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10/01/2017

Pesquisa caracteriza função sensorial de vetor de Chagas

Fiocruz Minas


As bases moleculares das funções sensoriais da antena de Rhodnius prolixus, um dos principais vetores da doença de Chagas, foram o foco de um estudo coordenado por pesquisadores da Fiocruz Minas. Os cientistas queriam descobrir quais genes influenciariam de maneira significativa o comportamento desses insetos e, para isso, fizeram um transcriptoma antenal (sequenciamento em massa do RNA mensageiro do órgão), que permite inferir a relação de cada gene ali presente com os estímulos sensoriais relevantes para os triatomíneos, como odor, calor, gosto, entre outros. O estudo foi publicado na última sexta-feira (6/1), na revista Scientific Reports, uma influente publicação científica no cenário atual.

Com o título Transcriptoma da antena de um vetor da doença de Chagas, a pesquisa é um desdobramento de um trabalho publicado em dezembro de 2015, que descreveu o genoma do Rhodnius prolixus, apresentando todos os genes do inseto, um total de 15.546. Na época, coube a esse mesmo grupo liderado por pesquisadores da Fiocruz Minas identificar quais deles podiam ter relação com o comportamento. E por ser a antena o principal órgão sensorial do inseto, subsequentemente sequenciaram o conjunto do RNA mensageiro antenal, confirmando a expressão de cerca de 10 mil genes no órgão. Agora, por meio do transcriptoma, foi possível verificar quais, desse total, de fato, parecem ser mais importantes para as funções sensoriais do inseto.

“Para avaliar isso, observamos, dentre os genes cuja expressão foi detectada na antena, quais tinham expressão alta e, por isso, consideramos que provavelmente sua função seja mais crítica para o inseto”, explica o coordenador do Grupo de Comportamento de Vetores e Interação com Patógenos (Fiocruz Minas), Marcelo Lorenzo, que liderou o estudo.

Realizado com antenas de larvas e também de fêmeas e machos adultos, o transcriptoma mostrou ainda que, entre essas duas fases da vida desses insetos, ocorrem mudanças importantes na percepção do mundo sensorial. Foi o primeiro estudo dessa natureza realizado em insetos que não têm metamorfose completa - os chamados hemimetábolos -, abrindo caminho para que novas pesquisas sejam feitas em relação a outros insetos praga com essas características, tais como baratas e gafanhotos.

“Há aspectos importantes a serem explorados em relação à biologia sensorial dos hemimetábolos. A partir dos nossos resultados sabemos, por exemplo, que a função de odores nos adultos parece estar amplificada, situação que pode estar relacionada com mecanismos de comunicação entre os sexos e, consequentemente, com a reprodução”, avalia Lorenzo.

Segundo Lorenzo, é esse tipo de compreensão abrangente das funções sensoriais, já possível em relação a insetos com metamorfose completa, como formigas, pulgas, mariposas, e moscas, que está permitindo ao segmento agrícola fazer controle de pragas sustentável sem abuso no uso de inseticidas.

“Hoje, já existem armadilhas com iscas químicas desenvolvidas a partir desse tipo de conhecimento. Em relação aos triatomíneos, ainda não tínhamos informações sobre as bases moleculares da função sensorial. Os dados disponibilizados por meio do transcriptoma abrem possibilidades para que os triatomíneos sejam alvo de desenho de bloqueadores de detecção de feromônios, que são os compostos responsáveis, por exemplo, pela atração entre sexos em indivíduos da mesma espécie”, afirma.

O transcriptoma antenal sequenciado foi o primeiro a ser realizado para um vetor da doença de Chagas, reafirmando aos triatomíneos como um modelo de estudo na neuroetologia atual.

Sobre a doença

De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), a doença de Chagas afeta, aproximadamente, sete milhões de pessoas em todo o mundo. A maior parte dos casos ocorrem na América Latina, onde 22 países são considerados área endêmica. Anualmente, cerca de 14 mil mortes causadas pela doença são registradas.

Trata-se de uma doença causada pelo protozoário Trypanosoma cruzi, que é transmitido pelas fezes dos triatomíneos, também conhecidos como barbeiros.

A doença de Chagas não é transmitida ao ser humano diretamente pela picada do inseto. A transmissão ocorre quando a pessoa coça o local da picada, e as fezes eliminadas pelo barbeiro durante sua alimentação penetram na ferida gerada. A transmissão pode também ocorrer por transfusão de sangue contaminado, durante a gravidez, da mãe para filho e, acidentalmente, por ingestão de alimentos não processados e contaminados por insetos triturados ou pelos seus dejetos.

Devido à ausência de uma vacina ou a um tratamento efetivo durante a fase crônica desta doença, as estratégias de controle vetorial ainda são consideradas fundamentais. O aparecimento de pelo menos duas espécies de triatomíneos com populações resistentes a inseticidas aponta para a necessidade de novas ferramentas de controle destes insetos vetores.

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