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15/12/2017

'Política pública para funcionalidade reduzida' é tema de revista

Informe Ensp


A revista Ciência e Saúde Coletiva (vol.22 n.11) é um número temático que nasce de um projeto de pesquisa sobre o aprimoramento da política pública para pessoas com funcionalidade reduzida, liderado pela Fundação Oswaldo Cruz, em parceria com o Ministério do Desenvolvimento Social e com apoio da Faculdade de Medicina de Petrópolis/Rio de Janeiro. Os artigos refletem sobre os aspectos positivos e negativos de uma política pública ímpar a nível mundial por conta de seu foco na funcionalidade. Autora do editorial, a pesquisadora Carla Sabariego, do Institute for Medical Information Processing, Biometry and Epidemiology, Ludwig-Maximilians-Universität (LMU), em Munique, avalia o aprimoramento da política pública com foco na funcionalidade do Benefício de Prestação Continuada (BPC). Segundo ela, em 2001, a Organização Mundial da Saúde (OMS) propôs, por meio da Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF), uma abordagem que compreende a deficiência como um fenômeno multidimensional e universal, e que se situa não somente no indivíduo, mas depende de vários fatores de seu entorno físico, político e social. Hoje, 16 anos mais tarde, a OMS ainda recebe muitos pedidos de suporte de países que incorporaram a CIF em sua legislação, mas que encontram muita dificuldade em implementá-la em políticas públicas. “O Brasil estabelece com o BPC um exemplo mundial de como é possível utilizar a CIF em políticas públicas.”
 
Burocracia pública e política social no Brasil, artigo do pesquisador da Escola Nacional de Saúde Pública (Ensp/Fiocruz), Nilson do Rosário Costa, descreve a burocracia do governo central brasileiro e o acesso da pessoa com deficiência ao Benefício de Prestação Continuada (BPC). Este acesso é dependente da avaliação da condição de vulnerabilidade realizada pela burocracia ministerial. Foram utilizadas revisão de literatura e dados secundários de séries de tempo e transversal para descrever a burocracia federal. Documentos legais e indicadores descrevem o regime de avaliação pericial. É demonstrada a evolução desigual no quantitativo da burocracia de carreira do governo central brasileiro nas últimas duas décadas. Resultado: O governo central brasileiro adotou a concepção internacional da pessoa com deficiência na avaliação dos requerentes ao BPC. A despeito dessa decisão, é demonstrado que o governo central brasileiro ampliou seletivamente a burocracia de carreira para atuar na área social. Constatou-se que o resultado do processo de avaliação foi bastante severo, favorecendo os requerentes em condição de extrema vulnerabilidade biomédica. A despeito da adoção do modelo social, a elegibilidade ao BPC é subordinada ao diagnóstico médico.
 
O artigo Benefício de Prestação Continuada (BPC) para pessoas com deficiência: barreiras de acesso e lacunas intersetoriais, de Jeni Vaitsman, da Ensp/Fiocruz; e Lenaura de Vasconcelos Costa Lobato, da Universidade Federal Fluminense, discute como algumas lacunas nos mecanismos de coordenação intersetorial entre essas áreas produzem barreiras de acesso aos potenciais beneficiários. Os resultados são de pesquisa qualitativa realizada com médicos, técnicos administrativos e assistentes sociais do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e dos Centro de Referência da Assistência Social (Cras) em três municípios de diferentes regiões do país. A coordenação e a cooperação intersetoriais mais estruturadas ocorrem no nível federal. No nível local, dependem de iniciativas informais e horizontais, o que produz soluções imediatas, mas descontínuas. O papel dos Cras permanece contingente na implementação. Ficou patente a necessidade de estabelecimento de mecanismos institucionalizados de coordenação e cooperação entre os setores da assistência social, saúde e previdência para melhorar a implementação e diminuir as barreiras de acesso ao BPC.
 
