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10/05/2007

Pesquisa aponta descontrole glicêmico em 75% dos diabéticos

Antonio Brotas


Quando mal controlado, o diabetes provoca sérias complicações a médio e longo prazos. Doenças cardíacas, acidente vascular cerebral, hipertensão arterial, cegueira, insuficiência renal e amputações de membros inferiores estão entre as conseqüências do descontrole da doença. Depois de quase dois anos de estudos, treinamentos, encontros, testes e estratificação dos dados, cientistas do Centro de Pesquisa Gonçalo Moniz (CPqGM), unidade da Fiocruz na Bahia, e da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) apresentaram uma realidade preocupante: 75% dos diabéticos investigados estavam com controle glicêmico inadequado. Entre os que têm diabetes tipo 1 o índice chega a 90%.


Os dados foram obtidos por meio de exames para medição da taxa de hemoglobina glicada, capaz de refletir o grau de controle glicêmico nos últimos três meses. A Associação Americana de Diabetes recomenda que este índice não ultrapasse 7%. Entretanto, a pesquisa identificou que 70% daqueles que não conseguiam controlar a doença apresentaram taxa de 9%, considerada péssima. “Os dados servem como alerta, já que estas pessoas estão mais susceptíveis a desenvolver as complicações”, acrescenta o pesquisador do CPqGM Edson Duarte.


Feita a partir da avaliação de 6.701 pacientes de dez cidades brasileiras, a pesquisa é a primeira a mensurar o tamanho do problema. Entre os entrevistados, 15% sofriam de diabetes tipo 1 (tratada com insulina) e 85% do tipo 2 (que geralmente aparece depois dos 40 anos). Mais da metade (55%) recebia assistência em centros especializados. Além da constatação de que o Brasil é o segundo país em prevalência de controle glicêmico inadequado, à frente apenas da Tunísia, os pesquisadores apontaram algo mais grave: até mesmo pacientes que são tratados em centros especializados e cumprem rigorosamente a medicação e as orientações médicas estão com taxas de hemoglobina glicada altas. Nos centros de referência, o controle foi considerado ruim e péssimo para 72% dos pacientes de diabetes tipo 1. Nos não especializados, este percentual sobe para 76%. “Claro que uma maior aderência à dieta e o uso adequado da insulina é importante para melhorar o controle, mas percebemos que ainda temos níveis elevados de descontrole entre aqueles que seguem as orientações médicas”, afirma Duarte.


A hipótese do pesquisador é de que o tratamento é insuficiente devido à resistência dos pacientes em tomar insulina, bem como uma certa inércia clínica pelo fato de os médicos adiarem o tratamento com o medicamento. Calcula-se que apenas 2% dos pacientes não se opõem a tomar o remédio. “Os médicos vão deixando para depois, protelam a administração da insulina... Não por falta de conhecimento. Acredito que isso ocorra porque os profissionais sabem que os pacientes não aceitam muito bem o uso de uma medicação injetável e por isso sacrificam o algoritmo de decisões terapêuticas”, destaca Duarte.


A resistência de médicos e pacientes em relação à insulina faz o Brasil figurar entre os países com menor uso do medicamento. Estima-se que apenas 10% das pessoas que sofrem com o diabetes tipo 2 usem insulina, índice que é bastante inferior ao do continente europeu, que expõe níveis de 40%. O Brasil perde até mesmo para os demais países latino-americanos, que apresentam taxa de 16%. “Estamos usando pouco”, calcula Duarte.


Doença crônica que atingia 171 milhões de pessoas no mundo e deverá alcançar mais de 366 milhões em 2030, o que corresponde a um aumento de 114%, o diabetes tem prevalência de 7,6% na faixa de 30 a 69 anos no Brasil. O controle glicêmico, neste sentido, é fundamental para evitar conseqüências graves para o paciente e para o sistema de saúde. O diabetes é a quarta principal causa de morte no Brasil. Os pacientes que sofrem com a doença têm risco de morte duplicado em relação aos não-diabéticos. A pesquisa identificou que problemas de visão, com 45,3%, lidera as complicações crônicas do diabetes. Neuropatia periférica, com 44,3%, seguem em segundo lugar. Micro/macrovasculopatia (19,7%) e doença renal (16,4%) também foram relacionadas.


“Nossa expectativa é que os dados sirvam para orientar e estimular programas de educação com os pacientes e com a comunidade médica de modo a nos aproximarmos mais da metas internacionais. As autoridades da área de saúde também precisam pensar sobre esta questão”, observa Duarte.

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