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01/04/2011

Pediculose desvenda hábitos de povos precolombianos

Isabela Schincariol


Identificar mudanças ou permanências na estrutura morfológica e molecular dos parasitos encontrados em múmias do deserto de Atacama, no Chile, entre elas as da cultura chinchorro, é o objetivo das investigações feitas pelo pesquisador da Escola Nacional de Saúde Pública (Ensp/Fiocruz) Adauto José de Araújo, no trabalho Estudio de la pediculosis em las poblaciones precolombianas del norte de Chile. Na pesquisa, Adauto utiliza piolhos adultos e ovos encontrados nos cabelos das múmias, que têm cerca de 7 mil anos. As múmias chinchorro são os corpos com mumificação artificial mais antigos do mundo. Além disso, elas trazem as primeiras manifestações artísticas em cadáveres.


 Exemplar de múmia chinchorro (Foto: arquivo de Adauto de Araújo)

 Exemplar de múmia chinchorro (Foto: arquivo de Adauto de Araújo)


O estudo, desenvolvido no Laboratório de Bioarqueología e Microscopia Eletrônica, no Instituto de Alta Investigação da Universidade de Tarapacá de Arica, e financiado pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico do Chile (Fondecyt), teve início em 2009 e foi renovado por duas vezes. Além da pesquisa, essa parceria também visa à produção de trabalhos científicos conjuntos.


Os chinchorros viviam no norte do Chile e sul do Peru. Diferentes de outras culturas, todos os parentes podiam ser mumificados, incluindo bebês e fetos. E a preservação dos corpos de seus familiares era feita para que pudessem ser mantidos os elos entre eles. A pesquisa atual permite conhecer detalhes íntimos dos procedimentos de embalsamento, conservação, perfil bioarqueológico, sendo possível assim saber quais recursos naturais eles tinham acesso, suas estratégias de subsistência, do que se alimentavam e do que adoeciam.


Segundo Adauto, a pediculose, ou infecção por piolhos, é uma parasitose muito antiga e entre a Humanidade. "Ela veio sobrevivendo e evoluindo junto com o homem, seguiu uma via filogenética. Diversas espécies que antecederam ou que conviveram com os homo sapiens arcaico também tinham seus piolhos, que, provavelmente, eram da mesma espécie. Esse parasito foi herdado dos nossos ancestrais e são bons transmissores de bactérias, por isso podem nos mostrar muitas coisas", afirmou ele.


Adauto contou ainda que o coordenador do projeto, Bernardo Arriaza, do instituto chileno, esteve na Fiocruz em 2009 para discutir sobre o estudo e a instalação de um laboratório voltado para análise em material antigo na Universidade de Tarapacá. Na ocasião, Bernardo trouxe algumas amostras de piolhos e ovos de piolho encontrados nos cabelos das múmias. Esse material foi analisado na microscopia eletrônica do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz),  pela vice-diretora de Ensino, Informação e Comunicação do Instituto, Helene Barbosa. Helene e Adauto são alguns dos brasileiros envolvidos no projeto.


"No mesmo ano, 2009, fui a Arica, no Chile, e examinei mais amostras. Na ocasião, também participei de um simpósio sobre parasitoses em populações antigas. Agora, em março de 2011, voltei lá para concluir um artigo sobre a morfologia dos adultos e ovos de piolho, que estamos preparando para publicação. O laboratório deles foi instalado na universidade; está em pleno funcionamento e muito bem equipado. Esse foi um trabalho muito produtivo", disse Adauto, que concluiu dizendo que, em setembro deste ano, está prevista uma visita de Arriaza à Ensp para um novo período de análises de materiais, preparação de artigos e conversas sobre a parceria.


Publicado em 31/3/2011.

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