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14/04/2005

Pesquisas do CPqRR subsidiam combate à endemia de leishmaniose

Aílson Santos


O Centro de Pesquisa René Rachou (CPqRR), unidade da Fiocruz em Minas Gerais, está testando uma nova técnica de diagnóstico sorológico da leishmaniose humana e canina mais simples, rápida e barata do que os testes utilizados regularmente. A nova técnica, que já apresenta resultados extremamente satisfatórios, dispensa o uso de equipamentos sofisticados, pois se baseia na aglutinação direta da amostra do sangue usando o antígeno de Leishmania, produzido por um laboratório holandês. Outro exemplo é a pesquisa que avalia o potencial que gambás e ratos, além do cão, têm como reservatórios da Leishmania. E um outro estudo está verificando os cães assintomáticos como fontes de infecção para os vetores, participando na transmissão da doença.


O Laboratório de Leishmanioses do CPqRR, referência nacional no estudo dos vetores, desenvolve atividades de pesquisa para dar suporte científico e estratégico às ações de combate à doença, em parceria com as secretarias municipal (de Belo Horizonte) e estadual de Saúde e a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). De acordo com a Secretaria de Saúde do estado, só no ano passado foram notificados 544 casos da doença, com 47 óbitos. A doença, que acomete tanto o homem quanto o cão, comprometendo fígado, baço e medula, está presente em 66 cidades mineiras. A leishmaniose já foi confirmada em 23 dos 37 municípios que compõem a Região Metropolitana de Belo Horizonte, contribuindo para que a capital mineira seja um dos centros urbanos de maior incidência de casos humanos no país. Além de treinar profissionais de saúde que trabalham na realização de exames humanos e caninos, o CPqRR investiga aspectos importantes da doença relacionados à epidemiologia, diagnóstico, prevenção e tratamento. Diversos estudos estão em andamento, principalmente em cidades da Região Metropolitana, Norte e Nordeste do estado, onde estão as áreas de maior incidência da leishmaniose.


Atendendo à solicitação do Ministério da Saúde, o CPqRR em parceria com a UFMG, está fazendo uma pesquisa de avaliação da eficácia da vacina leishmune, utilizada em cães. Este estudo visa verificar se a utilização da vacina nos animais interfere de fato na diminuição dos casos humanos da doença. Outra pesquisa importante com cães é a que pretende definir um método de diagnóstico sorológico capaz de diferenciar o sangue de um animal doente do de um animal vacinado, já que em ambos os casos há presença de anticorpos da doença.


Além destas pesquisas, também são realizados estudos sobre o ciclo de vida e os hábitos do flebotomíneo, inseto transmissor da doença, também conhecido como mosquito-palha, a partir de uma colônia de animais vivos, mantidos no laboratório. Outros aspectos quanto à distribuição geográfica da doença, variações genéticas e suas correlações com o ambiente e com os aspectos clínicos também são alvos de pesquisas no CPqRR.


Os especialistas destacam outras ações para combater a leishmaniose. As mais importantes são a distribuição de material informativo para a população, a borrifação de inseticidas em áreas de maior incidência e ainda medidas de prevenção, como o uso de coleiras inseticidas ou repelentes a insetos em cães, o fechamento de canis com telas finas e a eliminação de matéria orgânica, de lixos e entulhos dos quintais propícios à proliferação do inseto transmissor. O pesquisador Edelberto Santos Dias, chefe do Laboratório de Leishmaniose do CPqRR, diz que o inseto exerce papel fundamental na expansão da doença, "graças à sua grande capacidade de adaptação ao ambiente modificado pelo homem." Além disto, destaca ele, "o combate ao flebótomo é difícil porque o desenvolvimento de seu estágio larvário se dá no solo, diferentemente do Aedes aegypti, mosquito transmissor do dengue, que se desenvolve na água".




