contra o câncer desapareceram na década de 50, voltando com força no mercado internacional na década de 60: uma indústria farmacêutica francesa produziu o Trypanosa e outra soviética, o Cruzin, ambos medicamentos que agiam de forma positiva sobre tumores malignos. Contudo, segundo o pesquisador, a instauração da Guerra Fria dividiu o mundo em dois blocos e a competição criada entre os países em diversas áreas do conhecimento também atingiu os estudos referentes à medicina.

 

“Revestindo a pesquisa científica com uma impenetrável cobertura de segredos, as comunicações entre os cientistas dos dois blocos foram interrompidas, o que influenciou consideravelmente a escolha de tópicos, objetos e métodos em vários campos”, afirma Krementsov. “Os estudos sobre o câncer não constituíram exceção. Enquanto a pesquisa sobre as possíveis propriedades do Trypanosoma cruzi sobre a terapia do câncer continuou em países muito diferentes como Chile, França e Uruguai, os Estados Unidos abandonaram completamente esses estudos e investiram na pesquisa sobre endotoxinas”. O estudioso ainda comenta que tem esperanças que a divulgação de seu trabalho estimule investigações sobre os efeitos da Guerra Fria na ciência em países da América do Sul, uma área que ele considera ainda pouco explorada.


Publicado em 8/7/2009.

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