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23/09/2011

Plágio e fraudes na ciência no 1° Simpósio de Bioética

João Paulo Soldati


Plágio, fabricação de mentiras e fraude científica. Estes foram os termos ecoados na manhã desta quinta-feira (22/09), fazendo com que a temperatura subisse no último dia do 1° Simpósio de Bioética e Saúde Pública do Instituto Oswaldo Cruz - Desafios do século XXI e Workshop para comitês de ética em pesquisa com seres humanos e animais. Durante a mesa redonda, temas sobre a integridade dos trabalhos científicos, plágios detectados em artigos e assuntos como conflitos de interesses em divulgações nos periódicos especializados estiverem em pauta.


 Da esquerda para a direita, Miguel Roig (St. John’s University), Sonia Vasconcelos (UFRJ) e Claude Pirmez, da Fiocruz. Foto: Gutemberg Brito. 

Da esquerda para a direita, Miguel Roig (St. John’s University), Sonia Vasconcelos (UFRJ) e Claude Pirmez, da Fiocruz. Foto: Gutemberg Brito. 


“Honestidade tem que ser uma obrigação e não um atributo”, dispara Claude Pirmez, vice-presidente de Pesquisa e Laboratórios de Referência da Fiocruz. Claude foi a moderadora do debate entre o público e os palestrantes da St. John’s University e da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Sonia Vasconcelos, professora do Programa de Educação, Gestão e Difusão em Biociências do Instituto de Bioquímica Médica da UFRJ, apresentou trabalho sobre o impacto da discussão da integridade em pesquisa da comunicação de descobertas científicas. A pesquisadora questionou a integridade das divulgações cientificas em periódicos e a originalidade da comunicação em ciência – que está sendo posta em xeque devido às falsificações, fabricação de dados e plágios.


Erro e reparação


“O problema da má conduta, de pesquisadores, de agências de fomento e de instituições de ensino que divulgam dados em periódicos científicos, está impactando de forma negativa as práticas daqueles que são considerados honestos. Estes pesquisadores estão sendo questionados frequentemente sobra a originalidade dos seus projetos”, afirma. Uma reportagem especial de 2005, na revista Nature, confirma que casos de plágio estão forçando os editores de revistas científicas a adotarem medidas de controle. “Muitas destas revistas têm questionado os autores, antes da publicação, se de fato escreveram ou se contribuíram para um determinado projeto”, afirma Sonia. “O pesquisador, ao assinar um trabalho científico, tem que assumir suas responsabilidades. Atualmente, a pesquisa científica sofre por um processo de internacionalização forte, de muita exposição e a questão da responsabilidade tem que ser levada em consideração”, pondera.



Será que os autores estão reconhecendo seus erros? Segundo a pesquisadora, sim. “A retratação [a especialista usa o termo ‘retraction’, em inglês] vem sendo realizada de forma mais ampla nos últimos anos. A ideia é corrigir a literatura biomédica e invalidar trabalhos que foram plagiados e/ou falsificados”, diz. Retração é uma declaração pública, feita pelo autor, que confessa o engano e o equívoco cometido, refutando a declaração original. Sonia exemplificou com o caso do jovem pesquisador doutor Jan Hendrik Schön, publicado na revista Science em outubro de 2002. O físico do Bell Labs ficou marcado por simular dados de seus trabalhos, fazendo que os co-autores retirassem 16 trabalhos por falta de um inquérito rígido sobre os motivos que levaram Schön a fazer isso. O pesquisador teve que se retratar publicamente.


Informações clonadas


O professor Miguel Roig, do Departamento de Psicologia da St. John’s University, dos Estados Unidos, discutiu sobre plágio nas ciências da saúde e mostrou como a desonestidade na comunicação científica é perigosa. “De 1990 a 2010, o número de publicações científicas plagiadas pelo mundo cresceu, e vem aumentando especialmente nos últimos cinco anos”, afirma.


“Nos Estados Unidos, plágio é definido como apropriação de ideias de outras pessoas, de processos, de resultados ou palavras, sem o apropriado crédito. Alguns indivíduos acreditam que não é plágio pegar trechos do texto já publicado de um autor, mudando apenas as palavras e a ordem delas. É plágio sim! Pegar a citação de alguém sem creditar é roubo”, frisa Roig. O pesquisador norte-americano disse ainda que a ideia de plagiar projetos surge frequentemente durante o período universitário e que práticas de ‘self-plagiarism’ também são comuns. “O pesquisador que usa seus próprios materiais produzidos e recicla-os como se fossem originais também configura fraude”, diz.  “Existe um software (e-TBLAST) nos Estados Unidos [desenvolvido pela Virginia Bioinformatics Institute] que detecta a similaridade entre os textos e ajuda a identificar plágios”, conta o pesquisador, que mostra em slides uma série de trabalhos plagiados e detectados pelo equipamento.


Antes de abrir o debate, Claude fez uma provocação ao público. “Ciência é troca de informação constante. É nesta troca que você gera um estudo, uma ideia para se obter um resultado. Isso é plágio? E se for, o quanto seria?”. Para ela, o limite desta troca é tênue: “Existe um limite muito sutil nisto. A percepção de que plágio exista e seja maior hoje, deve-se ao fato de que foram criadas ferramentas para detectar essas fraudes”, finaliza.


Encerramento


À tarde, com a moderação de Catarina Macedo Lopes (Comitê de Ética em Pesquisa do IOC) e Márcia Cassimiro, organizadora do evento, o workshop “A percepção dos CEP Fiocruz RJ sobre o Sistema CEP-CONEP após 15 anos de implantação da Resolução CNS 196/96 e o uso de animais em pesquisas: Sugestões para o manejo e a gestão dos conflitos” encerrou o evento de três dias. Coordenadores dos CEPs de diversas unidades da Fiocruz participaram do debate, mediado por Carlos Adriano Silva dos Santos, representante da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP), e Carlos Debenedito, coordenador do CEP INCA.


O encontro, que durou três dias e contou com mais de 130 inscritos, reuniu pesquisadores, gestores, membro de comitês de ética de diversas instituições, integrantes de programas de pós-graduação e demais interessados no assunto para trocar experiências e estimular a formação e a prática em bioética e ética aplicada à pesquisa envolvendo seres humanos e animais. Clique aqui para conferir a abertura do encontro. Ao final do evento foram entregues certificados para aqueles com mais de 75% de participação.


Publicado em 23/9/2011.

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