Centro de Referência em Leishmanioses desenvolve programa para BH


Para tentar reduzir o número de óbitos causados pela leishmaniose visceral na região metropolitana de Belo Horizonte, com taxa de letalidade média de 10% a 15% nos últimos cinco anos, um grupo de pesquisadoras do CPqRR vem desenvolvendo o Programa de Organização de Serviços em Leishmanioses, que envolve todos os 40 municípios da região. Uma das estratégias é intensificar a divulgação da informação sobre a doença entre os profissionais de saúde, visando o diagnóstico precoce e o tratamento adequado.


O programa foi iniciado em 2000 pelas pesquisadoras Zélia Profeta e Ana Rabello, do Laboratório de Pesquisas Clínicas e Centro de Referência em Leishmanioses, em conjunto com a Diretoria de Ações Descentralizadas em Saúde da Secretaria de Estado da Saúde de Minas Gerais e técnicos do setor de zoonoses da Secretaria de Saúde de Belo Horizonte. O primeiro caso da doença na Região Metropolitana foi notificado em 1989. Em 2003, foram notificados 200 casos, com taxa de letalidade média que varia nos últimos cinco anos de 10 a 15%. A doença, também conhecida como Calazar, é crônica, sistêmica e atualmente tem registrado cerca de dois mil casos por ano no país, de acordo com a Fundação Nacional de Saúde.




Resultados apontam redução de 17% para 3% no número de óbitos


A avaliação da primeira etapa do programa, no período de 2000 a 2003, mostrou resultados promissores. O programa que inclui a capacitação de profissionais de saúde, através das atividades ambulatoriais e laboratoriais do Centro de Referência, visa à estruturação do serviço local para o atendimento e acompanhamento do paciente. Após a implantação verificou-se, naqueles municípios em que os profissionais tiveram alta adesão ao programa, uma redução dos óbitos causados pela doença de 17% para 3%. Está prevista a formação de uma equipe composta por enfermeiros do Programa de Saúde da Família, coordenadores da zoonoses e da vigilância epidemiológica em cada um dos 40 municípios. O objetivo desse grupo é elaborar um plano de ação estratégico que visa disseminar a informação sobre a leishmaniose, o diagnóstico precoce, o tratamento adequado e a redução de óbitos. Este programa tem o apoio financeiro parcial do CNPq/MS/Decit.




Materiais informativos sobre a doença nos serviços de saúde são avaliados


Depois de constatar a necessidade de aumentar o conhecimento dos profissionais de saúde sobre a doença, as pesquisadoras resolveram avaliar também a qualidade de 18 textos informativos sobre as leishmanioses, em formatos de manuais, folhetos e cartilhas, utilizados pelos serviços de saúde do país. O trabalho, realizado em colaboração com a pesquisadora Virgínia Schall do Laboratório de Educação em Saúde, do CPqRR, indicou que material informativo analisado apresenta inadequações de conteúdo, linguagem e ilustrações que comprometem a qualidade da informação. Para Zélia Profeta, é importante que o Ministério da Saúde estabeleça critérios para a avaliação da qualidade de materiais informativos em saúde, já que estes constituem ferramentas importantes para os programas de controle e combate de doenças no Brasil.


As pesquisadoras e um grupo de profissionais de saúde de municípios da região metropolitana elaboraram um folheto e uma cartilha informativos sobre a leishmaniose visceral, destinados, respectivamente, à população e aos profissionais de saúde. Um milhão de folhetos e 12 mil cartilhas foram impressos, com financiamento da Superintendência de Epidemiologia da Secretaria da Saúde de Minas Gerais.


O potencial informativo deste folheto foi avaliado entre 551 profissionais de saúde. Antes da leitura, apenas 26% dos profissionais, conheciam aspectos elementares da doença. Após a leitura, esses percentuais se elevaram para 96%. "Observamos que a maior desinformação foi principalmente evidenciada nas questões que abordavam os sintomas da doença", diz Zélia.

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