A nova organização do trabalho na universidade pública: consequências coletivas da precarização na saúde dos docentes é o artigo dos pesquisadores Katia Reis Souza, Eliana Guimarães Felix, Liliane Reis Teixeira, Maria Blandina Marques Santos, Marisa Moura e  Andrea Maria Santos Rodrigues, da Ensp/Fiocruz; e André Luis Oliveira Mendonça, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, que tem como principal objetivo analisar a nova organização do trabalho dos professores universitários, estabelecendo uma relação com o panorama de saúde desses trabalhadores. Parte-se do pressuposto segundo o qual a precarização do trabalho nas universidades públicas vem gerando repercussões na saúde dos docentes da educação superior. Realizou-se um estudo qualitativo de caráter exploratório por meio de pesquisa bibliográfica em bases de dados indexadas. Como método de análise, lançou-se mão da analise temática, chegando a quatro categorias empíricas, sendo elas: precarização do trabalho docente; intensificação laboral; aspectos da organização do trabalho docente em universidade; e dados sobre a saúde dos docentes universitários. Verificou-se, na literatura, que prepondera no cenário das universidades o uso de fortes pressões organizacionais e como consequência produz-se a intensificação do trabalho, com destaque para a questão do aumento da exigência de produtividade acadêmica. Constatou-se, ainda, que o tema da sobrecarga de trabalho do professor é recorrente e prevalece a ideia de menor disponibilidade de tempo para o lazer. Além disso, confirmou-se o imperativo da resistência coletiva organizada de maneira a se modificar o quadro de precarização do trabalho do professor.

Uma onda que vem e dá um caixote: representações e destinos da crise em adolescentes usuários de um CAPSi, artigo de Melissa de Oliveira Pereira, Marilene de Castilho Sá e Lilian Miranda, também da Ensp/Fiocruz,  enfoca os aspectos intersubjetivos envolvidos na atenção à crise psicossocial de adolescentes, suas representações e desdobramentos. Trata-se de uma pesquisa qualitativa, desenvolvida através da perspectiva psicossociológica, através da construção de narrativas de vidas de adolescentes que se tratam num Centro de Atenção Psicossocial para Crianças e Adolescentes (CAPSi). Basearam-se nas contribuições teóricas de René Kaës sobre aspectos grupais e culturais da crise, assim como sua relação com a adolescência. As narrativas de vida, construídas através de entrevistas em profundidade com adolescentes, parentes próximos dos mesmos e profissionais do CAPSi, apresentam a crise como “surpresa”, violência e estranhamento, momento que precisa ser esquecido, negado, silenciado e medicalizado. Concluíram que a crise envolve forte sofrimento psíquico por parte do adolescente, pessoas próximas e também profissionais, o que coloca em questão as possibilidades e os limites do cuidado. Apontam, assim, para a importância de espaços protegidos, na instituição e na rede de saúde, que possibilitem construção coletiva de novos sentidos, representações e destinos da crise, tanto por parte de usuários quanto de profissionais.
 
No artigo Diagnóstico participativo socioambiental e de riscos à saúde das comunidades do entorno do Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro, Brasil, os pesquisadores Marcela de Abreu Moniz e Vera Maria Sabóia, da Universidade Federal Fluminense; e Cleber Nascimento do Carmo e Sandra de Souza Hacon, da Ensp/Fiocruz, fazem um diagnóstico dos problemas socioambientais prioritários e os riscos à saúde das comunidades do entorno do Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro. De abordagem participativa, a pesquisa-ação conduziu a aplicação de entrevistas, grupos focais, reuniões e oficina com atores sociais de Porto das Caixas e Sambaetiba, localizados em Itaboraí/RJ, no período de novembro de 2013 a dezembro de 2014. Uma análise estrutural dos problemas priorizados pelas comunidades (oferta de água, tratamento de esgoto e risco de doenças transmissíveis; risco de poluição do ar e doenças respiratórias; ausência de segurança pública e risco de violência) esquematizou a relação causa-efeito-intervenção, com base no Protocolo para Avaliação Comunitária de Excelência em Saúde Ambiental. O processo revelou ausência de representatividade dos atores sociais das localidades estudadas em espaços decisórios sobre a problemática ambiental. Urgem ações educativas com profissionais e moradores que visem a favorecer a constituição de movimentos coletivos, indispensáveis à garantia dos direitos de mitigação das situações de contaminação do ar e de acesso aos serviços de saneamento e de segurança pública e de condições de menor risco à saúde.

Os demais artigos podem ser acessados na revista Ciência e Saúde Coletiva (vol. 22 n. 11) de novembro de 2017.

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