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12/04/2007

Ovitrampas podem reduzir custos no combate ao vírus do dengue

Bruna Cruz


As ovitrampas, armadilhas especiais para colher ovos do mosquito Aedes aegypti, transmissor do vírus do dengue, podem ser empregadas em larga escala por programas de controle do mosquito em todo o país. É o que comprova o modelo de monitoramento populacional e de controle do vetor desenvolvido pelo Centro de Pesquisa Aggeu Magalhães (CPqAM), unidade da Fiocruz em Pernambuco. O trabalho, feito de abril de 2004 a maio de 2006, revelou que 98,5% das 464 ovitrampas usadas no estudo continham ovos do Aedes. Durante o período, foram retirados do ambiente cerca de 12 milhões de ovos. O método, que poderá ser usado para orientar ações de controle em tempo hábil de prever surtos da doença, é mais barato que a pesquisa larvária, metodologia empregada atualmente pelo Programa Nacional de Controle do Dengue do Governo Federal. Parte dos dados foram apresentados por Ridelane Acioli como trabalho de conclusão do mestrado em saúde pública do CPqAM, concluído recentemente.


 Soldado do Exército instala ovitrampa em domicílio do Recife (Foto: Bruna Cruz)

Soldado do Exército instala ovitrampa em domicílio do Recife (Foto: Bruna Cruz)


O índice de positividade de infestação do ambiente pelo mosquito, calculado a partir das ovitrampas, atingiu valores superiores a 85%, durante todo o período do trabalho e em todas as áreas estudadas, indicando o elevado grau de sensibilidade do método do CPqAM. Já o percentual calculado a partir da pesquisa das larvas foi da ordem de 1% nas áreas estudadas. Esse método consiste na vistoria dos domicílios pelo agente de saúde para a procura de possíveis criadouros, coleta e posterior identificação das larvas do mosquito. “Pela experiência que tivemos, é mais fácil obter a colaboração dos moradores para instalar e monitorar uma ovitrampa do que inspecionar os cômodos das residências”, ressaltou Ridelane.


O trabalho do Centro de Pesquisa baseou-se no monitoramento contínuo das ovitrampas instaladas em cinco localidades do Recife: Engenho do Meio, Casa Forte/Parnamirim, Morro da Conceição/Alto José do Pinho, Dois Irmãos/Sítio dos Pintos e Brasília Teimosa. Para distribuí-las, o CPqAM contou com a colaboração do Centro de Vigilância Ambiental (CVA) da Secretaria de Saúde do Recife, parceira na iniciativa, e do Exército.


“Todas as áreas estudadas, selecionadas por contemplarem diferentes características ambientais e socioeconômicas, apresentaram alta densidade de populações reprodutivamente ativas do mosquito”, comentou Leda Régis, pesquisadora do Departamento de Entomologia do CPqAM e coordenadora do estudo. O modelo que utiliza as ovitrampas possibilita o monitoramento da população de Aedes, com a substituição de seu conteúdo – palhetas, biolarvicida (Bti) e infusão de gramínea – a cada quatro semanas.


Custos


A pesquisa do CPqAM mostrou que o modelo de monitoramento do Aedes aegypti, além de mais sensível, pode custar, para uma cidade como o Recife, duas vezes menos se os gastos forem comparados à pesquisa de larvas empregada atualmente nos programas de controle. Levando em consideração apenas o material de consumo, o custo anual é estimado em R$ 4.831.200,00, com a adoção do método convencional, e R$ 785.680,00, adotando-se as ovitrampas.


 Técnico prepara armadilha com palhetas, biolarvicida e infusão de gramínea (Foto: Bruna Cruz)

Técnico prepara armadilha com palhetas, biolarvicida e infusão de gramínea (Foto: Bruna Cruz)


As armadilhas foram instaladas em 2,8% dos 16.791 imóveis das cinco áreas pesquisadas, percentual considerado, segundo os pesquisadores, suficiente para obtenção de dados consistentes para o monitoramento da infestação pelo mosquito. O índice propicia a aplicação do mesmo método em larga escala, nessa mesma proporção, a um menor custo e uma maior facilidade de operacionalização das ações. “Se considerarmos que as armadilhas devem ser inspecionadas uma vez por mês e deveríamos instalar cerca de 14 mil para o monitoramento em toda cidade, que tem cerca de 500 mil imóveis, totalizamos 168 mil visitas ao ano. O custo, em material, seria de R$ 384.700,00, cerca de 12,5 vezes menor do que o da pesquisa larvária tradicional. Em relação à pesquisa larvária rápida, o monitoramento com as ovitrampas, mesmo com um número de visitas maior, custa um pouco menos do que a metade”, detalhou Ridelane.


Com as informações coletadas em quase três anos de trabalho, os pesquisadores do CPqAM participarão do desenvolvimento instrumentos que vão facilitar a aplicação da metodologia em larga escala. O desafio inclui a criação de um software que automatizará a estimativa do número de ovos por palheta e de um modelo matemático para estimar o número de fêmeas que depositam ovos por ovitrampa. O modelo de monitoramento e controle do vetor do dengue no Recife faz parte do projeto Sistema de Apoio Unificado para Detecção e Acompanhamento em Vigilância Epidemiológica (Saudavel), aprovado numa chamada conjunta entre o Ministério da Ciência e Tecnologia , a Finep e o CNPq.


Armadilhas fazem detecção precoce de infestação do mosquito


O modelo revelou que o crescimento da população do mosquito tem início entre outubro dezembro, quando ocorrem as primeiras chuvas após o período de estiagem. Os pesquisadores registraram picos de aumento da população entre março e maio, mas o índice permanece elevado até julho/agosto. “O cruzamento das informações que coletamos com os dados oficiais sobre o dengue sugere uma relação direta entre o crescimento populacional do vetor e o aumento do número de casos da doença”, comentou Leda Régis.


Ela contou que, apesar das cinco localidades onde a pesquisa foi feita apresentarem características socioeconômicas diferentes, o estudo não encontrou relação entre esse fator e a variação da densidade dos mosquitos. A menor densidade foi registrada em Dois Irmãos (1.024.890 ovos coletados), onde a qualidade de vida é baixa, enquanto a segunda maior densidade foi observada em Casa Forte/Parnamirim (2.009.965 ovos coletados), bairro nobre da cidade.


Os bairros mais populosos tiveram o maior número de ovos, mostrando que a concentração demográfica apresenta associação direta com a infestação pelo mosquito. Brasília Teimosa, a área mais infestada (3.570.848 ovos coletados), também é  a mais povoada. A menos infestada (Dois Irmãos) tem a menor densidade demográfica. Essas informações, associadas às variáveis ambientais das localidades, podem ajudar na identificação precoce de aumentos significativos da população do Aedes aegypti, evitando situações como a epidemia de 2002 no Recife. “Esse sistema pode ajudar as autoridades a detectarem momentos críticos, orientando ações de controle para prevenir surtos da doença”, disse Leda.

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