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07/12/2012

Pesquisa analisa especialidades odontológicas no Brasil

Tatiane Vargas


Com o objetivo de descrever o perfil demográfico da força de trabalho disponível nas especialidades odontológicas existentes no país, foi realizado um censo demográfico da força de trabalho na especialidade. A pesquisa estudou a distribuição demográfica dos profissionais de odontologia no território nacional e verificou as associações entre as características gerais observadas em cada grupo e alguns indicadores socioeconômicos dos municípios. A pesquisa, de abrangência nacional, resultou em um relatório de dois volumes. O primeiro volume, disponível aqui, traz uma análise do perfil demográfico da força de trabalho composta pelo conjunto dos cirurgiões-dentistas com registro ativo em pelo menos uma especialidade e os resultados referentes aos especialistas registrados. O segundo volume, que também estará disponível, contará com os resultados relativos às outras nove especialidades, além de uma análise comparativa.


Os resultados da pesquisa apontam para uma triste realidade no âmbito da saúde bucal: 55,9% dos dentistas com especialização se encontram sediados no Sudeste, dos quais 42,1% estão apenas nos estados de São Paulo e Rio de Janeiro; em 63,3% dos municípios brasileiros não há especialistas sediados, e a metade do contingente nacional de especialistas tem sede em apenas 21 municípios. Leia, abaixo, a entrevista concedida por Rafael Arouca, coordenador do estudo, e saiba mais sobre a distribuição dos serviços odontológicos no Brasil.


Qual o objetivo do estudo e o que foi considerado para o seu desenvolvimento?


Rafael Arouca: O objetivo do censo foi descrever o perfil demográfico da força de trabalho existente em cada uma das 19 especialidades odontológicas oficialmente reconhecidas no país. Para tanto, consideramos três dimensões analíticas complementares. Inicialmente, descrevemos características gerais do conjunto de profissionais registrados em cada especialidade, como sexo, idade e tempo de registro como especialista. Depois analisamos as dinâmicas populacionais observadas nesses grupos, verificando, em série histórica, o volume de ingressantes e egressos e as taxas de crescimento populacional. Por último, estudamos a distribuição geográfica desses profissionais no território nacional e verificamos associações entre as características gerais observadas em cada grupo e alguns indicadores socioeconômicos dos municípios, como a população, o PIB per capita, o IDH e o coeficiente de Gini.


Como foi o desenvolvimento da pesquisa e o que será apresentado no segundo volume?


Arouca: O estudo, desenvolvido em parceria com o Conselho Federal de Odontologia (CFO), contou com a coordenação adjunta dos professores Henrique da Cruz Pereira (Academia Brasileira de Odontologia) e Luciana Correia Alves (FSP/USP) e com a atuação de uma equipe de 18 assistentes de pesquisa. Nos dois últimos anos, dedicamo-nos a analisar um conjunto extenso e variado de dados secundários extraídos da base de profissionais inscritos do CFO, cruzando-os com outros provenientes de bases de acesso público do IBGE e do Pnud/ONU.


A abrangência do estudo nos obrigou a compor o relatório final da pesquisa em dois volumes. O primeiro volume contém uma análise do perfil demográfico da força de trabalho composta pelo conjunto dos cirurgiões-dentistas com registro ativo em pelo menos uma especialidade e os resultados referentes aos especialistas registrados em cirurgia e traumatologia buco-maxilo-faciais; dentística; disfunção têmporo-mandibular e dor orofacial; endodontia; estomatologia; implantodontia; odontogeriatria; odontologia do trabalho; odontologia legal; e odontopediatria. O segundo volume conterá os resultados relativos às outras nove especialidades e uma análise comparativa. Nossa intenção é publicá-lo ainda este ano, também no repositório da Ensp.


Quais foram as conclusões a que o estudo chegou em relação à distribuição das especialidades odontológicas no Brasil?


Arouca: Chegamos a conclusões interessantes sobre as características gerais e as dinâmicas populacionais desse conjunto de profissionais. Mas, de todos os resultados que descrevemos, foram os relativos à distribuição geográfica dos especialistas que mais preocupação nos trouxeram.


De certo modo, foi assustador constatar que 55,9% dos especialistas se encontram sediados no Sudeste. Entre esses profissionais, 42,1% estão apenas nos estados de São Paulo e Rio de Janeiro. Também é preocupante verificar que, em 63,3% dos municípios brasileiros, não há especialistas sediados e que metade do contingente nacional de especialistas tem sede em apenas 21 municípios. De fato, a força de trabalho odontológica especializada está concentrada nos municípios com população acima de 100 mil habitantes (82,6%), com PIB per capita maior que R$ 10 mil (78,4%), com IDH alto ou muito alto (62,9%) e com coeficiente de Gini maior que 0,5 (97,4%).


Com base no estudo, o que destaca sobre as características e dinâmicas dessa força de trabalho?


Arouca: O Brasil tem mais de 200 mil cirurgiões-dentistas em atividade. Mais de um quarto desses profissionais tem registro em alguma especialidade. Esse contingente compõe uma força de trabalho odontológica especializada que supera o total de dentistas existente em países como o Canadá, a França e o Reino Unido, por exemplo.


Contudo, apesar da sua magnitude, muito pouco se conhecia, até agora, sobre as características e as dinâmicas dessa população. Os dados referentes aos especialistas ainda não haviam sido tratados como objeto de investigação científica. Estavam restritos ao universo burocrático do registro necessário ao cumprimento da função disciplinar inerente aos conselhos profissionais. Durante o desenvolvimento deste projeto, nossa equipe se dedicou, com empenho, à exploração e ao tratamento sistemático desses dados.


Que contribuições acredita que a pesquisa pode trazer para a saúde pública no país, especialmente no âmbito da atenção odontológica?


Arouca: Vivemos um momento de expansão das ações que consubstanciam as diretrizes da Política Nacional de Saúde Bucal, publicada em 2004. Além do aumento considerável no número de equipes de saúde bucal na Estratégia Saúde da Família, temos observado, nos anos recentes, um significativo incremento na quantidade de Centros de Especialidades Odontológicas (CEOs) implantados pelo país, visando ampliar e qualificar a atenção secundária e terciária em saúde bucal, cuja capacidade de oferta sempre foi baixa.


Todavia, estudos sobre a implementação dessa política na esfera municipal – inclusive alguns muito bem conduzidos aqui na Escola Nacional de Saúde Pública (Ensp/Fiocruz) – têm apontado deficiências importantes no tocante à coordenação do cuidado entre os níveis primário e secundário do sistema e à sustentabilidade dos CEOs, já que muitos têm operado em capacidade reduzida, por carência de profissionais, entre outras razões. Isso tem prejudicado sobremaneira a resolutividade das ações em saúde bucal e fragilizado a integralidade da atenção. Diante disso, acreditamos que os resultados de nossa pesquisa possam ser úteis à gestão do processo de expansão da atenção odontológica em curso, por permitirem o conhecimento das características e da distribuição da força de trabalho disponível para atuar na atenção secundária e terciária em saúde bucal no país.


Publicado em 7/12/2012.

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